sábado, 21 de março de 2020

IMPEACHMENT

No Brasil, entre as autoridades públicas sujeitas ao impeachment [fórmula jurídica para resolver grave problema político] estão o presidente da república, os ministros de estado e os juízes do supremo tribunal. A responsabilidade política do presidente está prevista no artigo 85 da Constituição da República, nos seguintes termos: “São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra...” (seguem-se as hipóteses descritas nos incisos I a VII). Portanto, todos os atos (ações e omissões) do presidente que atentem contra a Constituição (lei magna) entram na classe dos crimes de responsabilidade. O citado artigo dispõe sobre duas categorias desse tipo de crime: (i) a geral, enunciada no “caput” e (ii) a especial, enunciada nos incisos. Atos contrários aos fundamentos do estado, aos direitos humanos, às regras estruturais e funcionais da ordem política, econômica e social, entram na categoria geral. Atos que se encaixam nos incisos, entram na categoria especial. O legislador constituinte incluiu na categoria especial os atos praticados contra o livre exercício do Poder Legislativo e do Poder Judiciário. A ação do presidente de convocar e/ou incentivar reuniões públicas cujo pleito é o fechamento desses poderes, constitui crime de responsabilidade. 
A Câmara dos Deputados e o Senado Federal, cada qual ao seu tempo e ao seu modo, verificam se os atos denunciados configuram atentado à Constituição e, em caso positivo, se entram na categoria geral ou na especial. A lei magna contém a definição do crime (praticar atos que atentem contra a Constituição Federal) e a pena a ele cominada (perda do cargo e inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública), em consonância com o princípio nullum crimen nulla poena sine lege. O agente desse crime é o presidente da república. Os pacientes são: [i] o estado brasileiro, instituição política [ii] o povo brasileiro, comunidade nacional titular da soberania e do poder constituinte (“todo o poder emana do povo”). O bem protegido é a Constituição Federal, ou seja, a estrutura e o funcionamento do estado brasileiro na tríplice dimensão: política, econômica e social. O crime é formal (consuma-se com a prática do ato, independente do resultado); o seu núcleo é atentar (ação ou omissão contra). [CF 1º, p.u. + 5º, XXXIX + 52, p.u. + 85]. 
Embora o crime seja político, o foro competente para dele conhecer seja o Congresso Nacional e o processo seja parlamentar, o estado brasileiro é de direito. Portanto, o processo parlamentar é jurídico, subordinado às normas constitucionais e legais em vigor, sob o manto das garantias do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. As regras procedimentais estão contidas no texto constitucional, nos regimentos internos da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nas decisões do Supremo Tribunal Federal proferidas nos casos Collor e Rousseff, e nas partes da lei 1079/1950 recepcionadas pela Constituição de 1988. Os deputados funcionam como juízes instrutores e autorizadores. Os senadores funcionam como juízes processantes e julgadores. [CF 5º, LIV e LV+ 51, I + 52, I e parágrafo único + 86]. 
Quando houver mais de um ato ilícito, todos podem constar da mesma denúncia e do mesmo processo, posto que a pluralidade está prevista na lei magna (CF 85, “caput”). Não se há de confundir com a exigência de fato determinado que se faz para a atuação da comissão parlamentar de inquérito (CF 58, §3º). Além disto, fato determinado tanto pode ser simples (uma só coisa, uma só ação ou omissão) como pode ser composto (várias coisas, vários atos). A guerra é um fato determinado composto, assim como o atentado.  Caso haja mais de um ato ilícito, a petição inicial (denúncia) deve descrever cada ato. A comissão parlamentar investigativa poderá incluir outros atos. Ainda que evidenciada a prática delituosa, critérios políticos de conveniência e oportunidade podem lastrear a decisão da Câmara de não autorizar a instauração do processo ou a decisão do Senado de não destituir o presidente. Por outro lado, decisão condenatória tem que ser jurídica, proferida por 2/3 dos votos do Senado, em sintonia com as normas legais e constitucionais. Ao se divorciar do direito, tal decisão afronta valores supremos da nação declarados no preâmbulo da Constituição (democracia, igualdade, justiça, liberdade, direitos sociais e individuais, bem-estar, segurança) além de esvaziar o processo eleitoral do qual resultou a eleição do presidente. No processo parlamentar, apura-se a responsabilidade política; o presidente fica sujeito a perder o cargo e direitos políticos. No processo judicial, apura-se a responsabilidade penal; o presidente fica sujeito a perder a liberdade e bens patrimoniais.  
No Congresso Nacional, perante os representantes do povo brasileiro, o presidente eleito presta o compromisso de manter, defender e cumprir a Constituição, observar as leis, promover o bem geral do povo, sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil. Esse compromisso é ato solene de legitimação da posse do presidente, dotado de força jurídica, fonte de deveres. Honrá-lo é necessário. Quebra-lo é crime de responsabilidade, ato de lesa-pátria. A conduta ilícita do presidente pode ameaçar e abalar a forma de governo, a segurança nacional, o patrimônio público, os alicerces e os objetivos fundamentais da república. [CF 1º/3º + 78].
Prestar continência à bandeira dos EUA e prostrar-se perante o chefe daquele país não são gestos de sustentação da independência do Brasil e sim aviltamento da soberania nacional. O gringo nunca retribuiu as visitas que o caboclo lhe faz. Nessa relação, evidencia-se a desigualdade: o gringo no patamar superior, o caboclo ao rés do chão. A sabujice do brasileiro implica apoio ao terrorismo de estado praticado por aquele governo (genocídio, invasões, estupros, espionagem, imperialismo). A fim de agradar ao presidente ianque, o sabujo hostiliza o governo da Venezuela no intuito de provocar guerra, cria animosidade com os governos socialistas de Cuba e da China, bajula o governo nazista de Israel. Essa conduta fere os princípios que regem as relações internacionais declarados na Constituição (art.4º.): independência nacional, autodeterminação dos povos, não-intervenção, igualdade entre os estados, defesa da paz, repúdio ao terrorismo e ao racismo. Incentivar aglomerações de pessoas, ter com elas contato físico, contrariando recomendações de organismos médicos e científicos nacionais e internacionais sobre pandemia que assola o país e o mundo, longe de promover o bem geral, constitui grave ameaça à saúde da população brasileira. 

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