segunda-feira, 16 de julho de 2018

FUTEBOL 9

Programa noturno muito bom do canal Fox denominado “Os Especialistas” reunindo treinadores de futebol. Jô Soares participava como representante do torcedor, de quem paga ingresso para assistir aos jogos ou de quem os assiste pela televisão. Mais contido do que nas transmissões de jogo, mais bueno e menos galvânico, o jornalista Téo José comandava o programa permitindo aos participantes falar mais do que ele, sem interrompê-los de modo deseducado ou inoportuno. O jornalista e os participantes não se mostraram arrogantes. Com o final da copa do mundo 2018, o programa também terminou. Aficionado do futebol que da arquibancada observa os jogadores, os técnicos e a dinâmica dos jogos, Jô afirmou que o futebol mudara e que os técnicos também deviam mudar e não ter medo. Abel respondeu que os treinadores que ali se encontravam não tinham medo e desafiou o humorista, escritor e entrevistador de TV a esclarecer o que mudara. Jô não soube responder, surpreso com a reação dos colegas do programa. Luxemburgo respondeu que nada mudara, o futebol é o que sempre foi desde a sua invenção. Roger e o treinador argentino preferiram não polemizar.
A lei de mutação regente do mundo da natureza (construído por deus) também atua no mundo da cultura (construído pelo homem). A sociedade experimenta mudanças no curso dos anos, dos séculos, dos milênios, porém o essencial permanece: a presença do ser humano. Guerra é guerra desde as antigas civilizações até o presente. O instinto bélico continua vivo nos seres humanos. No entanto, da Idade Antiga à Idade Contemporânea mudaram os equipamentos, os armamentos, as munições, os veículos terrestres, marítimos e aéreos, as estratégias, o poder de destruição. No futebol não foi diferente. Esporte de elite nos seus primórdios, com o passar do tempo tornou-se popular. Prática social durante um século com fins mantenedores e de entretenimento, não lucrativos, depois tornou-se uma indústria que movimenta bilhões de dólares e faz do jogador mercadoria. Além disto, o futebol tornou-se fonte de ascensão social e econômica de jogadores e suas famílias, arena política e via de congraçamento das nações.
Outrora, jogava-se mais por amor à camisa da equipe da várzea ou do clube; hoje, mais por amor ao dinheiro do clube e dos patrocinadores. Os equipamentos, rústicos no passado, hoje são de luxo e visam ao conforto físico e psicológico dos jogadores. No passado, tática simples; no presente, diversidade de táticas utilizadas conforme o temperamento de cada treinador e as qualidades e características de cada jogador disponível. Alguns esquemas táticos são rígidos, outros flexíveis. No futebol de campo oficial permanece o essencial: as regras, o árbitro, o campo retangular, as linhas divisórias, as traves com redes, os onze jogadores de cada equipe, as posições básicas de defesa, armação e ataque, o gol como alvo, o treinador. Entretanto, mudou a nomenclatura: de beque, alfo, centeralfo, centroavante, meia esquerda e direita, ponta esquerda e direita, para zagueiro, volante, ponta-de-lança, lateral esquerda e direita. Além do nome, mudou a função desses jogadores, de fixa para móvel, de específica para genérica, de baixa para alta velocidade. As jogadas evoluíram: do passe curto para o longo, do drible simples para o sofisticado (meia-lua, chapéu, corta-luz, calcanhar), do chute simples para o de efeito (trivela). Surgiu também a necessidade de constituir comissões técnicas. A administração agigantou-se, tornou-se complexa e corrupta.          
Medo é sentimento próprio do psiquismo animal. A raça humana pertence ao mundo animal. Os jogadores e os treinadores pertencem à raça humana. Logo, os jogadores e os treinadores têm medo. O agente provocador do medo pode ser de múltipla natureza. Há o medo de morrer, de fantasma, de cachorro, do sogro, do vizinho encrenqueiro, de viajar de avião, de saltar do trampolim ou de paraquedas, de prestar exames ou socorro, de enfrentar o adversário ou o inimigo, de lidar com loucos, de ir para o inferno, e assim por diante. No Brasil, os treinadores de futebol têm medo de perder o jogo e o emprego. Por isto mesmo, alguns preferem que o seu time jogue na retranca. Preferem mais não sofrer gol do que fazer gol. Priorizam a defesa e encerram-na em sistema com feição específica (racionalidade x sensibilidade). Treinadores ousados não se importam do time sofrer gols, desde que faça mais gols do que o adversário, nem se intimidam com a pujança ou fama da outra equipe, embora acautelem-se. Ao convocar um número de defensores maior do que o necessário e de atacantes menor do que o recomendável, o treinador de uma seleção dá sinal de privilegiar o sistema defensivo com medo de sofrer derrotas.      

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