domingo, 15 de julho de 2012

GOVERNO SAGRADO


Em alguns livros da primeira parte da bíblia (antigo testamento) como Gênesis, Isaías, Ezequiel, e da segunda parte (novo testamento) como nos quatro evangelhos e nas epistolas de Pedro e Paulo, há referência a entidades angelicais. No século I da era cristã, estas entidades foram organizadas em graus hierárquicos por Dionísio, grego que aderiu ao cristianismo depois de ouvir discurso de Paulo no Areópago (tribunal de Atenas). Ele organizou um governo sagrado composto de três coros ou escalões, cada qual com três grupos de entidades: (i) o escalão ou coro baixo formado por grupos de anjos, de arcanjos e de principados; (ii) o escalão ou coro médio formado por grupos de potestades, de virtudes e de dominações; (iii) o escalão ou coro alto formado por grupos de tronos, de querubins e de serafins. Os entes angelicais são mensageiros e executores da vontade soberana da divindade. A imagem de todos é masculina, reflexo da cultura patriarcal daquela época. Tais entidades se manifestam como puro espírito ou em corpo de homem. A exclusão da mulher do coro angélico provocou debates em assembléias eclesiásticas sobre o sexo dos anjos.  

Se for imaginada forma piramidal a essa hierarquia celeste, o primeiro escalão ocupará a base, o segundo o meio, o terceiro a parte alta e Deus a cúspide. Personalidades sem corpo (almas) no mundo espiritual, formam o povo do Estado divino sob esse governo sagrado. As autoridades angelicais atuam nas dimensões material e espiritual do mundo. Cumprem e fazem cumprir as leis divinas. Guiam o povo, orientam e protegem personalidades encarnadas e desencarnadas. Prometem recompensas. Seduzem e engravidam mulheres. Infligem castigos. Participam de batalhas terrenas. Destroem cidades. Exterminam gente e animais. Tudo em obediência à “vontade do Senhor”.

Do mesmo modo que atribuíram castigos a Adão, Eva e descendência, fundados no conhecimento vulgar, os escritores bíblicos também transplantaram para a cidade de deus o modelo político terreno. Imaginaram um governo celeste semelhante ao governo dos países daquela parte do globo terrestre cuja história eles conheciam: Egito, Babilônia, Pérsia e a própria Palestina do tempo de Davi e Salomão. O faraó era considerado ser divino; enquanto governava, sua pessoa era sagrada. Havia hierarquia civil, militar e religiosa naqueles reinos. Governantes em diferentes épocas e países também se consideravam divinos, como os imperadores japoneses e os monarcas europeus absolutos. Depois de partir da Terra para o Céu, o modelo hierárquico retorna do Céu para a Terra a fim de cobrir com o véu divino o poder dos governantes. O modelo imperial de Roma foi adotado pela igreja: pontífice máximo (Papa), bispos no alto escalão, padres no médio escalão e povo na base. Os monarcas europeus do período absolutista afirmavam governar por direito divino. Ao se desvencilharem da jurisdição do Papa, eles afirmaram receber o poder diretamente de Deus.

No mundo contemporâneo, na vigência de constituições democráticas, governantes conservam atitude imperial e divina. O presidente Bush (EUA), por exemplo, foi admoestado pelo Papa por usar o nome de Deus para justificar invasões no Afeganistão e Iraque. Governantes dinásticos, ou oriundos de golpes militares, vestem a capa de missionários divinos, submetem e exploram a nação. Governantes antigos consultavam oráculos. Governantes modernos consultam bruxos, videntes e astrólogos; usam a razão natural, mas não descartam o poder sobrenatural.

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