terça-feira, 21 de setembro de 2010

ROSACRUZES4

Quinta parte.

No dia 06/09, na parte da manhã, o professor paulista Luiz Eduardo Valiengo Berni, doutor em psicologia e membro da AMORC, com voz grave e empostada, boa dicção, profere a segunda e última conferência do Congresso, versando o conhecimento rosacruz e a transdisciplinaridade. Relata a origem e evolução da Psicologia, passando pelas quatro correntes: a behaviorista, a psicanalítica, a humanista e a transpessoal. Menciona a dificuldade de conceituar a psicologia no plano teórico. Diz que o tratamento científico da psicologia dificulta o diálogo com o pensamento veiculado pelas tradições esotéricas e religiosas; que o interesse por questões psicológicas conduziu Harvey Spencer Lewis ao rosacrucionismo. Iniciado nos mistérios em 1909, no templo de Tolouse (França), Lewis fundou a AMORC em 1915 (EUA) e foi o seu primeiro dirigente máximo com o título de Imperator. A psicologia do esoterismo rosacruz enquadra-se na corrente transpessoal, cujo foco situa-se no estudo da consciência humana e suas manifestações no comportamento humano. O professor expõe as quatro áreas da psicologia rosacruz: desenvolvimento, personalidade, funcional e educação. Sob o tópico da psicologia da educação, o professor inclui o processo iniciático da AMORC e seleciona seis tipos de procedimento metodológico: (i) ensinamentos transmitidos através de monografias (estímulo pelo conhecimento); (ii) exercícios para desenvolver habilidades; (iii) práticas ritualísticas (estímulo emocional); (iv) convívio dos membros no templo e nas dependências dos corpos afiliados com a finalidade de desenvolver o espírito fraterno (estímulo social); (v) drama ritualístico como estímulo simbólico; (vi) conjunto desses estímulos visando ao contato direto com a divindade e a comunhão com o sagrado.

A abordagem da consciência, do sagrado e da reencarnação estimula a análise por diferentes ângulos. Estribado no espírito de liberdade e fraternidade que vigora na Ordem R+C, discordo parcialmente das colocações do eminente conferencista. Na minha concepção, consciência não é sinônima de mente e nem de alma e sim uma função cognitiva do organismo cuja finalidade é a de orientar os seres vivos no seu ambiente. Na espécie humana, essa função orienta a conduta visando à sobrevivência, à convivência e à transcendência, tendo como guia os valores eleitos pela inteligência. Através da hipnose a pessoa pode reduzir a extensão da consciência e concentrá-la em um único sentido visando a determinado propósito (anestésico, por exemplo). O processo da meditação também inibe os sentidos, transcende-os, direciona a consciência para o lado espiritual da realidade, envia ou recebe mensagens, capta imagens, entra em contato com a divindade ou com outras entidades. Vejo a mente como um complexo imaterial e funcional de pensamento (discursivo e intuitivo), imaginação (criadora e fantasiosa) e memória (ativa e passiva). Conceituo alma como energia fundamental que movimenta e conserva o universo.

Assim como a consciência, o sagrado também não é uma substância com ser próprio em si mesmo e por si mesmo. Trata-se de um valor eleito pela inteligência humana ao lado de outros valores como o justo, o bom, o verdadeiro e o belo. De acordo com os sentimentos, emoções, paixões e grau de ignorância, o ser humano cobre entes físicos e metafísicos com o manto da santidade. Inteligência, sentimento, vontade e conduta do ser humano traçam a esfera do sagrado e nela as pessoas colocam os seus interesses e depositam esperanças. Deus não é sagrado nem profano; simplesmente existe indiferente aos atributos com que os seres humanos o qualificam. Nele não acreditam os ateus. Dele prescindem os cientistas quando estudam e explicam a origem, a estrutura e o funcionamento do universo. Embora sagrados para a AMORC, os rituais rosacruzes nada significam para outras pessoas. Os santos dos cristãos católicos nada significam para cristãos protestantes e adeptos de outros credos. Os livros das religiões (bíblia, corão) nada têm de sagrado para quem delas não é seguidor e nelas não acredita. As infantilidades, fantasias e falsidades contidas nesses livros são vistas pelos crentes como verdades sagradas. Numinoso, irracional, o sagrado brota da ignorância, da fragilidade e da esperança, genetrizes da crença e de profundas emoções.

A reencarnação só existe para quem aceita as suas premissas, quais sejam: de que ela é uma lei natural baseada no fato de o homem estar encarnado em um corpo físico passando por experiências terrenas necessárias à iluminação e ao aperfeiçoamento. Tais premissas carecem de solidez. Não há evidência alguma de que a reencarnação seja uma lei natural. O homem não está encarnado em um corpo físico; o homem é o corpo físico. Salvo no sentido figurado, ao entrar no auditório eu não posso tirar o meu corpo, pendurá-lo no cabide e depois da conferência, apanhá-lo na saída. A doutrina da reencarnação colide com a doutrina bíblica do juízo final e da ressurreição dos mortos. Juízo é operação da inteligência humana. Se Deus for onisciente, onipresente e onipotente, o juízo ser-lhe-á operação mental desnecessária e inútil. Conhecendo tudo diretamente e tudo podendo, Deus não necessita das operações da razão (apreensão, juízo, raciocínio). Portanto, não há falar em juízo final ou juízo divino. Ressurreição e reencarnação se excluem. Segundo a doutrina, a alma ocupa vários e diferentes corpos no curso dos séculos. Se assim fosse, então, no dia da ressurreição, a alma teria de escolher um desses corpos e deixar os demais no caldeirão de Lúcifer. A ressurreição supõe morte anterior. Só ressuscita quem esteve morto. O imortal não morre; ora, a alma é imortal; logo, a alma não morre, portanto, não ressuscita. A mortalidade é o pressuposto da ressurreição. O corpo é mortal; logo, a ressurreição será do corpo. Na linha doutrinária, o que reencarna é a alma e o que ressuscita é o corpo. Complicação: o homem é alma e corpo unificados; a cada corpo, a sua alma exclusiva. A ressurreição teria de ser do homem total. Após a morte, a alma permaneceria no mundo espiritual aguardando a ressurreição do seu corpo. Complicação: o cadáver se dissolve pela ação da natureza (decomposição) ou pela ação do homem (cremação). A recomposição do cadáver dissolvido ou cremado é, pois, impossibilidade física evidente. Com ou sem a doutrina da reencarnação, do juízo final e da ressurreição, a espécie humana progrediu. Se mudarmos o paradigma e colocarmos o corpo no interior da alma universal ao invés de colocarmos a alma no interior do corpo, a visão será a de um universo mergulhado na alma que o mantém em eterno movimento e progresso.

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