domingo, 25 de setembro de 2016

DEPOIMENTO III

Quando eu prestava serviço militar na capital do Paraná, primeiro como soldado na Companhia do Quartel General situada na Praça Rui Barbosa e depois como cabo no quartel do material bélico situado no bairro Bacacheri (1958/1960), aprendi outro significado da palavra nojo que me surpreendeu: luto, pesar, tristeza. Havia um período de nojo por morte de um membro da família do militar. Dessa palavra eu só conhecia o significado vulgar: asco, náusea, repugnância.
Nesta semana, a palavra nojo ganhou espaço nos meios de comunicação social pela voz de uma celebridade política paranaense. Do seu discurso ressaltou o nojo no sentido comum de asco, náusea, repugnância. Entrevistado por uma emissora de televisão, o candidato a Prefeito Municipal de Curitiba, Rafael Grecca, revelou que tinha nojo de pobre. Depois da repercussão social, tentou minimizar a ofensa, dizendo que não se referiu a pobre como classe. Certamente, pretendeu dizer que a referência era ao indivíduo pobre cujo cheiro o fizera vomitar.
Colegas meus da magistratura da Guanabara (depois, novo Estado do Rio de Janeiro) fundaram, nos anos 70, curso preparatório para concursos públicos e me convidaram para lecionar Direito Constitucional. Aceitei o convite. Uma das alunas aprovadas no concurso para a magistratura obteve a maior nota na minha disciplina. Ela foi uma juíza dedicada, firme e corajosa, sem medo de enfrentar a gangue do jogo do bicho e prender os chefões. Depois de se aposentar, ela ingressou na política partidária e foi eleita deputada federal. Solicitou-me, então, assessoria. Nessa época eu já estava aposentado da magistratura e afastado da advocacia. Aceitei o encargo.  
Durante o tempo em que durou o seu mandato, ela me enviava os projetos de Brasília para Penedo (Itatiaia/RJ) pelo correio. Eu saí do meu ócio  “cum dignitatem” para estudar projetos, tanto os da autoria da deputada como os da autoria de outros deputados dos quais ela era relatora. Elaborados os pareceres, eu devolvia os projetos ao gabinete dela em Brasília via sedex.
Ao aceitar a tarefa, eu adverti a ex-aluna e colega de toga, de que meu enfoque seria eminentemente jurídico e que ela devia examinar o texto do ponto de vista político a fim de amoldá-lo aos costumes e à linguagem da Casa Legislativa. Quiçá pelo volume de trabalho ou por confiança no mestre, a deputada deixou de fazer a sua parte e apresentava os projetos tal como vinham de Penedo. Num projeto de cunho social do qual ela era relatora, eu formulei um argumento fundado na psicologia social: o asco provocado nas pessoas por feridas e mutilações corporais expostas pelos pedintes nas ruas. Os opositores da deputada na Câmara dos Deputados, principalmente do PT, pinçaram esse trecho do parecer e promoveram um escândalo, como se a deputada tivesse nojo dos deficientes físicos. A época era de campanha eleitoral para o governo do Estado do Rio de Janeiro. Resultado: o concorrente, Sérgio Cabral, venceu as eleições. O povo do Estado do Rio de Janeiro perdeu uma excelente candidata ao governo e elegeu um pilantra, um deficiente intelectual e moral que sumiu do mapa ao findar o seu mandato.
A Lei do Karma não demorou a atuar. A candidata do PT ao governo da cidade de São Paulo provou o veneno manipulado por seu próprio partido. Psicóloga especializada em sexo e na troca de parceiro, ela aconselhou as mulheres, na linha do “estupra, mas não mata” de Paulo Maluf, a não oferecer resistência quando estupradas; assim, elas evitariam ser mortas pelos estupradores. A receita da sexóloga era “relaxe e goze” ao invés de resistir. Os adversários políticos se aproveitaram da indecência da receita para desqualificar a candidata. Resultado: o concorrente venceu as eleições.
Ao analisar acontecimentos do passado, notei que a Lei do Karma não é mera crença oriental e sim uma lei da natureza na sua dimensão espiritual. Trata-se de um mecanismo compensatório involuntariamente acionado pelo pensamento e pela conduta das pessoas equivalente ao princípio da causalidade em Física. Cada ser humano responde por seus atos de diversos e inesperados modos que repercutem no corpo e na alma. Se o indivíduo pensou e agiu bem, recebe o bem; se pensou e agiu mal, recebe o mal. Tome-se como exemplo o episódio de conhecimento nacional quando, no debate ocorrido em emissora de televisão durante campanha eleitoral, Fernando Collor atacou Luis Inácio pelo ângulo da família, ferindo os sentimentos do concorrente. Isto gerou o efeito cármico: a família de Collor desmoronou, ele perdeu o cargo de Presidente da República e saiu desmoralizado.     
A técnica de pinçar frases e apresenta-las fora do contexto onde foram enunciadas tem sido utilizada nos debates políticos. Trata-se de ferramenta do jogo sujo da política partidária agora também utilizada por procuradores e juízes nas operações policiais e judiciais sob o pretexto de combater a corrupção.    
A semelhança daquele episódio fluminense com o atual escândalo paranaense é o vocábulo nojo. A diferença é que Rafael Grecca não foi vítima de uma patifaria como o foi a deputada carioca (mineira). Nada foi pinçado do discurso de Grecca e desvirtuado para desqualificá-lo como candidato ao governo de Curitiba. Ele foi o protagonista da preconceituosa e explícita discriminação social. Ele afirmou categoricamente que nunca ajudara os pobres, que ele não era São Francisco de Assis, que a única vez que ajudara um pobre e o conduzira em seu automóvel, vomitara com o cheiro. Olfato seletivo. O presidente João Figueiredo preferia o cheiro de cavalo ao cheiro de gente. Certos odores estimulam delicados olfatos, como o de Grecca, provocando vômito ou diarreia.
Ainda que por ato falho, Grecca revelou a verdade que a hipocrisia escondia: repugnância aos pobres. Ele é o retrato daquela parcela aristocrática da população curitibana que tem nojo de pobre e de preto. Quanto ao terceiro “p” só os pastores pentecostais têm repugnância, embora fingida. Na opinião geral, as putas têm serventia social. As prostitutas de luxo são prestigiadas e apreciadas pelos machos e pelas lésbicas da alta sociedade curitibana. O elevado poder aquisitivo permite a luxúria. Quanto às prostitutas do Congresso Nacional, elas usam o mandato parlamentar para: (1) golpear as instituições democráticas; (2) alienar o patrimônio nacional; (3) defender os latifúndios; (4) manter a soberania do capital; (5) reduzir os direitos dos trabalhadores; (6) combater programas sociais; (7) impedir medidas de proteção ao meio ambiente. 
Provavelmente, o obeso candidato curitibano perderá votos do eleitorado pobre, mas certamente terá a preferência das camadas média e alta da sociedade, onde pululam fascistas e nazistas. 

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