sábado, 23 de janeiro de 2021

IMPEACHMENT 2

A partir das revoluções americana e francesa do século XVIII (1701-1800), países da América e da Europa passaram a registrar a estrutura e o funcionamento do estado, para conhecimento geral, em documento escrito denominado Constituição, colocado no topo da hierarquia das leis. Governantes e governados estão obrigados a obedecê-la. A desobediência acarreta sanções de natureza política, administrativa, civil e penal, entre as quais, a perda do cargo e a inabilitação para exercer função pública. Estrangeiros no território nacional devem respeitá-la, sob pena de expulsão. No evolver histórico de alguns países, inclusive o Brasil, além do conteúdo político, adicionaram à Constituição os conteúdos social e econômico. A Constituição, lei magna do estado, encampou o Código Civil, lei magna da sociedade.    

A Constituição brasileira em vigor foi elaborada e promulgada por uma assembleia nacional constituinte cujos membros foram eleitos pelo povo (1988). Expressão da soberania de um povo que através dos seus legítimos representantes escolheu a forma democrática para o seu governo. A sequência lógica de princípios e regras posta pelo legislador constituinte no texto constitucional foi intencional. A sua força motriz foi gerada pela reação ao período autocrático que durou 21 anos sob o coturno dos militares (1964/1985). 

O legislador constituinte primeiro enunciou os valores supremos da nação: direitos individuais e sociais, democracia, liberdade, igualdade, justiça, segurança, desenvolvimento, bem-estar. Esse preâmbulo axiológico serve de bússola aos governantes e governados. Contrariar esses valores supremos significa violar a Constituição. Depois do preâmbulo, o legislador constituinte [i] qualificou a república brasileira de estado democrático de direito [ii] elencou os princípios fundamentais: soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana, valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, pluralismo político [iii] reconheceu o povo como titular original do poder [iv] adotou o sistema representativo e a tripartição do poder em legislativo, executivo e judiciário [v] estabeleceu os objetivos fundamentais: (i) construir uma sociedade livre, justa e solidária (ii) garantir o desenvolvimento nacional (iii) erradicar a pobreza e a marginalização (iv) reduzir as desigualdades sociais e regionais (v) promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. [CR 1º/3º]. Depois de enunciar os princípios, o legislador constituinte declarou os direitos e garantias fundamentais (i) de modo genérico: a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança, à propriedade (ii) de modo específico: os direitos derivados dos anteriores. O direito à vida encabeça a lista; sem ele, todos os demais perdem substância. O direito de propriedade vem por último, por isso mesmo, não se sobrepõe aos demais. Durante crise sanitária, colocar o direito de propriedade acima do direito à vida é subverter a ordem constitucional. [CR 5º/17].

Por fim, o legislador constituinte tratou da organização do estado e dos poderes. [CR 18/135]. Tal sequência no texto constitucional indica a primazia dos valores, dos princípios e dos direitos e garantias fundamentais em relação à autoridade do estado. Na visão do legislador constituinte, a nação precede e organiza o estado. Vencidos na assembleia nacional constituinte, os nazifascistas pretendem agora, no plano dos fatos, inverter a situação: colocar o estado acima da nação, a autoridade estatal acima dos direitos e garantias. A essa inversão antijurídica e antidemocrática a nação brasileira deve resistir mediante ação efetiva. Discursos e bravatas ajudam, mas são insuficientes. 

Debilidade mental, psicopatia, sociopatia, conduta indecorosa e/ou criminosa, revelam incapacidade do chefe de governo para exercer as suas funções. Ao invés de ser recolhido à prisão por delitos cometidos em situação de anormalidade psíquica, ele poderá ser internado no manicômio judiciário. Patológico delírio autocrático do governante não pode comprometer os valores supremos da nação e os fundamentos constitucionais do estado. Duzentas mil baixas decorrentes, em parte, da incapacidade do chefe de governo, recomendam o seu imediato afastamento (caso não bastem os demais ilícitos denunciados). O bem-estar e a segurança dos brasileiros têm que prevalecer. O Brasil tem que recuperar o prestígio internacional perdido e o seu lugar entre as maiores economias do planeta. A democracia é o melhor caminho. O impeachment é o instrumento de defesa nacional mais adequado e eficaz na atual conjuntura. 

Em 2020/2021, esse instrumento foi utilizado 61 vezes, sem êxito. As petições foram engavetadas pelo presidente da Câmara dos Deputados. Sem cumprir o seu dever jurídico de proferir decisão monocrática que independe de pauta – deferindo ou indeferindo as petições, no prazo de 10 dias, por aplicação subsidiária do artigo 800 do Código de Processo Penal – retirou a eficácia de garantia constitucional em frontal e despudorada ofensa à cidadania. Apesar da gravidade desse delito, não há notícia de que o ministério público tenha promovido a persecutio criminis. Resta à sociedade civil tomar a iniciativa da ação penal subsidiária perante o Supremo Tribunal Federal, numa tentativa de evitar a impunidade quanto ao crime comum. No que concerne ao ato atentatório ao decoro parlamentar praticado pelo atual presidente da Casa, cabe ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados instaurar o devido processo legal. 

[CR: 5º, XXXIV, a + LIX + 55, II +  85; Lei 1.079/50: 14 + 38; CEDPCD: 6º, II].



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