terça-feira, 5 de novembro de 2013

FILOSOFIA III - A



Mesopotâmia (final).

Por volta de 2000 a.C. o reino sumério, cuja capital era então a cidade de Ur, fora invadido pelos elamitas, mas acaba sob o domínio dos amoritas, povo semita oriundo da Arábia. Esses conquistadores fizeram da Babilônia a capital do novo reino, restauraram a cultura sumeriana, estabeleceram um regime político autocrático e conquistaram as nações vizinhas, inclusive a Assíria. Eles são tratados como antigos babilônios para se distinguirem dos novos babilônios (caldeus) que ocuparam aquela região mil anos depois. O seu mais notável rei foi Hamurabi, que adotou o sistema de leis dos sumérios, aumentou a lista dos crimes contra o estado, agravou as penas por sedição e traição, cominou pena de morte aos delitos de vadiagem, de desordem em taberna e de acoitamento de escravos fugitivos. Feitiçaria e negociar sem contrato escrito ou sem testemunha também eram crimes. O escravo teria a orelha cortada se questionasse o direito do senhor. Ficava sujeito a punição quem deixasse de cultivar o campo ou negligenciasse diques e canais. Nenhum infrator da lei podia ser perdoado sem o consentimento da vítima ou da respectiva família. O adultério justificava o divórcio. Mulheres e crianças objeto de venda ficavam submetidas à escravatura no máximo por quatro anos, proibida a venda da mulher escrava que gerasse filho do seu senhor. A economia era regulamentada pelo estado (agricultura, comércio, indústria, pesos e medidas, empréstimo de dinheiro a juros, câmbio, escrituras, contratos). A propriedade privada da terra era permitida, cabendo ao proprietário 2/3 da produção do rendeiro.
Marduk (deus principal), Ishtar (deusa principal) e Tammuz (irmão e amante da deusa) eram as divindades maiores dos babilônios nessa época. A morte do deus no outono e a sua ressurreição na primavera eram vistas como a causa de igual movimento no reino vegetal. Astrologia, adivinhação, magia, feitiçaria, demonologia, pecado, integravam a mentalidade e condicionavam a conduta dos babilônios. Desse período é um texto que conta a história de um indivíduo que muito padeceu na vida sem saber o motivo e que faz reflexões profundas sobre o desamparo do homem e os mistérios do universo. Cuida-se de história e de pensamento filosófico lançados posteriormente no Livro de Jó (Bíblia, AT).
O reino babilônio foi invadido por um povo bárbaro conhecido como cassita, cuja maior proeza foi introduzir o cavalo na Mesopotâmia, onde permaneceu por 600 anos (1750 a.C.). No final desse período o território foi conquistado pelos assírios, povo semita de vocação guerreira que habitava o planalto de Assur, ao norte do Rio Tigre. Além da Babilônia, os assírios conquistaram o Egito, a Fenícia, a Síria, o Reino de Israel e só não conquistaram o pequenino Reino de Judá devido à peste que assolou o exército na ocasião (o escritor bíblico atribuiu esse fato à intervenção direta do deus Javé). O regime político era autocrático, mas a administração era descentralizada tendo em vista a extensão do império. O poderio militar era imenso e sem paralelo na época; o exército era permanente; os comandantes participavam das pilhagens, obtinham grandes propriedades em razão das vitórias e integravam a classe rica. Os assírios serviam-se do terror para manter o domínio sobre os povos conquistados: mutilavam os inimigos vencidos, esfolavam-nos vivos, empalavam-nos, amputavam-lhes as orelhas, narizes e órgãos sexuais; exibiam-nos em gaiolas pelas cidades; registravam essas atrocidades por escrito e as publicavam para conhecimento geral.
A paixão pela guerra não deixou lugar para atividades comerciais e industriais. Por força de lei, essas atividades ficaram a cargo dos estrangeiros, principalmente, arameus, povo semita aparentado com os fenícios e hebreus. Os servos, camada pobre da sociedade assíria, cuidavam da agricultura e também eram obrigados ao serviço militar e a trabalhar nas obras públicas. Os escravos gozavam de alguns direitos; a eles cabia o trabalho doméstico. A construção de palácios, templos, estradas, canais, cabia aos prisioneiros de guerra escravizados; eles trabalhavam agrilhoados. Drásticas eram as penas cominadas à perversão e ao aborto. O