domingo, 17 de julho de 2022

DUELO NO OESTE

Em Foz do Iguaçu, comarca situada no oeste do Paraná, fronteira com o Paraguai, onde funcionei como juiz substituto estadual (1972), houve troca de tiros de revólver entre um bolsonarista e um lulista durante festa particular de aniversário em salão decorado com poster de Luiz Inácio Lula da Silva, candidato à presidência da república (09/07/2022). Os convidados se dispersaram em polvorosa. O duelo repercutiu dentro e fora do Estado do Paraná. Vídeo circulando na rede de computadores mostra homem em pé (bolsonarista) disparando arma de fogo contra homem deitado (lulista). Mulher surge correndo e derruba o bolsonarista. Agachado, o bolsonarista sai em direção à porta dos fundos. O lulista, ainda deitado, revida atirando contra o bolsonarista que tomba. Aparece um homem que chuta o bolsonarista. 
Internados no hospital, o lulista morreu e o bolsonarista sobreviveu, pelo menos, até o momento em que este artigo está sendo escrito. Se ele morrer, o inquério policial será arquivado. A morte é causa extintiva da punibilidade. Ainda que o inquérito esteja concluído, o promotor de justiça não poderá oferecer denúncia contra pessoa morta.
Se o bolsonarista continuar vivo, uma vez concluído o inquérito policial, o promotor de justiça poderá pedir o arquivamento se lhe parecer presente causa de exclusão de ilicitude (legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento de dever legal, exercício regular de direito). Se disto não se convencer, o promotor oferecerá denúncia (petição inicial da ação penal), tendo em vista que a materialidade e a autoria do delito estão evidenciadas. A controvérsia, neste caso concreto, limita-se à culpabilidade.  
Se o juiz não receber a denúncia (indeferir o processamento), o caso será arquivado; se o juiz receber a denúncia (deferir o processamento) instaura-se o processo criminal no bojo do qual será apurada a responsabilidade do acusado. Este e as testemunhas serão ouvidos. Laudos periciais e outros documentos atinentes ao caso, se houver, serão examinados. O promotor e o defensor apresentarão as suas razões. Busca-se esclarecer os motivos e as circunstâncias do fato sub judice. O resultado dessa busca pode não coincidir com as versões e opiniões extrajudiciais. A palavra final caberá ao júri por se tratar de homicídio. Cabem recursos às instâncias superiores do judiciário.  
As versões e opiniões extrajudiciais sobre o ocorrido brotam de diversas fontes: (i) a do homicida, sua esposa, parentes e defensores (ii) a da esposa, parentes e defensores da vítima (iii) a de amigos, adversários, jornalistas e juristas. Sobre o motivo do crime, divergem se foi político ou se foi exclusivamente pessoal. 
1. Motivo político partidário e/ou ideológico, determina o agir tanto no crime político como no crime comum. Crimes politicos referidos - mas não definidos - na Constituição, devem ser garimpados nas leis esparsas como a (i) 14.197/2021 sobre segurança nacional (ii) 1.079/1950 sobre responsabilidade do presidente da república, dos ministros, inclusive os do supremo tribunal, procurador-geral da república, governadores e secretários dos estados (iii) 2.889/1958 sobre genocídio (iv) 4.898/1965 sobre abuso de autoridade (v) o decreto-lei 201/1967 sobre prefeitos e vereadores.
2. Motivo pessoal inclui o aspecto moral: retorquir ofensas.
Esses e outros motivos como, por exemplo, rivalidade entre agentes de segurança de distintos órgãos públicos, podem convergir para o mesmo episódio. O fato ocorreu no interior do país onde é dominante a figura do macho caracterizado por (i) aguda sensibilidade à honra pessoal (ii) instinto brioso (iii) predisposição ao sacrifício, à carranca e à violência (iv) fidelidade ao chefe (coronel fazendeiro, capitão da indústria, dono do mercado, líder político). “Não levar desaforo para casa” é o seu lema. “Lavar a honra” é imperativo da sua dignidade pessoal. Tudo isto explica - mas não justifica - o homicídio. 

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