segunda-feira, 10 de maio de 2021

DIREITO APLICADO - VI

Leis “são as relações necessárias que derivam da natureza das coisas”, conforme definição dada por Montesquieu, senhor feudal de Bordeaux, sul da França (século XVIII). No pensar desse filósofo aristocrata, as leis de deus e as leis da natureza precedem as leis dos homens sujeitas às paixões e ao erro. “O mundo não existiria sem as invariáveis e perpétuas leis divinas e naturais”. Considerando que essas leis brotam da mesma fonte, ou seja, da inteligência de deus, lícito é concluir que divina é a lei na sua expressão espiritual e natural é a mesma lei na sua expressão material. Trata-se da unidade do espírito santo na multiplicidade das frequências vibratórias configuradoras das dimensões espiritual e material do mundo. 
No campo da ciência moderna, lei é definida como (i) regularidade essencial que comanda a existência e a mutação dos seres (ii) relação constante e necessária tanto nos fenômenos naturais como nos fenômenos culturais. Do nascimento à morte, os humanos vivem sob o domínio das leis naturais e das leis culturais. As leis naturais são regularidades geradas por energia cósmica conforme determinações da natureza; estruturam o universo e comandam a sua dinâmica; determinam a essência dos seres vivos e os seus nexos existenciais. As leis culturais são (i) regras técnicas aplicadas nos jogos, nos laboratórios, nas invenções, nas artes, em estratégias (ii) normas de conduta e organização religiosas, marciais, morais, jurídicas. As normas religiosas contidas nas escrituras sagradas e nos códigos canônicos visam aproximar o ser humano de deus; disciplinam o serviço dos sacerdotes e dos fiéis, organizam igrejas, cultos, rituais. As normas marciais contidas nos códigos militares visam a defesa do estado, organizam e disciplinam os exércitos. As normas morais contidas nos costumes e nos códigos de ética têm por fim o bem comum, a justiça, a verdade, a honestidade, realçam a dignidade da pessoa humana. As normas jurídicas contidas nas leis escritas, nos costumes, na jurisprudência, vigência necessária e acatamento obrigatório, organizam a sociedade e o estado, regem a conduta das pessoas, formam o direito público e o direito privado.
A fim de assegurar a eficácia do direito, o estado aparelha-se com propósitos preventivo e repressivo. Há parâmetros ao uso da força. Via de regra, a força é monopólio do estado e a ninguém é permitido fazer justiça com as próprias mãos. Via de exceção, o particular usa da sua própria força em legítima defesa. O ilícito situa-se fora dos limites traçados na lei, no costume, na jurisprudência. Tipifica abuso o exercício do direito para prejudicar terceiros, violar limites postos pela boa-fé, pelos bons costumes, pelo fim social a que a lei se destina. A autoridade pública perde o seu cargo quando dele abusa. O pai perde a guarda do filho quando abusa da sua autoridade civil. O exercício do poder de fato, à margem da lei, segundo a livre vontade do agente, tipifica arbitrariedade e enseja punição.
Responsabilidade, obediência e sanção, integram o fenômeno jurídico. Responsabilidade significa: [i] encargo da pessoa [ii] dever moral e jurídico de responder por ações e omissões próprias ou de outrem. A apuração da responsabilidade política, administrativa, penal e civil do transgressor da lei compete ao estado mediante procedimentos e processos legais. O agente político processado e condenado por crime de responsabilidade perde o cargo e fica impedido de exercer função pública pelo tempo previsto no ordenamento jurídico. O agente administrativo processado e condenado por crime praticado no desempenho da função pública (peculato, prevaricação, corrupção) perde o cargo, a liberdade e os bens. A pessoa processada e condenada por ação ou omissão delituosa (homicídio, lesão corporal, calúnia, roubo) sofrerá penas previstas na lei (reclusão, detenção, multa, compulsória prestação de serviços, interdições). Por ilegais ações e omissões dos incapazes para os atos da vida civil (juridicamente irresponsáveis) respondem os pais, tutores ou curadores, conforme o caso. Ao descumprir, sem justa causa, obrigação que lhe cabe por lei ou por contrato, a pessoa sujeita-se às sanções legais e/ou contratuais. O inadimplente poderá ser judicialmente compelido a cumprir a obrigação. A lei civil brasileira ampara o proprietário e o credor, mas, veda prisão por dívida. 
O estado responde por danos que seus funcionários, nesta qualidade, causam a terceiros. Cuida-se de responsabilidade civil objetiva. Considera-se funcionário todo aquele que exerce cargo ou função pública, seja estatutário, contratado ou eleito. A responsabilidade civil subjetiva do funcionário causador do dano pode ser apurada se o estado promover ação judicial regressiva. Exemplo: suponha-se que durante epidemia causadora de milhares de mortes a situação se agravou por dolo ou culpa do governante. Os familiares das vítimas propõem ação judicial contra o estado pedindo indenização por dano moral e material. No devido processo, o estado é condenado. Para se ressarcir do prejuízo, o estado promove ação regressiva contra o governante causador da desgraça. Este se livrará do pagamento se alegar e provar falência civil.  
No exemplo citado, cabe questionamento moral no que tange ao autor da ação civil contra o estado. A legitimidade de quem postula em juízo há de ser moral e não só jurídica. Na vida social, as pessoas juridicamente capazes são responsáveis por suas escolhas. Em decorrência da sua escolha, o eleitor que votou no governante é responsável pela desgraça. Portanto, a esse eleitor falta amparo moral para processar o estado e reclamar indenização por aquela ilícitude praticada por seu eleito no exercício da governança, pois, tal eleitor estaria se aproveitando da sua má escolha, da sua própria culpa. Contudo, como o voto é secreto, difícil será provar que o autor da ação judicial foi eleitor do governante criminoso. Nada disto aconteceria no mundo celestial anunciado por profetas, sacerdotes, pregadores, pastores, missionários, pilantras na maioria, exploradores da fé alheia.   


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