sábado, 27 de janeiro de 2018

LULA x JUDICIÁRIO

Algumas nuances da ação judicial que resultou na condenação do ex-presidente da república Luiz Inácio Lula da Silva provocam debate e envergonham o Judiciário.  
Quando exercia o cargo presidencial, Luiz Inácio não escondeu o seu desapreço pelos juízes. Depois, como cidadão, considerou covardes os juízes do supremo tribunal porque se omitiram no processo de impeachment da senhora Dilma Rousseff. Nada disto, entretanto, justifica um julgamento raivoso, impiedoso e vingativo quando o autor da crítica senta-se no banco dos réus. 
A fotografia de Dallagnol, procurador chefe da força-tarefa de Curitiba, sentado e por trás dele, em pé, os seus auxiliares, parece destinar-se ao álbum de família. Do ponto de vista psicopatológico, a expressão facial do procurador, o olhar metálico, a palidez, evocavam algo sinistro. Durante o governo Cardoso, via-se expressão facial semelhante na fotografia de Armínio Fraga, economista e ex-ministro. Agora, durante o governo Temer, vê-se na fotografia de Gebran, desembargador relator, também a desagradável e sinistra expressão facial. De onde vem esta sensação de desconforto ao olhar esses retratos? Certamente, da nossa memória, que guarda a imagem dos nazistas alemães radicais, fanáticos, psicopatas, moralmente insensíveis. Parece que a teoria de Lombroso estava parcialmente correta. A postura do paciente pode revelar ao psiquiatra sintoma de um doentio desvio de conduta.   
O périplo do juiz inquisidor pelo Brasil e EUA para justificar a sua conduta, defender as suas tendenciosas e arbitrárias decisões, atrair o apoio dos tribunais e da opinião pública nacional e internacional, caracteriza o particular interesse na causa, o que motiva seu impedimento. O fato falsamente qualificado de criminoso pela acusação ocorreu em São Paulo. O réu foi julgado no Paraná apesar de o juiz inquisidor admitir ausência de vínculo do negócio com a Petrobrás. O imóvel objeto da acusação (localizado em Guarujá/SP) não pertence ao réu. Apesar disto, o inquisidor afirmou que o réu era o proprietário de fato do imóvel embora não o fosse de direito (o imóvel não estava registrado em nome do réu e nem havia escritura de compra e venda). O ato do réu enquanto presidente da república necessário à tipificação do crime não teve provada a sua existência. Para incriminar o réu, o juiz admitiu a existência do ato indeterminado. No entanto, o negócio com a empreiteira mencionado na peça acusatória teria sido (se existisse) realizado quando o réu já não exercia cargo público, o que desclassifica o delito de corrupção. Os procuradores e o juiz podem ser classificados de corruptores ao oferecerem benesses aos investigados para que delatem e mintam.  
O corporativismo dos desembargadores, inclusive do presidente do tribunal, preocupados em defender o juiz inquisidor, prejudicou a isenção do julgamento e a imparcial e justa aplicação do direito. Os magistrados esforçaram-se para manter a iníqua sentença condenatória e assim prestigiar o colega. Aumentaram a pena para: (i) impressionar o público nacional e internacional com aparente independência (ii) assegurar que havia absoluta certeza da materialidade e da autoria do crime e que o réu era realmente culpado e perigoso (iii) evitar que o réu obtivesse benefício legal no cumprimento da pena (iv) impedir que a prescrição ocorresse antes de 20 anos. 
Crentes na consciência jurídica dos magistrados, alguns juristas (inclusive eu na condição de juiz de direito aposentado) esperavam a reforma da sentença. Raciocinamos dentro das balizas da normalidade institucional e da vigência plena do estado democrático de direito. No entanto, o triunvirato recursal mostrou disfunção hepática, parcialidade, desempenho político partidário, inconsciência moral e jurídica, intenção de prestigiar o colega de primeiro grau e de desafiar a opinião pública internacional, a opinião dos juristas nacionais e a da maior parcela da população brasileira. Ao honrar a sua fidelidade à direita do espectro político, encantar-se com a fama transitória, submeter-se aos interesses do governo e das corporações dos EUA e obedecer à orientação do presidente do tribunal, os desembargadores exibiram subserviência e desonraram a toga de magistrado. A mácula na imagem interna e externa da magistratura nacional pouco se lhes importou. Firmes no estado de exceção e no malicioso domínio do fato, determinaram-se a tirar o réu da disputa pela presidência da república em 2018. Nos seus votos, cuja extensão já denuncia o desvio ético, repetiram sem pudor a ginástica cerebrina do juiz inquisidor com nova arrumação dos argumentos. Distorceram atos e fatos, argumentaram com indícios, suposições e preconceito a fim de encaixá-los na lei penal e assim condenar o réu.
Para atenuar a leviandade, os magistrados disseram que condenavam o réu “só em dois crimes”, quando ele foi acusado da prática de mais de uma dezena de crimes. Confessaram condescendência ou prevaricação? Para desculpar a sua leviandade os magistrados exibiram a leviandade dos agentes do ministério público. Ao selecionarem dois crimes, os magistrados evitaram que a denúncia oferecida pelo ministério público entrasse para a história como totalmente leviana e improcedente e o juiz inquisidor figurasse como cúmplice do desatino. A ousadia dos desembargadores foi proporcional à sua insensibilidade moral, à sua indiferença à ética judiciária consubstanciada na lei orgânica da magistratura nacional.
Apelar para a sensatez, para a ética e para o direito não mudará o rumo da farsa enquanto a escória da nação e os vendilhões da pátria derem as cartas dentro e fora do Poder Judiciário. A ação penal em tela mostrou para o mundo quem manda no Brasil e na América Latina: o governo dos EUA.   

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