sábado, 30 de novembro de 2013

FILOSOFIA - VI-A



Palestina (continuação).

Após a morte de Salomão (935 a.C.) as 10 tribos do norte não aceitaram a chefia do seu filho Roboão e constituíram um estado próprio que se chamou Reino de Israel. As duas tribos do sul formaram o Reino de Judá. Depois de dois séculos, o Reino de Israel é conquistado pelos assírios e seus habitantes deportados para províncias assírias. (722 a.C.). Chegou a hora do Reino de Judá: os caldeus o destruíram e deportaram os habitantes para a Babilônia (586 a.C.). Jerusalém foi pilhada e queimada; a “lei” virou cinza (textos que supostamente compunham os cinco primeiros livros da Bíblia). No exílio, fundados na tradição oral e nos fragmentos de textos, o sacerdote Esdras e outros eruditos elaboram a “lei” (cinco primeiros livros do AT) em substituição a supostos textos que os caldeus teriam queimado junto com o templo de Jerusalém (não há evidência da anterior existência desses livros).
Ciro, rei da Pérsia, conquista a Babilônia e autoriza os judeus a retornarem a Palestina. Parte deles preferiu ficar na Mesopotâmia, indício de que o “cativeiro” não era tão ruim como pintado por alguns escritores. Na verdade, tratava-se de exílio e não de cativeiro. Aliás, não se pode confiar nos textos contidos na Bíblia ou em livros esparsos, escritos por judeus sobre a história deles, porque são tendenciosos; exageram nos padecimentos e nas vitórias; denigrem os inimigos; inventam episódios e manipulam números e datas. Para se obter alguma verdade é necessário recorrer à história documentada dos povos daquela época. Após prestar vassalagem à Pérsia, os judeus caíram sob o domínio de Alexandre da Macedônia e depois de Ptolomeu do Egito. Liderados pela família Macabeus, eles conseguiram independência política por um século. Depois, foram dominados por Roma (63 a.C.).
As divisões territoriais da Palestina (tetrarquias) eram administradas por governantes judeus nomeados por Roma. A dinastia de um desses governantes durou 81 anos (Herodes, 37 a.C. a 44 d.C.). A Judéia (sul da Palestina) passou a ser administrada diretamente por Roma. Ao tempo de Jesus adulto (o Cristo) o administrador era um general romano chamado Poncio Pilatos. Instigada pelos zelotes (judeus nacionalistas radicais) a massa revoltou-se contra a autoridade romana enquanto a elite, ciente do poderio de Roma, sensatamente preferia manter o status quo (66 d.C.). A revolta foi sufocada e Jerusalém novamente destruída (70 d.C.). De protetorado (país sob proteção de outro mais forte) a Palestina passou a província de Roma. O imperador Adriano impôs a cultura helênica na Palestina (isto restringia a liberdade religiosa dos judeus), fundou uma colônia em Jerusalém e ali construiu um templo dedicado a Júpiter Capitolino (isto ofendia o sentimento religioso dos judeus). Um rabino de nome Akiba declara messias o líder popular radical Simon Bar Kokhba e o encoraja a chefiar revolta contra a autoridade romana. Sufocada a rebelião pelos romanos, os judeus foram expulsos de Jerusalém (132 a 135 d.C.).
Na antiguidade, cada povo tinha os seus deuses e a religião estava ligada à política. Daí o rei ser ao mesmo tempo comandante político e sumo sacerdote. O povo submetia-se à autoridade política e aos sacerdotes e profetas. Nas cerimônias públicas misturavam-se religiosidade e civismo. O povo hebreu seguiu o figurino da época. A religião final desse povo serviu de ponto de partida ao cristianismo e ao islamismo. No período pré-mosaico (1400 a 1100 a.C.), os hebreus eram animistas: adoravam os espíritos residentes em árvores, montanhas, poços, fontes de água e pedras de formato especial; praticavam a necromancia (adivinhação pela invocação dos mortos), a magia e o sacrifício de animais racionais e irracionais. Com o tempo, os hebreus evoluíram para o politeísmo antropomórfico: deuses de forma e características humanas que tutelavam lugares e tribos e recebiam o tratamento genérico de “El” (= sagrado). A monolatria foi o estágio seguinte (período mosaico: 1100 a 800 a.C.). Na monolatria exige-se o culto exclusivo a um só deus embora a existência de outros deuses de povos distintos seja reconhecida. A nova religião foi imposta por Moisés. Na condição de príncipe e sacerdote egípcio, Moisés conhecia o monoteísmo do faraó Aquenaton cultivado por uma elite sacerdotal egípcia em caráter privado. Moisés viu nos hebreus egípcios a oportunidade de realizar o seu sonho: constituir um estado monoteísta. O novo deus era antropomórfico. Segundo a lenda, Javé exibiu suas costas para