Parece título de filme, mas se trata de um fato real:
a violência praticada pela força policial contra os professores em Curitiba no dia
29 de abril de 2015, quarta-feira à tarde. A pauta da Assembléia Legislativa do
Paraná incluía projeto de lei que autorizava o governo a manipular o dinheiro
da previdência social em oposição aos direitos e interesses do magistério
estadual. Os professores para lá se dirigiram em massa e de mãos limpas a fim
de pressionar os deputados, como é próprio da democracia. Foram impedidos de
ingressar no prédio da Assembléia por enorme e bem armado contingente da
polícia militar. Centenas de manifestantes sofreram ferimentos. O governo conseguiu
aprovar o projeto com o voto de 60% dos deputados.
Custa acreditar que o filho de José Richa fosse capaz
de tamanha crueldade e safadeza. Quiçá, na ânsia de se emancipar da aura do
pai, Beto Richa liberou a face
demoníaca da sua personalidade.
Ao tempo da Assembléia Nacional Constituinte (1987), José
Richa e Bernardo Cabral, separadamente, acolheram o trabalho que lhes enviei
contendo 16 propostas para serem incluídas na futura Constituição da República,
acompanhado da sugestão de que no projeto já em estudo fosse substituída a
expressão “juiz subordinado ao tribunal”
por “juiz vinculado ao tribunal” em
atenção à necessária independência do juiz na função jurisdicional. Bernardo
respondeu de forma pessoal e bem educada, comunicando o recebimento do trabalho
e agradecendo a colaboração. Quando a Constituição foi promulgada (1988), José,
com palavras respeitosas, teve a gentileza de me enviar um exemplar da nova
Constituição autografado. A maioria daquelas propostas constava do texto
constitucional e a mencionada sugestão também fora acatada. Eu ainda morava no
Leblon e exercia o cargo de Juiz de Direito da Capital do Estado do Rio de
Janeiro. Fiquei sabendo, por meus amigos do Paraná, que o senador José Richa
era assim mesmo, homem educado, atencioso e de bons princípios. O mesmo não se
pode dizer do filho Beto, hoje
governador daquele Estado.
Em sítio da média alternativa (www.viomundo.com.br), li artigo de um
médico, ex-deputado do Paraná, Dr. Rosinha, que atribuía a culpa pelo massacre
ao governador Richa e ao secretário de segurança Francischini. O articulista foi
injusto com Adolf Hitler ao compará-lo com Beto
Richa. Nada há de comum entre eles, salvo o fracasso final.
O líder alemão não nasceu no seio de família rica. Bem
ao contrário, era de origem pobre. O líder alemão não era insensível. Bem ao
contrário, amava a pátria e a sua companheira; tinha senso estético, embora a
sua pintura fosse mediana tal como a de Churchill. O líder alemão não era
hipócrita. Bem ao contrário, defendia a doutrina nazista à luz do dia, plena e
abertamente, e desejava que outros povos também a seguissem. O líder alemão não
era covarde. Bem ao contrário, defendia as suas idéias com vigor. Na mocidade,
participou da primeira guerra mundial, foi promovido de soldado raso a cabo do
exército e condecorado por bravura. O líder alemão não massacrava o seu povo. Bem
ao contrário, limitava-se a castigar minorias dentro e fora da Alemanha por
motivo racial que ele achava justo e acreditava ter base científica. Adolf não
era insidioso. Bem ao contrário, era carismático, venerado e apoiado pela
maioria do povo alemão. Convicto e sem disfarce, ele acreditava piamente na
pureza e superioridade da raça ariana e no destino glorioso do III Reich.
Cuidava de modo especial e eficaz da educação, da ciência e da cultura; valorizava
e apoiava decididamente os professores, cientistas, artistas e atletas. Adolf não
governava uma província. Bem ao contrário, governava um país europeu em expansão. Sob o seu
governo, a Alemanha controlou a inflação, teve um extraordinário desenvolvimento
econômico e cultural e foi parceira comercial do Brasil (1934/1941). A euforia
gerada pelo sucesso, a confiança excessiva e a desmedida ambição política e
militar causaram a ruína de Adolf e do seu Reich (1942/1945).
Beto Richa (Carlos Alberto),
londrinense, engenheiro, político, dandi aristocrata, nascido no seio de
família rica, filiado a um partido político elitista, governa mal a sua
província e a conduz à falência. A depressão gerada pelo fracasso e a
arrogância do governador apontam para a ruína. Sobre ele paira a sombria nuvem da
corrupção. À semelhança de Nero, que gargalhava ao som da lira enquanto Roma
ardia em chamas, Beto gargalhava enquanto os professores eram massacrados no
Centro Cívico. Neste local, projetado e construído na década de 1950 pelo
governador Bento Munhoz da Rocha Neto (engenheiro, sociólogo, escritor,
professor) estão sediados os três poderes do Estado do Paraná (Assembléia
Legislativa, Palácio do Governo e Tribunal de Justiça). A ficção política e a
demagogia foram desnudadas. A chamada casa
do povo mostrou a sua cara: reduto dos pilantras que se consideram a elite daquele
Estado.
O discurso de prioridade da educação revelou-se
artifício retórico meramente eleitoreiro. Na vida real, o governo paranaense atua
em sentido contrário ao da valorização dos profissionais da educação escolar,
ou seja, desobedece ao comando do artigo 206, inciso V, da Constituição da
República (CR). Cumpre lembrar, ainda, que o legislador constituinte nacional
estabeleceu norma destinando à manutenção e ao desenvolvimento do ensino 25% da
receita estadual proveniente dos impostos (CR 212). Caso o governador não
esteja cumprindo esta e outras obrigações, poderá ser afastado do cargo
mediante processo parlamentar de impeachment independente da ação judicial
cabível.
A perversidade desse governador foi demonstrada pela
ação traumática dos seus comandados. Os policiais atiçavam os cães contra as
pessoas. Algumas foram mordidas. Contra os manifestantes foram lançadas bombas
de gás lacrimogêneo, disparadas balas de borracha, desferidas cacetadas. A
imagem de um professor idoso, deitado no asfalto, retratava bem o episódio
dantesco. Homens e mulheres foram tratados com extrema violência. O governador
também foi aluno em escola pública e em colégio particular quando criança e
adolescente. Aos professores ele deve a cultura que tem, ainda que estreita. Beto não aproveitou de forma digna e
adequada a educação que lhe foi dada. Cuspiu no prato em que lhe foi servido o
alimento do intelecto e da alma. São os professores que educam os filhos dos
paranaenses. Esse fato não sensibiliza o governador porque a amoralidade está
no DNA da casta política oligárquica a que ele pertence.
O curioso e paradoxal é que, nas eleições de 2014, os
curitibanos votaram maciçamente nos candidatos do PSDB à presidência da
república e ao governo do Estado. Esperava-se, pois, que o governador eleito tratasse
os curitibanos com deferência e respeito e não com tiros e bordoadas.
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