domingo, 31 de janeiro de 2021

IMPEACHMENT 4

Renovam-se as presidências do Senado e da Câmara dos Deputados na segunda-feira, 1º/02/2021, num clima de desassossego criado pela ação criminosa do presidente da república no decorrer do seu mandato (2019/2021). A eleita ou o eleito na Câmara, terá de despachar seis dezenas de pedidos de impeachment formulados contra o presidente da república. Considerando que despachar petição é dever jurídico geral e comum das autoridades estatais – e não prerrogativa – o descumprimento desse dever acarretará sanções legais. Eventual omissão do novo presidente caracterizará atentado contra o decoro parlamentar e crime comum. A responsabilidade por falta de decoro será apurada pelo Conselho de Ética e Decoro da Câmara dos Deputados. A responsabilidade por crime comum será apurada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no bojo do processo de ação penal pública proposta pelo ministério público. Se houver inércia dessa instituição, caberá aos cidadãos a propositura de ação penal pública subsidiária. No que tange ao deputado que ora desocupa a presidência da Câmara, a apuração da sua responsabilidade por falta de decoro parlamentar e por crime comum poderá acontecer enquanto o seu mandato não expirar e a prescrição não ocorrer. 

O parlamentar eleito para a presidência da Câmara, caso mantenha a dolosa omissão do antecessor, deverá ser interpelado judicialmente para que, no prazo fixado pelo ministro do STF, despache as petições, motivadamente, deferindo ou indeferindo. Caso persista a omissão, o novo presidente poderá ser denunciado perante o Conselho de Ética (falta de decoro) e o STF (crime comum). 

Na introdução do livro “Tchau Querida”, publicada no sítio Brasil 247, em 26/01/2021, Eduardo Cunha lembra que nos processos de impeachment de Collor e Rousseff, o crime de responsabilidade não estava caracterizado. Apesar disto, a Câmara autorizou a instauração do processo e o Senado processou e condenou. Agora, as ações e omissões do presidente da república que tipificam crime de responsabilidade e crime comum, devidamente denunciadas e provadas, foram blindadas pela presidência da Câmara dos Deputados. Isto mostra à nação brasileira e à comunidade internacional, a leviandade dos parlamentares. A inversão de valores mostra que De Gaulle tinha razão: o Brasil não é um país sério. Os representantes do povo são pessoas levianas, de caráter mal formado, vira-latas, sem compromisso algum com a moral, o direito, as instituições, o interesse público e o bem-estar geral. Nas eleições parlamentares de 2018, foram eleitos candidatos que se diziam de outra cepa, desligados dos políticos mentirosos e corruptos. Até o momento, não foi possível notar diferença alguma. As eleições de amanhã para as presidências do Senado e da Câmara talvez deixe patente alguma diferença. Pelo que foi noticiado, os candidatos não são apenas aqueles dois mencionados pela imprensa trevosa e seus prostitutos; há mais de cinco candidatos para cada Casa.

Nota-se confusão entre decisão política (flexível, segue a biruta) e decisão jurídica (dura lex sed lex). No estado democrático de direito, todo processo é jurídico, seja parlamentar, seja administrativo, seja judicial. Sem o devido processo legal ninguém perderá a liberdade ou os seus bens, nem será processado senão pela autoridade competente e a todos são assegurados o contraditório, a ampla defesa e os recursos cabíveis. A admissibilidade da petição inicial pelo presidente da Câmara ou pelo presidente do Senado é decisão jurídica. Essas autoridades verificam se a petição está amparada na Constituição e devidamente instruída. Se o resultado dessa análise preliminar for positivo, seguir-se-á o rito previsto na lei; se for negativo, a petição e seus anexos serão arquivados. No julgamento final pelo Senado, o presidente da república só poderá ser destituído do cargo por decisão jurídica, jamais por decisão política. Já para o presidente ser mantido no cargo prevalece a decisão política sobre a jurídica. Destarte, ainda que provada a materialidade do delito, o Senado, por motivos políticos, econômicos e sociais, pode entender inconveniente e inoportuna a destituição do presidente (= decisão política). O mesmo pode ocorrer no plenário da Câmara: pelos mencionados motivos, a maioria dos deputados pode negar autorização ao Senado para instaurar o processo de impeachment, ainda que a materialidade do delito esteja provada (= decisão política). 

Na vigência do estado democrático de direito, a destituição do presidente da república só pode ocorrer por decisão jurídica, jamais por decisão exclusivamente política, sob pena de subversão da ordem constitucional. Os casos Collor e Rousseff foram duas aberrações jurídicas, dois precedentes altamente negativos para a imagem da nação brasileira no cenário internacional. A mesma imagem negativa resulta da blindagem do atual presidente da república para lhe assegurar impunidade pelos crimes cuja materialidade está provada. Essa autoridade deve se submeter às leis da república em conformidade com o princípio da isonomia. Isto significa que o presidente, como todo cidadão, deve responder ao processo legal e ser julgado pela autoridade competente, quer para ser absolvido, quer para ser condenado.    


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