segunda-feira, 28 de maio de 2012

DIREITO3a


Autoridades abusam mesmo dispondo de amplo poder no Estado. Compulsão para situar-se acima das leis. Inclinação para se mostrar superior aos demais cidadãos. A experiência mostra a proporção direta: quanto mais alto o escalão, maior o abuso e mais extensos os seus efeitos. No supremo tribunal campeia o arbítrio, pois não há órgão superior que o controle. Prevalece a vontade do juiz e não a vontade da lei ou do legislador. Charles Evans Hughes, político, presidente da Suprema Corte dos EUA (1910-1916) criticava o arbítrio judicial: “Vivemos sob uma Constituição, mas a Constituição é o que os juízes dizem que ela é”. A crítica aplica-se à suprema corte brasileira com agravante. Lá, nos EUA, por ser sintética a Constituição, há largo espaço à interpretação; cá, no Brasil, por ser analítica a Constituição, o espaço para interpretar é estreito. Havia necessidade de controlar a atividade dos tribunais brasileiros ordinários e superiores. Os juízes de instância sempre foram controlados, mas desembargadores e ministros estavam a salvo de qualquer controle. Os excessos e desvios restavam sem punição por falta de mecanismos eficazes no ordenamento jurídico. A lacuna começou a ser preenchida com o Conselho Nacional da Magistratura criado pela emenda 7 à Carta Constitucional de 1967 e lei complementar 35 de 1979. Esse conselho, competente para processar reclamações contra membros dos tribunais, foi substituído pelo Conselho Nacional de Justiça criado pela emenda 45 à vigente Constituição da República.

Da história européia posterior à queda do império romano no século V (401–500) verifica-se que a judicatura libertou-se paulatinamente do senhor feudal, do rei, da igreja, da burguesia e do legislador. Apesar da progressiva liberdade de julgar, os juízes mantiveram o vínculo atávico aos donos do poder, quer em regime autocrático, quer em regime democrático, tanto em governos de centro como em governos de direita e de esquerda. Legislador, chefe de governo e juiz, todos integrados no mesmo Estado e sob a mesma ordem jurídica, são agentes daqueles que dominam de fato a nação.

Na Europa moderna (1789–1939), principalmente em França, onde era grande a desconfiança sobre a honestidade e a imparcialidade dos juízes, movimento político tentou negar-lhes o poder de interpretar as leis. O juiz devia ser apenas a boca que pronuncia as palavras da lei. A interpretação era vista como a estrada pela qual trafegava a injustiça. O movimento não vingou plenamente, mas regras de hermenêutica foram positivadas na lei para obrigatório cumprimento pelos juízes. Na Europa e América contemporâneas (1945–2012) o juiz, segundo o seu próprio entendimento e as luzes da doutrina e da jurisprudência, interpreta e aplica a lei ao caso concreto. Quando a lei não satisfaz {diferente das leis da natureza, as leis humanas variam no tempo e no espaço} o juiz guia-se pelos princípios que alicerçam a ordem jurídica. Quando os princípios do ordenamento jurídico não satisfazem, o juiz guia-se por princípios éticos, como aconteceu, por exemplo, no julgamento de alemães pelo tribunal de Nuremberg: ao invés de aplicar o direito vigente na Alemanha nazista e absolver os réus, o tribunal aplicou o direito natural e os condenou. Decisão dos vencedores. 

O conceito de assistência moral no campo do direito prescinde do amor. No recurso especial julgado pela terceira turma do STJ, o vocábulo faculdade utilizado no acórdão significa o poder subjetivo de agir ou de se omitir; supõe vontade e escolha livres. Na relação bilateral humana, amor é sentimento e não faculdade; está sujeito ao determinismo e não ao arbítrio; brota do sentir e não do querer; situa-se fora do comando jurídico. O verbo cuidar, também utilizado no acórdão (sentença do tribunal) significa alguém se ocupar ou tomar conta de outrem ou de alguma coisa; ser diligente, ser atencioso, mas não amoroso necessariamente. Como dever moral, o cuidado decorre da cultura de um povo, pode revestir caráter religioso e incluir nota amorosa eventualmente. Como dever jurídico, o cuidado é estabelecido pelo Estado; a lei coloca os limites, sem a nota amorosa. O legislador constituinte brasileiro estabeleceu o dever da família de assegurar direitos às crianças e adolescentes, entre os quais não se encontra o de amar e ser amado (CR 227 caput).

Na esfera jurídica, assistência moral vincula-se aos bons costumes. A origem latina do vocábulo indica a prática social humana: mores = costumes. Em relação aos filhos, a assistência é prestada pelos pais, no exercício do poder familiar, de várias maneiras, tais como: (1) dar bom exemplo; (2) aconselhar; (3) orientar quanto a festas, espetáculos, filmes, peças teatrais, programas de rádio, televisão e ao uso da rede de computadores; (4) advertir contra o perigo das drogas e das más companhias; (5) exigir respeito; (6) estimular a dignidade no lar, na escola e na comunidade. O exercício da autoridade dos pais independe da bilateralidade afetiva e tem finalidade prática. Se a conduta do filho não discrepa do padrão ético da sociedade, não há motivo para acusar os pais de negligência. (Código Civil, art. 1.630/1.634).

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