satisfazer a curiosidade de Moisés: “me verás por detrás, pois a minha face não pode ser vista; o homem não poderia me ver e continuar a viver”. Javé era bondoso e maldoso, possuía as virtudes e os defeitos humanos. O seu poder não ultrapassava as fronteiras da Palestina (deus tribal). Esse deus punia as pessoas e as tribos quando o contrariavam. Os kenitas, povo que vivia próximo ao Monte Sinai, tinham um deus semelhante. Moisés o tomou por empréstimo e o batizou com o nome de Javé. O decálogo contido no livro Êxodo (Bíblia, AT) foi escrito entre os anos 700 a 300 a.C., quando Moisés já estava morto há centenas de anos. O nome Jeová ao invés de Javé, resultou de um erro cometido por tradutores cristãos no século XIII (1201 a 1300).
O politeísmo vigorava no mundo antigo e a classe sacerdotal era poderosa. O faraó Aquenaton tentou fazer do monoteísmo religião oficial do Egito. Acusado de heresia por afrontar a religião tradicional, ele ficou em prisão domiciliar no seu palácio. Acredita-se que as suas refeições eram temperadas com doses homeopáticas de veneno. Morreu jovem. Retornaram: o Egito, ao politeísmo; os sacerdotes, ao poder; a cidade de Tebas, ao seu antigo esplendor. A cidade construída pelo rei herege foi abandonada às traças. De olhos postos neste precedente e com receio de igual fracasso, Moisés convenceu os hebreus egípcios de que eles tinham sido eleitos por um deus poderoso. O engodo visava ao sucesso da nova religião, obter fidelidade do povo e impedir o politeísmo no estado a ser constituído.  
Apesar dos esforços de Moisés e dos profetas posteriores, os hebreus recaíram no politeísmo por diversas vezes. Além disto, mantiveram a adoração da serpente, os sacrifícios sangrentos, as orgias nos rituais de fertilidade, o fetichismo e a magia. Chefes de seitas ascéticas reagiram à corrupção nas práticas religiosas, condenaram o conforto da vida civilizada e incitaram o povo hebreu a morar em tendas. Elias, um desses chefes, abominou o culto de Baal, matou os seus sacerdotes e insistiu no culto exclusivo a Javé. Seguiu-se a revolução profética dos anos 800 a 600 a.C. Os profetas defendiam uma nova filosofia religiosa: (1) monoteísmo ao invés de monolatria: Javé é o único deus do universo; não existem outros deuses; (2) Javé é deus da retidão, mas não é onipotente, pois a sua força é limitada pela justiça e pela bondade; (3) o mal deste mundo vem dos homens e não do deus; (4) a religião tem finalidade ética: Javé não se atém ao ritual e ao sacrifício; espera que os homens pautem suas vidas pela justiça, ajudem os oprimidos e amparem os órfãos e as viúvas. Os abusos sociais, o acúmulo de riqueza, a exploração do pobre pelo rico, as práticas religiosas estrangeiras, as superstições, tudo isto os profetas condenavam. Sob a proteção de Javé, o povo, se purificado, escaparia do domínio estrangeiro. Os profetas advertiam governantes e governados do perigo da invasão estrangeira; eles aspiravam uma sociedade harmônica e justa, relações sociais humanitárias, integridade e independência da nação.
Os hebreus da época anterior ao exílio não acreditavam no céu, no inferno ou em Satã. No seio do povo era escassa a espiritualidade. Havia traços supersticiosos. Durante o exílio na Babilônia, os judeus tornaram-se pessimistas, fatalistas e passaram a acreditar na transcendência da natureza do seu deus (586 a 539 a.C.). Javé passou a ser visto como onipotente, inacessível, santo, e seus pensamentos e hábitos não eram de homem. O dever do homem era a submissão à vontade divina. A fim de assegurar a identidade nacional pela via religiosa, as lideranças judias restabeleceram a guarda do sábado, as formas de adoração na sinagoga, a circuncisão e a distinção entre alimentos puros e impuros. Deste retrocesso resultou maior poder aos sacerdotes e a religião se torna eclesiástica. Os judeus sentiram a poderosa influência da religião persa durante e após o exílio na Babilônia e dela absorveram o dualismo, o messianismo, o esoterismo e a noção de vida extraterrena. Eles aceitaram idéias persas como: (1) a crença em Satã como agente do mal; (2) a vinda de um redentor espiritual; (3) a ressurreição dos mortos; (4) o juízo final; (5) a revelação divina. Passaram a acreditar que os textos sagrados eram ditados diretamente por deus aos seus fiéis; se não ditados, ao menos, eram inspirados por deus. Sob tal crença, os textos escritos por Esdras e outros eruditos durante o referido exílio foram aceitos como de inspiração divina (586 a 539 a.C.).

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