segunda-feira, 7 de junho de 2021

DIREITO APLICADO - XIV

O processo de aprendizagem dos humanos iniciado na pré-história (infância da humanidade) acelerou-se no Ocidente, a partir da idade média, com as grandes navegações, colonização, intensificação do comércio internacional, autonomia e especialização do direito comercial, intercâmbio cultural (diplomacia, comunicação dos inventos, conhecimentos e imagens de mundo) e com os trabalhos de Copérnico, Galileu, Descartes, Newton, que assentaram as bases da ciência moderna sob o título de “Filosofia Natural”. Nesse processo vivendo & aprendendo padecem vidas humanas, gastam-se energia, tempo e recursos materiais. Curiosidade, acaso, interesse, movem-no. Alternam-se avanço, retrocesso, tentativa, fracasso, êxito.
Mudanças nos costumes, na política, na economia, no direito, a partir do iluminismo e das revoluções do século XVIII, ensejaram crescente velocidade ao progresso técnico e científico até o século XX, inclusive, como a teoria da relatividade, microfísica, cibernética, telemática, robotização, viagem espacial, apesar da resistência obscurantista das instituições e crenças religiosas. 
O aprendizado e o conhecimento adquirido nesse processo servem ao bem e ao mal, à construção e à destruição, ambivalência decorrente da dupla face da natureza humana: angelical e demoníaca. A face demoníaca, desafiadora do perigo, da moral e do direito, vinculada à matéria, às necessidades do organismo humano, ao mundo das finanças e dos negócios, tem prevalecido no mundo contemporâneo e poderá levar a espécie humana à extinção por (i) nova Hiroshima de extensão planetária (ii) desastre ecológico provocado pela ação predatória e poluidora dos humanos (efeito estufa, derretimento das geleiras) além das possíveis causas naturais, tais como: pandemia superior às forças humanas de resistência e combate, colisão de corpos celestes com o planeta, deslocamento de placas tectônicas. 
No milenar processo de desenvolvimento pessoal e social, os humanos criaram o mundo da cultura com instrumental artístico, científico, filosófico, religioso, místico, estruturado por regras técnicas e normas de conduta e organização postas por sua inteligência, sensibilidade, vontade e seu dinamismo ante as necessidades, as utilidades e os interesses individuais e coletivos.
Nos primórdios desse processo, as regras eram calcadas na superstição, na magia, no mito, na religião, na imagem de mundo, fixadas por costumes válidos como leis não escritas transmitidas de geração a geração. Atingido o grau de civilização, ao lado das leis não escritas havia leis escritas na pedra, na madeira, no metal, no papiro e no pergaminho. Os costumes foram perdendo força normativa à medida em que se multiplicavam as leis escritas. Costume contra legem não prevalecia. Costume secundum legem permanecia e facilitava a interpretação e a aplicação das leis escritas. Costume praeter legem permanecia e preenchia lacunas da lei escrita como até hoje acontece: à falta de lei, o juiz deve recorrer à analogia, ao costume e aos princípios gerais do direito. [Essa regra não se aplica na esfera penal por vigorar a máxima: nullum crimen nulla poena sine lege, que a Constituição brasileira assim expressa: "não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem previa cominação legal" (5º, XXXIX)].
Na opinião de Gaio, jurisconsulto romano, o fundamento do direito de todos os povos é a ratio naturalis (razão natural). A eficácia das regras essenciais à vida individual, à convivência social e à conservação da comunidade, depende da obediência das pessoas, que se espera consciente e voluntária, mas, que pode ser obtida mediante força física se a persuasão psicológica for insuficiente. As normas do direito objetivo valem e obrigam independentemente da vontade e da aceitação de cada pessoa. No estado democrático, presume-se o assentimento do povo à legislação vigente (consenso popular). O aparelho de segurança do estado funciona preventiva e repressivamente (i) com o primordial objetivo de evitar a desordem e manter a ordem em prol da paz e do bem comum (ii) com o desvirtuado objetivo de assegurar particulares interesses do governante e do seu grupo. 
A desobediência às regras canônicas, éticas e jurídicas sujeita o transgressor a sanções de caráter religioso, moral e jurídico. A obediência pode provir: [I] do temor da pessoa à reação social e ao castigo [II] da esperança de receber alguma vantagem, ou, de ser reconhecida como honesta e virtuosa [III] da lucidez e consciência da pessoa por compreender (i) a importância das regras para si mesma e para a comunidade (ii) a necessidade do controle do agir de cada um para assegurar a liberdade de todos. 
A história da civilização ocidental relata julgamentos na antiguidade presididos pelos reis e a paulatina delegação da tarefa judicial aos ministros. Essa prática especializou juízes e institucionalizou a magistratura. Aqueles julgamentos já indicavam a existência de (i) normas com fundamento teológico, natural, ético e social (ii) órgãos oficiais ao lado ou acima da justiça privada, para solucionar controvérsias. Ficou célebre o julgamento de Sócrates, na Grécia clássica, onde não havia sistema jurídico e sim leis aglomeradas (400 a.C.). Acusado de corromper a mocidade com as suas lições, ele foi julgado e condenado. Os juízes entenderam que o filósofo havia transposto perigosa e subversivamente os limites da liberdade de cátedra. Sócrates rejeitou a fuga planejada por seus amigos e discípulos. A liberdade na condição de fugitivo da justiça não lhe convinha. Preferiu cumprir a pena de morte a que fora condenado e, assim, manter-se fiel ao seu pensamento e às suas lições. Bebeu o veneno da execução da sentença (cicuta). Ficou célebre também o julgamento de Jesus na Palestina (30 d.C.). Acusado de violar a lei hebraica, o profeta foi condenado à morte pelo tribunal judeu. A sentença foi homologada e executada pela autoridade romana a pedido da turba liderada por sacerdotes. [A Palestina estava sob o domínio de Roma].   


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