sexta-feira, 15 de julho de 2022

JUÍZES MEDROSOS

O vice-presidente da república opinou sobre o noticiado temor dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) quanto a eventual plano do presidente da república de tumultuar ou impedir as eleições de outubro/2022. Disse (i) que se Lula vencer as eleições, as forças armadas o respeitarão, não por sua pessoa e sim por seu posto (ii) que “tem magistrado com medo da própria sombra”.
Como general, o vice-presidente capta o sentimento dominante na caserna. O resultado das urnas será respeitado. O vencedor ocupará o posto de comandante supremo das forças armadas e será acatado pelos militares consoante o princípio da hierarquia e disciplina. [CR 172].
Recear e falar em golpe é sucumbir diante da provocação e da fanfarronice do atual presidente da república e dos seus asseclas. A resposta deve ser o enfrentamento e a prevenção, sem medo de ser feliz. O Tribunal Superior Eleitoral certamente reforçará as medidas que ordinariamente determina nesses períodos a fim de evitar o tumulto nas eleições. O medo dos democratas da direita e da esquerda estimula os nazifascistas a imitarem Trump e sua quadrilha. Cabe à polícia, ao ministério público, ao judiciário, à maioria do povo e seus representantes, cortar as asas dessa gente. O momento exige coragem no discurso e na ação dos defensores da democracia: políticos, juristas, intelectuais, jornalistas, empresários, trabalhadores, cidadãos em geral.
O medo, a covardia e a venalidade do magistrado mancham o virtuoso tecido da Justiça. Ao jurisdicionado importa mais o caráter sem jaça, a honestidade, a coragem, a independência, o espírito alforriado do magistrado, do que o saber jurídico. [Apesar do seu enciclopédico saber, Francis Bacon, político nobre, cientista e filósofo inglês, introdutor do método científico, perdeu o seu cargo de ministro (chanceler) por comprovada corrupção. Processado e condenado, recebeu o perdão do rei].    
Da função judicante são próprios: o criterioso exame dos fatos, a serenidade, a cautela, a reflexão, a razoabilidade, na busca de soluções bem ponderadas e justas nos casos sub judice. Essas propriedades não se confundem com medo e covardia que, aliás, não são apanágios exclusivos dos magistrados. Medo é sentimento próprio da natureza humana. Medroso é o portador de medo excessivo. A experiência forense mostra que existem juízes medrosos. A toga esconde a fraqueza de quem a veste. A ética judiciária recomenda que o magistrado mantenha prudente distância do jogo político partidário. No exercício da sua cidadania, o magistrado (i) deve ser mais discreto do que o cidadão comum (ii) deve manter conduta irrepreensível na vida pública e particular. Desde o final da ditadura militar no Brasil, essa discrição não tem sido observada a contento. Há magistrados falando pelos cotovelos e exibindo as suas fraquezas. 
Frise-se: a falada “judicialização da política” se deve às frequentes inconstitucionalidades e ilegalidades praticadas nas casas do Congresso Nacional, na Presidência da República, nas assembleias legislativas, nas câmaras municipais, nos governos estaduais, nas prefeituras municipais e também por partidos políticos e por ativistas políticos filiados ou não a partido. Serve de exemplo, a recente e escandalosa proposta de emenda à Constituição baseada num falso estado de emergência. A “emergência” dura 6 anos! A parcela vulnerável da população aumentou a partir do golpe de 2016. O governo acordou só agora, nas vésperas das eleições? O presidente da Câmara dos Deputados, na proximidade das eleições, teve a desfaçatez de mudar o regimento interno durante os trâmites da PEC no indisfarçável intuito de satisfazer interesses seus e do presidente da república. Baita compra de votos no atacado. 
Sessão legislativa sem o quórum regimental e/ou sem matéria a ser nela tratada fica sujeita à anulação por sentença judicial, sem prejuizo do princípio da separação dos poderes. Tipifica fraude no processo legislativo: [1] Abrir e fechar sessão num minuto visando apenas contagem de turnos, sem discussão e votação de matéria alguma [2] Sessão fora do horário regimental presidida por quem não tem competência [3] Registro de presença de quem está ausente [4] Ferir a ordem dos trabalhos (pequeno e grande expedientes, ordem do dia, comunicações). Sem trabalho não há sessão real e sim pura ficção. Norma regimental que acolhe essas fraudes é nula de pleno direito. Todas as normas infraconstitucionais (leis, decretos, medidas provisórias, resoluções) devem estar em sintonia com os princípios constitucionais de moralidade, impessoalidade e legalidade.  
No sistema jurídico brasileiro, a validade das regras não escritas (praxe, costume) depende da sua sintonia com a lei e a Constituição. Quando a regra contida nos usos e costumes for incompatível com a regra contida na lei do estado, prevalece esta última. Se a lei do estado for omissa em relação a algum caso concreto, recorre-se à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito para preencher a lacuna. Na falta de lei do estado, vige a regra costumeira, que não se confunde com o direito natural. Os princípios do direito natural (vida, liberdade, igualdade, fraternidade, propriedade, segurança) migraram da oralidade para a forma escrita desde a declaração francesa dos direitos do homem e do cidadão (1789) e constam das constituições de vários países na Idade Contemporânea.  


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