Nos meios de comunicação social circulou notícia de
que neste mês de junho de 2015 haverá colisão de enorme asteróide contra o
nosso planeta e que a conseqüência disto será a extinção de todas as formas de
vida. Segundo o grupo de religiosos que anunciou a catástrofe, trata-se de
castigo de deus. Já vimos este filme. No passado, individualmente ou em
conjunto, pessoas se suicidaram por causa desses falsos alarmes. Se fossem
verdadeiras essas previsões apocalípticas, o fim do mundo já teria ocorrido há
séculos.
Advirta-se no que concerne ao fim do “mundo”: modus in rebus. De que mundo se trata?
Certamente, do mundo físico e não do mundo espiritual. O mundo físico é o
universo, que compreende desde a menor partícula da matéria até as maiores galáxias.
A desintegração de um planeta ou de uma estrela não significa o fim do
universo. Assim também, a extinção da vida em um planeta não significa a morte desse planeta,
nem do sistema ou da galáxia a que pertence. O reino mineral precede o reino
vegetal e o reino animal e a esses dois sobrevive. O mundo físico acaba para
quem morre e continua para quem permanece vivo. Ainda que o ser humano não
existisse, o mundo físico existiria. Até o momento, não há certeza alguma sobre
o fim imediato do universo. De um modo geral, os cientistas concordam que o mundo físico
se formou e se expandiu a partir de uma grande explosão de energia concentrada.
Os cientistas divergem quanto ao fim. Alguns defendem a tese da expansão
infinita do universo. Outros defendem a tese de que haverá um limite nessa
expansão a partir do qual o universo se contrairá até o ponto de uma nova
explosão que dará início à formação de um outro universo. Terceira hipótese: atingido o limite de expansão, o universo se manterá fixo indefinidamente. A teoria de Isaac
Newton, cientista inglês, de um universo sem começo e sem fim, sempre igual a si mesmo, ainda
vigora, principalmente como doutrina religiosa. Nessa linha, Lavoisier,
cientista francês, afirmava: “Em a natureza nada se cria, nada se perde, tudo
se transforma”.
A profecia atribuída a Jesus sobre o fim do mundo é
bem conhecida. Consta dos evangelhos, que ele afirmou a iminência do juízo final e a chegada do reino de deus para aqueles dias, quando
muitos daquela geração ainda estariam vivos. Nesta certeza da proximidade do fim do mundo talvez esteja a explicação do fato de Jesus nada ter deixado por escrito.
Em verdade vos
digo que muitos dos que aqui se encontram não passarão pela morte sem que
tenham visto o filho do homem voltar na majestade do seu reino (Mateus, 16: 26). Em verdade vos digo: dos que aqui se acham,
alguns há que não experimentarão a morte enquanto não virem chegar o reino de
deus com poder (Marcos, 9: 1). Em
verdade vos digo: dos que aqui se acham, alguns há que não morrerão até que
vejam o reino de deus (Lucas, 9: 27). Nas suas cartas, os apóstolos Pedro e
Paulo advertiam os crentes sobre essa profecia de Jesus. O fim de todas as coisas está próximo. Sede, portanto, prudentes e
vigiai na oração (I Pedro, 4: 7). Todas
estas coisas lhes aconteceram para nosso exemplo; foram escritas para
advertência nossa, para nós que tocamos o final dos tempos (Paulo, I
Corintios, 10: 11).
Os crentes impacientaram-se com a demora do retorno de
Jesus, do julgamento final e da chegada do reino de deus. Eles cobraram do
apóstolo uma explicação. Pedro saiu pela tangente: diante de deus um só dia é como mil anos e mil anos são como um só dia;
o senhor não retarda o cumprimento da sua promessa como alguns pensam, mas usa
da paciência para convosco; não quer que alguém pereça, ao contrário, quer que
todos se arrependam. Entretanto, virá o dia do senhor como ladrão. Naquele dia,
os céus passarão com ruído, os elementos abrasados se dissolverão e será
consumida a terra e todas as obras que ela contém (II Pedro, 3: 8/10).