marido era dono da esposa e a ele cabia exclusivamente a iniciativa do divórcio. A mulher casada estava proibida de aparecer em público sem um véu a lhe cobrir o rosto. A poligamia era permitida. A atividade intelectual consistia em narrativa das campanhas militares, cartas de teor comercial, fórmulas mágicas, além da compilação de textos dos babilônios. A dedicação ao conhecimento científico tinha fins práticos, principalmente de caráter militar. Os assírios dividiram o círculo em 360 graus, descobriram cinco planetas aos quais deram nome e previam os eclipses com sucesso. Utilizavam mais de 500 drogas de consistência vegetal e mineral, identificaram sintomas de algumas doenças, atribuíam causas naturais às moléstias sem excluir dos métodos terapêuticos os encantamentos e as beberagens para expulsar demônios. O império assírio durou 700 anos (1300 a 600 a.C.).
Os caldeus, povo semita, conquistaram a Assíria. O governador provincial de nome Nabopolassar, rebelou-se e capturou Nínive, a capital do império assírio (612 a.C.). O filho desse governante expandiu os seus domínios no Oriente Próximo. Esse conquistador chamava-se Nabucodonosor. Ele e os seus sucessores prestigiaram a cultura da época de Hamurabi, restabeleceram a forma de governo, as leis e o sistema econômico. A capital do império voltou a ser a Babilônia. O pequenino Reino de Judá que escapara dos assírios não escapou dos caldeus; foi dominado tal como outras nações daquela área. Os judeus descabelaram-se, jogaram cinzas sobre a cabeça, rasgaram as roupas, mas nem assim o deus Javé os socorreu. O templo de Jerusalém foi saqueado e queimado. O rei de Judá foi cegado e deportado para a Babilônia com milhares de súditos.
Os caldeus fundaram uma religião astral. Os deuses foram despidos das suas limitações humanas e cultuados como seres poderosos e superiores, identificados com os planetas (Marduk é Júpiter; Ishtar é Vênus). Os propósitos divinos eram inescrutáveis. As crenças implicavam: (1) fatalismo: cada indivíduo devia se resignar com a sorte que lhe coube neste mundo; (2) submissão incondicional à divindade na certeza de que o resultado final seria bom; (3) humildade ante os mistérios da vida e o poder divino, daí derivando piedade, conceito que será adotado por outras religiões como a hebraica, a cristã e a muçulmana; (4) consciência espiritual manifestada através de hinos de penitência; (5) orações aos deuses para concederem ao suplicante vida longa, descendência numerosa e o desfrute de prazeres; (6) rebaixamento do homem, considerado criatura má, rasteira, iníqua, covarde e pecadora.
Os caldeus apreciavam virtudes como justiça, retidão, benevolência, reverência, pureza de coração. Eles censuravam a calúnia, a opressão e o ódio, sem perder o interesse pelos bens materiais e pela sensualidade. Esse povo aprofundou os estudos de astronomia; inventou a semana de sete dias, a divisão do dia em 12 horas duplas de 120 minutos cada uma (como se vê no mostrador dos relógios ainda hoje, apesar da era digital); calculou a duração correta do ano; descobriu a variação anual da inclinação do eixo da Terra. Os mapas celestes e os dados astronômicos além de orientar os navegantes e nutrir a mitologia, destinavam-se a prever o futuro que os deuses reservavam à humanidade. O movimento dos astros indicava esse futuro porque os deuses estavam corporificados nos planetas. Os caldeus também copiaram e divulgaram textos dos antigos babilônios. Os imperadores caldeus se depararam com problema idêntico ao dos assírios: extensão territorial e densidade demográfica excessivas, o que dificultava a administração e a manutenção da ordem. Os medos, povo tributário situado a leste do Rio Tigre e nordeste da Pérsia (hoje, Irã), provocaram distúrbios seguidos. Os sacerdotes, os comerciantes e os judeus passaram a conspirar para a derrubada do rei (Nabônidus). Os conspiradores civis, eclesiásticos e militares facilitaram a invasão de Ciro, rei dos persas, recebido como libertador. O comandante do exército caldeu, general Gobrias, abriu as portas da cidade ao soberano persa (539 a.C.). Por essas portas abertas entrava também o crepúsculo da civilização mesopotâmica.


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