sábado, 28 de dezembro de 2013

FILOSOFIA VII - E



Grécia (continuação).



O pensamento filosófico alcançou altura e profundidade nas duas culturas: helena e helenística. O divino, o universo, o ser humano, a sociedade e o estado, também faziam parte da reflexão filosófica nas civilizações anteriores. A diferença está em que os helenos expurgaram dessa reflexão os elementos lendários, mitológicos, mágicos e supersticiosos. Deram-lhe tratamento autônomo e racional; revestiram-na de linguagem e métodos próprios. Como relata Fustel de Coulanges, a religião era poderoso fator na cultura dos gregos e romanos (A Cidade Antiga. Lisboa, Livraria Clássica Editora, 16ª edição). Compreende-se, pois, a infiltração mística no pensamento de Pitágoras, Platão e outros filósofos. O pensamento filosófico incluía o religioso (deuses, cultos domésticos e coletivos), o político (formas de governo, cidadania), o social (educação, família, servidão, costumes), o econômico (propriedade, produção, escravatura). Alguns filósofos foram perseguidos sob acusação de se colocarem contra os deuses da cidade e de corromper a mocidade. O movimento pendular da razão à contemplação e da contemplação à razão, refletia o dualismo humano: ordeiro e racional de um lado, indisciplinado e irracional de outro; ora ativo, ora passivo; ora prático, ora especulativo. Para ser válido, o conhecimento tinha de passar pelo crivo da razão. O objetivo era livrar a mente da ignorância, afastar o medo ante o desconhecido, encarar o mundo como acessível à razão, alcançar o bem através da investigação desinteressada.

Mileto, capital da Jônia, colônia grega no litoral da Ásia Menor, foi o berço da filosofia grega. A chamada Escola de Mileto repousava sobre a idéia de que havia um elemento primário fonte do universo: a diferença entre as coisas consiste na quantidade de substância primordial nelas contida. Os membros dessa escola divergiam quanto à identificação desse elemento. Tales afirmava ser a água (estados líquido, sólido e gasoso); Anaximandro afirmava ser uma substância não gerada e imperecível (o ilimitado, energia vital inesgotável); Anaxímenes afirmava ser o ar. A filosofia de Mileto rompeu com as concepções mitológicas sobre o mundo e tinha uma finalidade prática. Manteve a concepção egípcia da eternidade do universo. Afirmava a existência de um ritmo natural de criação e decadência, mudança contínua e cíclica. Abria caminho tanto para a teoria da evolução (Anaximandro), como para a teoria atômica (Anaxímenes). Não se há de buscar a injustiça na luta entre contrários e sim no desrespeito à lei dizia Anaximandro para justificar sua teoria. Ainda no século VI, as questões físicas sofrem a concorrência das questões metafísicas (600 a 501 a.C.). Os filósofos passam a especular sobre a natureza do ser (ontologia), da verdade (epistemologia) e do divino (teologia). Segundo a escola pitagórica, a Terra, o Sol e todos os planetas giram em torno de um fogo central. O fundador dessa escola chamava-se Pitágoras, nascido em Samos, cidade da Jônia. Radicado em Crotona, na Itália meridional, este filósofo imprimiu um sentido religioso à filosofia. Pitágoras considerava a vida especulativa o mais alto bem. Para chegar a esse patamar, o homem devia purificar-se. A música auxiliaria o homem neste processo de purificação. A essência da matéria não é uma substância (ar, água) e sim uma abstração: o número. Todas as coisas podem ser controladas se descobertas suas estruturas numéricas. A ordem cósmica explica-se por relações numéricas. O mundo é bipolar: espírito e matéria; harmonia e discórdia; bem e mal. Transpostas do mundo natural para o mundo cultural, a harmonia e a proporção – que são aspectos da constância matemática – manifestam-se como ordem, justiça, direito, limite e moderação. O pensamento matemático dessa escola repercute no pensamento filosófico e teológico. Ao tratar de um triângulo, por exemplo, o matemático não se refere ao concreto, mas a algo que ele enxerga apenas com os olhos da mente. Isto evidencia a distinção entre o inteligível e o sensível. A proposição resultante da operação matemática é verdadeira e eterna. Da proposição matemática à proposição filosófica a distância é curta: só o inteligível é real, perfeito e eterno, enquanto o sensível é aparente, defeituoso e transitório.

Para Xenófanes, o fundamento de todas as coisas é Deus, idêntico ao universo; não se parece física ou mentalmente com os mortais; “sem instrumentos, governa todas as coisas pelo pensamento da sua mente”. Outros filósofos concentraram-se no problema da mudança e da continuidade, da natureza da matéria, da essência do universo e da capacidade da razão para chegar à verdade. Segundo Parmênides (que expôs suas teorias em forma poética) a real natureza das coisas consiste na estabilidade e continuidade; a mudança e a diversidade são ilusões dos sentidos. Anaxágoras acreditava na existência de vários mundos. A fonte do movimento é nous, um princípio ativo e inteligente equiparado a deus. Os contrários permanecem unidos e uma coisa se transforma em outra. Para manter coerência, Anaxágoras não prestava culto aos deuses da cidade e nem cumpria deveres de cidadão, motivo pelo qual foi preso e condenado à morte. Conta-se que Péricles, seu amigo, facilitou-lhe a fuga.




Nenhum comentário: