Sofismas
são utilizados para escapar às decisões do povo tomadas em plebiscito,
referendo ou iniciativa de lei. Os argumentos falaciosos mais freqüentes são: (i)
as consultas (plebiscito e referendo) e os projetos de lei vindos do povo servem
apenas para orientar os governantes, não criam obrigação alguma; (ii) o Congresso Nacional exerce a soberania
constituída, por isto é livre para dispor como bem lhe parecer, inclusive
contra o resultado das consultas populares. Estes argumentos afrontam a
essência da democracia: todo poder emana
do povo. A soberania é do povo e não dos seus representantes. Parlamentares,
chefes de governo e magistrados exercem a soberania em nome do povo. O
resultado da consulta é uma decisão do povo e não mera opinião ou sugestão que o
representante pode aceitar ou rejeitar ao seu talante. Tal decisão advém do
exercício direto da soberania popular, por isso mesmo, obriga governantes e
governados enquanto vigorar o regime democrático. O voto é o veículo da
decisão. No plebiscito e no referendo o povo escolhe a solução que lhe parece
melhor; não opina, nem sugere; vota. Nas ruas, praças e bairros das cidades brasileiras
nos meses de junho e julho de 2013 o povo clamava por mudança nos costumes
políticos, na mentalidade e na atuação geral dos órgãos públicos e em especial dos
governantes lato sensu (parlamentares,
presidentes, magistrados). A mensagem indicava impaciência com os paliativos,
as safadezas, o engodo. A massa popular estava a exigir providências sem delongas
e sem disfarces e uma efetiva e autêntica representação política. Sem assembléia
constituinte ou sem renovar o Congresso Nacional através de eleições e
candidaturas avulsas de gente bem qualificada do ponto de vista moral e
intelectual, as mudanças serão ilusórias.
Nesse clima conturbado e de expectativas sociais e
políticas, o Papa visita o Brasil (julho, 2013). Multidões o aclamam. Jovens de
vários países se confraternizam sob um lacrimejante céu carioca. O cenário foi
composto pela praia de Copacabana, “princesinha do mar”, obra da natureza e
pela estátua do Cristo Redentor, obra humana. O mundo assiste a um espetáculo
de fé religiosa do povo e de sagacidade política da Igreja de Roma. O Vaticano tenta
limpar a nódoa dos crimes financeiros e sexuais praticados pelo clero e que
agravam a dificuldade de inculcar nas novas gerações as falsidades contidas na
Bíblia e as mentiras da catequese. Se esse livro falacioso fosse a “palavra de
Deus” como se apregoa maliciosa e cinicamente, então Deus seria um baita enganador
à imagem e semelhança dos autores que redigiram o texto bíblico a partir de 398 a.C. A igreja não
consegue ocultar o propósito de iludir e dominar as massas, de manter a riqueza
e o poder. Traça, então, nova estratégia para não perder adeptos e conquistar
novas cabeças e aumentar o rebanho e o tesouro. Essa estratégia inclui: (i) trocar
um papa de aparência nazista por um papa de aparência franciscana; (ii) adotar discurso
em favor dos pobres; (iii) seduzir os jovens (a igreja dispõe de peritos e
cantores).
Nações se alarmam com a espionagem dos EUA denunciada
por indivíduo que prestava serviço no setor de segurança nacional (julho, 2013).
A presidente Dilma pede explicações ao governo estadunidense. Aos seus
auxiliares, ela solicita estudos visando a reduzir os riscos de invasão à
privacidade dos usuários públicos e particulares da rede de computadores no
Brasil. Ouviram-se veementes protestos no Congresso Nacional. O teatral
esbravejar dos parlamentares brasileiros é manifestação de hipocrisia. Eles fizeram
pior do que o governo estadunidense: permitiram que pessoa jurídica (integrada
por brasileiros e estrangeiros) fosse proprietária de empresas jornalísticas e
de radiodifusão sonora e de sons e imagens; permitiram entrada de capital
estrangeiro nessas empresas. Parcela da população sem juízo crítico, segue o padrão
transmitido por rádio, televisão e rede de computadores, arquitetado por
estrangeiros donos dos meios de comunicação. A fim de salvaguardar a soberania,
os valores e a cultura da nação brasileira, as constituições republicanas proibiam
aos estrangeiros a propriedade dessas empresas e a participação de pessoa
jurídica no capital social. Moedas romperam essa tradição em 2002 (EC 36 + lei
10.610). Daí, a colonização cultural; daí, o filtro do noticiário sempre favorável ao governo dos EUA e de
Israel e desfavorável aos seus adversários ou inimigos; daí, a exibição maciça de
filmes enaltecendo esses governos e lembrando o holocausto dos judeus para
eternizar a falsa imagem de únicas vítimas e justificar o genocídio que
praticam contra os palestinos; daí, entrevistas, reportagens e documentários tendenciosos;
daí, a alusão pejorativa aos governos que não gozam da simpatia dos EUA e
Israel (Bolívia, Coréia do Norte, Cuba, Irã, Venezuela); daí, a falta de
isenção e de honestidade nas transmissões, a deturpação na linguagem de
comentaristas e apresentadores (quem era tratado de “presidente” quando satisfazia
interesses dos EUA e de Israel, passa a ser tratado de “ditador” quando não
mais os satisfaz; defensor dos interesses contrários aos dos EUA e de Israel é
“terrorista”, e assim por diante).
