sexta-feira, 12 de setembro de 2014

FILOSOFIA XIII - 28



EUROPA (1600 a 1800). Continuação.

Probabilidade, na definição de Locke, é a manifestação do acordo com base em provas falíveis. [A afirmação de um físico nuclear de que a estrutura final da matéria é um filamento vibratório (corda vibrátil) pode ser aceita como correta por um leigo, firme na autoridade do cientista. O leigo crê nessa probabilidade do acerto do estudo e da reflexão do cientista]. A probabilidade supre a falta de um conhecimento certo. Repousa na crença, no assentimento ou opinião, nomes que se dá a esse tipo de acolhimento que a mente dá às proposições. A probabilidade convence quando em conformidade com nossa própria experiência ou com o testemunho da experiência alheia. Todos os acordos a favor ou contra devem ser examinados, até chegar-se ao julgamento. [Isto ocorre no processo judicial. Exame das provas favoráveis e contrárias às teses dos litigantes]. A adesão dos homens aos seus julgamentos pretéritos sobre cujo acerto eles não colocam dúvida contribui para a probabilidade daquilo que no presente lhes é apresentado em conformidade. [Os precedentes judiciais (jurisprudência) tornam provável o resultado da demanda em julgamento e orientam os atores do drama judicial]. Isto pode gerar erro e teimosia quando os julgamentos pretéritos foram elaborados sem as cautelas devidas. Inevitável que muitos tenham opiniões sem provas das suas verdades. Como dificilmente encontramos um juiz imparcial para ditar a melhor opinião, o caminho mais sensato é o da mútua tolerância.

Locke divide a idéia de probabilidade em graus conforme o seu poder de convencimento. O primeiro grau consiste no consenso geral de todos os homens, em todas as épocas, na medida em que isto pode ser conhecido. As probabilidades derivadas da natureza das coisas, cuja regularidade das causas e dos efeitos por todos é percebida, aproximam-se muito da certeza e geram um grau de segurança em nossas convicções. O segundo grau consiste na confiança fundada no testemunho inquestionável ou em nossa própria experiência. A história relata fatos de cuja existência nós não duvidamos porque confiamos no trabalho do historiador. Posso confiar nos fatos narrados sobre o egoísmo, a crueldade e a estupidez dos seres humanos, quando a minha experiência própria pode atestá-los ou verificá-los. O terceiro grau consiste no justo testemunho, como o dos fatos históricos pelos historiadores e documentos, ou da natureza das coisas indiferentes, como de um pássaro voar deste ou daquele modo. Os graus de probabilidade modificam-se quando há o choque de testemunhos entre si ou com outros tipos de provas. Nas coisas que os sentidos não podem descobrir, a analogia é a grande regra da probabilidade. A analogia com base na gradação inferior à condição humana pode ser aplicada à gradação superior estabelecendo a provável existência de “categorias de seres inteligentes excedendo-nos em graus variados de perfeição, subindo na direção da infinita percepção do criador, por suaves passos e diferença, cada um não se encontrando a grande distância do outro que lhe é próximo” (hierarquia cósmica).

A palavra razão significa: (1) princípios verdadeiros e claros; (2) causa final; (3) faculdade mental. A razão descobre idéias mediante a sagacidade e organiza as idéias a fim de descobrir através da ilação (inferência) que conexão há em cada elo da cadeia. A inferência permite à mente ver a provável conexão entre as idéias, nela assentindo ou divergindo. Método racional: (I) descobrir provas; (II) dispô-las em ordem clara e adequada para tornar sua conexão e força facilmente percebida; (III) perceber a conexão; (IV) tirar a correta conclusão. A mente humana opera ordinariamente sem o silogismo. Em seus modos e figuras, o silogismo é um grilhão para o pensamento. O silogismo tem sido considerado mais adequado para obter vitória na controvérsia do que para descobrir ou confirmar a verdade em investigações eqüitativas. O silogismo não é para uso cotidiano. Funciona como clarificador do pensamento, tornando-o mais rigoroso em sua formulação. Mostra-se útil nas decisões precedidas de provas e argumentos opostos.

Tipos de argumentos: (1) argumentum ad verecundiam, fundado na autoridade; (2) argumentum ad ignorantiam, fundado na falta de argumento contrário de quem discorda e deixa de apontar outro caminho; (3) argumentum ad hominem, fundado no erro do opositor ou nas conseqüências extraídas dos princípios ou concessões do opositor; (4) argumentum ad judicium, fundado nas provas tiradas dos alicerces do conhecimento ou da probabilidade. Este último tipo é o único argumento que serve ao conhecimento. Erro é o assentimento a algo que não é verdadeiro. Resulta das seguintes causas: (1) carência de provas, de habilidade para usá-las ou de vontade para vê-las e examina-las; (2) medidas inadequadas da probabilidade. A carência de provas pode ocorrer porque não existem ou porque existem, mas não foram procuradas. A falta de habilidade ocorre quando provas existem, mas o agente não sabe escolher a melhor e a mais adequada ao caso. Vícios que comumente conduzem ao erro: (1) falta de vontade para pesquisar, estudar, produzir a prova e aprimorar o conhecimento; (2) preguiça, ociosidade e indiferença; (3) ignorar aquilo que conflita com os seus próprios interesses. As medidas errôneas consistem em: (1) proposições duvidosas e falsas tomadas por princípios; (2) hipóteses recebidas e aceitas sem discussão ou apreciação crítica; (3) paixões e inclinações predominantes que toldam o entendimento; (4) autoridade que constrange o pensamento.

George Berkeley (1685 a 1753), nascido na Irlanda, bispo de Cloyne, professor, filósofo, criticou a teoria das idéias abstratas de Locke. Tese fundamental da sua filosofia: o existir de algo é o mesmo que ser percebido. A teoria das idéias de Locke é incompatível com a teoria representativa do conhecimento. Berkeley expõe suas teorias no “Ensaio para uma Nova Teoria da Visão” e nos “Princípios do Conhecimento Humano”. O enigma de ver as coisas em posição normal apesar de ser invertida a imagem que se forma na retina tem solução simples: vemos com os nossos olhos mas não olhando para trás como se olhássemos uma tela. As percepções visuais não são de coisas externas, mas simplesmente de idéias na mente. Todas as percepções produzem idéias de sensação apenas na mente. A matéria é portadora metafísica das únicas qualidades que dão origem às experiências que são conteúdos mentais. Ser é ser percebido. Somente na experiência e através dela faz sentido falar de algo como existente. As chamadas idéias abstratas na realidade são apenas nomes gerais que se referem a uma coisa de um grupo de coisas. A palavra “triângulo”, por exemplo, refere-se a qualquer triângulo, mas não a uma abstração. Se toda experiência constitui-se de idéias de sensação e reflexão, não se pode afirmar então que as idéias correspondem a objetos que não são conhecidos e nem cognoscíveis. No discurso ouvimos o conteúdo da fala mais do que os significados verbais isolados uns dos outros e depois encadeados como contas de um colar. 

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