Pesa sobre essa carta, a suspeição de não ser Pedro o
seu autor. A expressão diante de deus um
só dia é como mil anos e mil anos são como um só dia revela o sentimento
místico da eternidade, dimensão espiritual em que não há tempo e nem espaço.
Entretanto, na profecia atribuída a Jesus há tempo e espaço bem definidos: a
geração daquela época (“muitos dos que aqui se acham”). O fato é que tal
profecia – se realmente existiu – até hoje não se realizou, decorridos 1.970
anos.
Dessa técnica persuasiva usada por Jesus e seus
apóstolos, que consiste em infundir terror para obter a submissão das pessoas, já
se valera o escriba Esdras, quatro séculos antes, ao redigir o Pentateuco. Com
o propósito de domesticar os arrelientos judeus da Babilônia e da Palestina, Esdras
escreveu e organizou os cinco primeiros livros da Bíblia, considerados em
conjunto como “a lei”, criou um deus diabólico e o batizou de Javé ou Jeová.
Esse deus terrificante castigaria severamente os judeus, individual ou
coletivamente, sempre que eles transgredissem a “lei”. Espertamente, esse escriba
apostou no que há de comum nos humanos: medo e ignorância.
Esse mecanismo de inibição moral e espiritual foi aplicado
– e continua a ser – também pelas autoridades civis. Desde a Idade Antiga,
chefes políticos com o poder de legislar (faraós, imperadores, reis, ditadores)
estabeleciam penas severas e cruéis a quem desobedecesse aos seus mandamentos.
Os súditos ficavam sujeitos ao confisco de bens, à tortura e à privação da
liberdade e da vida, caso violassem as leis escritas ou consuetudinárias
vigentes.
A recente notícia sobre a catástrofe astronômica é
mais uma das manobras das instituições religiosas para unir os crentes em época
que a ciência, a tecnologia, o pensamento e a obra de filósofos e outros
intelectuais desvelam os “mistérios” da religião e mostram as mentiras e os
expedientes enganosos utilizados pelas autoridades religiosas para arrecadar
dinheiro e acumular bens materiais. Infundindo medo na população,
aterrorizando-a com boatos e histórias de horror e sofrimento, as lideranças
religiosas tentam atrair para suas igrejas maior número de adeptos “antes do
fim do mundo”. Vítimas da paranóia artificiosamente provocada, os seguidores
temem o “castigo de deus”. Esse fato notório mostra que, em matéria espiritual,
os humanos ainda estão na infância, acreditando ingenuamente em contos de fada,
papai noel e bicho papão.
Colisões de corpos celestes são comuns no universo. O
planeta Terra não é exceção. Neste e em outros planetas, dentro ou fora do
sistema solar, sempre houve colisões com asteróides. Esse fenômeno macrocósmico
de certa regularidade não significa que deus esteja castigando todo o universo
ou alguma das suas regiões. No que tange ao planeta Terra, os astrônomos negam
essa ocorrência de imediato, porém, não afastam a possibilidade em futuro
remoto.
Do ponto de vista astrofísico, a extinção da vida na
Terra ocorrerá: (1) Com certeza, quando o Sol esgotar seu combustível
daqui a um bilhão de anos. Na medida em que o calor do Sol for enfraquecendo,
as formas de vida irão desaparecendo paulatinamente. (2) Provavelmente, em
momento incerto, em consequência da colisão com asteróides. Dentro dessa hipótese
provável, a extinção poderá ser: (I) total,
se o efeito do choque se expandir por toda a superfície do planeta ou
fragmentá-lo; (II) parcial, se o
planeta se mantiver íntegro e o efeito do choque for regional, cujo exemplo
mais conhecido é o desaparecimento dos dinossauros e de espécies vegetais.
A vida no planeta Terra também poderá ser extinta: (1)
se ocorrer algum tipo irremediável de epidemia mortal cobrindo todo o
globo; (2) se as agressões ao meio ambiente prosseguirem sem qualquer controle
e num ritmo que impossibilite a recuperação natural; (3) se as nações
guerreiras provocarem uma hecatombe nuclear.
Sofrer desengano ou derrota não é o fim do mundo.
Compreender a fonte do engano ou reconhecer o mérito do vitorioso é um modo
virtuoso de ser e de estar no mundo.
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