O legislador constituinte dotou o Poder Judiciário de
autonomia administrativa e financeira, estruturou-o com tribunais e juízes
federais, estaduais, eleitorais, trabalhistas e militares e manteve as
garantias de vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade dos subsídios dos
magistrados. Aos juízes e tribunais compete o controle da constitucionalidade e
da legalidade dos atos do poder público, conhecer e solucionar controvérsias à
luz do direito. Aos tribunais cabe administrar a sua economia interna e tomar a
iniciativa das leis nos casos especificados na Constituição. O supremo tribunal
pode elaborar súmula de efeito vinculante sobre matéria objeto de reiteradas
decisões. Na hipótese de violação grave dos direitos humanos, a competência da
Justiça Estadual poderá ser deslocada para a Justiça Federal a pedido do
Procurador-Geral da República. Aos juizados especiais compete processar causas
cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo. Mediante
emenda à Constituição, o legislador ordinário instituiu o Conselho Nacional de Justiça
(CNJ), antes rejeitado pelo legislador constituinte. Compete ao CNJ o controle da
atuação administrativa e financeira dos tribunais e a fiscalização da conduta
funcional dos magistrados (juízes, desembargadores, ministros). Cogita-se a extinção
do privilégio de foro. A Constituição exige: (1) do Poder Judiciário: julgamentos públicos,
decisões fundamentadas, atividade ininterrupta, imediata distribuição dos
processos, número de juízes proporcional à demanda e à população da unidade
jurisdicional; (2) do juiz:
produtividade, aperfeiçoamento, residência na comarca, abstenção política partidária,
dedicação exclusiva à função judicante, quarentena antes de retornar à
advocacia junto ao juízo ou tribunal do qual se afastou.
Em 24 anos de vigência (1988 a 2012) a Constituição
recebeu 77 emendas (6 de revisão e 71 de reforma). Idéias e pretensões vencidas
na assembléia constituinte foram posteriormente incorporadas ao ordenamento
jurídico quando os seus defensores ocuparam o Legislativo e o Executivo. Amoldaram
a Constituição ao neoliberalismo. As emendas alteraram: (I) os sistemas previdenciário, tributário,
financeiro, do ensino e da administração pública; (II) as regras atinentes aos
juros, medidas provisórias, contribuições de intervenção no domínio econômico,
reunião do Congresso Nacional e contratação de agentes comunitários de saúde e
combate às endemias; autorizaram: (I) instauração de ação penal contra
parlamentar sem prévia licença da Casa; (II) reeleição do chefe de governo;
(III) participação de pessoas jurídicas no capital social de empresas
jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e imagens; (IV) admissão de
professores, técnicos e cientistas estrangeiros nas universidades; criaram: (I) o Ministério da
Defesa; (II) o Plano Nacional de Cultura; (III) juizados especiais na Justiça
Federal; reformaram o Poder Judiciário; favoreceram as pequenas empresas, concederam
autonomia às instituições de
pesquisa científica, estabeleceram limites
às despesas de câmara municipal, criaram contribuição para custeio do serviço
municipal de iluminação, elevaram
o quantitativo de recursos a ser entregue pela União ao Fundo de Participação
dos Municípios, desvincularam as
candidaturas e outorgaram aos partidos liberdade de escolha das coligações, garantiram o registro nos consulados
de brasileiros nascidos no exterior. Inúmeras emendas regulam a si próprias
quando tal regulamentação é matéria de lei complementar e exige participação do
presidente da república (sanção, promulgação, publicação). Ao subtraírem da
sanção presidencial os preceitos reguladores, os parlamentares abusaram do seu
poder e desvirtuaram o processo de emenda.
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