quarta-feira, 6 de junho de 2012

AMOR E JUSTIÇA2


Às relações humanas convém a nominal e negativa definição: amar é não odiar; odiar é não amar. A ausência de afeição pode significar indiferença e não ódio. Inobstante a contraditória conduta de Jesus que transparece da narrativa dos apóstolos, os seus ensinamentos e mandamentos podem ser acolhidos por qualquer pessoa. Ateus, teístas, judeus, muçulmanos, hinduístas, budistas, xintoístas, podem aceitar o mandamento de amar ao próximo por ser o amor uma lei cósmica. Ao mesmo tempo, podem rejeitar o caráter divino que os cristãos atribuem ao profeta. No plano dos fatos, muitos que se intitulam cristãos não seguem os ensinamentos e os mandamentos de Jesus, o Cristo. Sacerdotes católicos e protestantes entregam-se à luxúria, conspiram, mentem, provocam batalhas em nome de Cristo. Filhos matam pais visando a entrar logo na herança. Para se livrar do incômodo, pais matam filhos, mães jogam filhos no lixo, crianças são largadas na rua como cães sem dono. Invasões, conflitos, genocídios, são praticados por nações e governos ambiciosos. Tortura, roubo, recusa de prestar ajuda, devastação da natureza. A falta do humanitário amor está na base dessas censuráveis condutas. O Estado pode cominar pena a ações e omissões contrárias ao bem comum, porém não pode obrigar as pessoas a cultivarem amor em seus corações.

A abordagem realista e racional do amor, como força afetiva essencial da vida, sem o colorido romântico que lhe empresta o poeta, permite percebe-lo como gerador da inclinação para coisas que causam prazer. A relação sexual entre animais racionais se diferencia da relação entre animais irracionais apenas por envolver fantasia, religião, ética e direito. O amor do ser humano a si próprio provém do desejo de atender aos reclamos do corpo e da alma. O amor entre o homem e a mulher, narrado no romance e na poesia, inclui a submissão, o que levou Jean-Paul Sartre a definir o amor como o desejo de possuir o outro. O desejo, aglutinador de apetências, faz o ser humano procurar fora de si mesmo o poder, a fama, a riqueza, o saber, a felicidade.

Sófocles, na “Antígona”, se refere a essa força afetiva: Amor, invencível amor, tu que subjugas os mais poderosos; tu, que repousas nas faces mimosas das virgens; tu que reinas tanto na vastidão dos mares como na humilde cabana do pastor; nem os deuses imortais, nem os homens de vida transitória podem fugir a teus golpes; e quem for por ti ferido, perde o uso da razão! Tu arrastas, muita vez, o justo à prática da injustiça e o virtuoso, ao crime; tu semeias a discórdia entre as famílias... Tudo cede à sedução de uma mulher formosa, de uma noiva ansiosamente desejada; tu, amor, te equiparas, no poder, às leis supremas do universo, porque Vênus zomba de nós!  

A força afetiva e magnética da vida manifesta-se entre os seres humanos como amizade, simpatia, fidelidade, caridade, compaixão, solidariedade, fraternidade, paixão, devoção, veneração. Inspira a proteção à família, às crianças, aos adolescentes, aos idosos, aos deficientes físicos e mentais. Sem exigir reciprocidade, pessoas amam as virtudes e denominam: (i) teose, ao amor a Deus; (ii) justiça, ao amor à igualdade; (iii) filosofia, ao amor à sabedoria; (iv) ciência, ao amor à verdade; (v) ética, ao amor à bondade; (vi) arte, ao amor à beleza; (vii) religião, ao amor à santidade.

O magnetismo do amor associa os seres humanos. A necessidade, a utilidade e o prazer são os motores do interesse na associação. A elegância das formas atrai as pessoas. A existência do ser vivo transcorre na fração da eternidade capturada pela inteligência humana denominada tempo. Os sentimentos humanos se expressam e duram nesse tempo. A relação amorosa entre as mesmas pessoas tanto se desgasta como se fortalece. Vigiai e orai, recomendava o profeta e grande mestre dos cristãos.

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