Marido que abandona mulher e
filhos é fato comum a sociedades em que vige a instituição do casamento. Nos
anos 40 do século XX (1901-2000) filme intitulado “Seu Único Pecado”, exibido
no Cine Império, na cidade de Ponta Grossa/PR, retratava esse drama da vida
real. O chefe da família simulou sua morte por atropelamento de trem. Fugiu em
busca de vida nova. Alguns anos depois, alquebrado, volta em nevoenta noite de
natal e espia a família pela vidraça. A filha, sem imaginar que ali estava o
seu pai, traz-lhe um pedaço de bolo. Comovida, a platéia chora. Na mesma época,
fazia sucesso canção intitulada “O Ébrio”, interpretada pelo tenor Vicente
Celestino. Virou filme nacional. O marido, traído pela mulher, perdeu a família
e os bens. Decadente, viu os amigos se afastarem. Acusou-os de ladrões e falsos
amigos. Buscava consolo na bebida e amizade junto aos ébrios. Filmes, canções e
outras artes, mostram as diferentes faces da vida humana nas relações pessoais,
de família, de negócios e profissionais.
Cientista e literato do século
XVII (1601-1700), Blaise Pascal assevera: o coração tem razões que a razão
desconhece; intuição e raciocínio coexistem; o homem experimenta Deus pelo
coração e não pela razão (in
“Pensamentos”). Os cuidados da prole são ditados pelo instinto, pelo coração e pela
razão legislada. Somente esta última gera dever jurídico. Na ação judicial em
foco, a filha reclama apenas da falta de amor, sinal de que os cuidados
consistentes na assistência material, moral e intelectual não lhe faltaram. No
entanto, a terceira turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) desloca o amor,
artificiosamente, da esfera sentimental para a esfera moral, do determinismo
natural para o livre arbítrio. Desse modo, inclui o amor como dever de
assistência moral; cria para a filha o direito de ser amada pelo pai e cria
para o pai a obrigação de amar a filha. O descumprimento dessa obrigação acarreta
penalidade civil (indenizar).
Na sentença judicial, a subsunção
do fato à norma implica: (1) valoração da prova; (2) ponderação dos interesses
em jogo; (3) apreciação do que é
e do que deve ser sob o
critério da razoabilidade; (4) comparação entre a realidade social e a
realidade emanada do processo; (5) consideração dos valores vigentes na
sociedade. Na base dessas operações está a arquitetura mental do juiz: (I)
concepções jurídicas, sociológicas, ideológicas, filosóficas; (II) formação moral,
religiosa e mística; (III) senso de proporção. Entram também nesse arcabouço
intelectual, emocional e volitivo, as idiossincrasias do juiz provocadas por diversas
causas: (i) vaidade; (ii) períodos críticos no campo psicossomático [como a
tensão pré-menstrual], no campo doméstico [como os desajustes conjugais], no
campo econômico [como o acúmulo de dívidas]; (iii) frustrações amorosas; (iv) discriminações
sofridas em face da sua origem social, ou cor da pele; (v) rejeições por sua feiúra,
bastardice, ou casmurrice.
Os diferentes modos, voluntários e involuntários, de
se combinarem esses fatores, a presença ou ausência de virtudes {independência,
imparcialidade, coragem, serenidade, eficiência} e a pressão externa {imprensa,
movimentos sociais, solicitações individuais, tráfico de influência, suborno} influem
no pensamento, no sentimento, na vontade e na conduta do juiz e geram decisões
justas e injustas, jurídicas e antijurídicas, corretas e incorretas. Daí a
cautela do legislador brasileiro ao colocar vários recursos à disposição do
povo, desde o primeiro até o último grau de jurisdição. Após decisão do Supremo
Tribunal Federal, a fieira de recursos chega ao fim. Essa cautela, entretanto,
não significa que os magistrados dos tribunais superiores estejam infensos aos
fatores positivos e negativos da prestação jurisdicional. Para controle
disciplinar dos membros dos tribunais foi criado o Conselho Nacional de
Justiça.
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