sábado, 16 de setembro de 2017

NAZISMO

Na rede de computadores, alguns internautas, tomando por base o nome do partido político alemão, afirmam que o nazismo é de esquerda; outros, tomando por base a vida do partido, afirmam que o nazismo é de direita. O mesmo objeto visto por ângulos diferentes. Contradições e oposições integram a realidade existencial dos humanos. A diversidade tanto no mundo da natureza como no mundo da cultura rebela-se contra os engenhos do intelecto, zomba da lógica e estremece teorias. Há no fascismo e no nazismo uma genética indisposição para a produção teórica e uma disposição para enaltecer a ação caprichosa e pragmática impulsionada pela vontade e pelo sentimento. Nas ruas, ou infiltrado nos partidos da direita e nos meios de comunicação social, o nazismo continua vivo na Europa e na América. Crise moral, econômica e política serve de caldo de cultura ao nazismo. A América Latina, por exemplo, recebe nutrientes dos EUA. Os nazifascistas brasileiros, argentinos, paraguaios, chilenos, peruanos, colombianos, insuflados pelo governo estadunidense, tentam sufocar a Venezuela e impedir que a esquerda assuma o governo em seus respectivos países.
O fascismo na Itália e o nazismo na Alemanha são manifestações de um fenômeno social e político europeu ocorrido na primeira metade do século XX (1901-1950). Tendo em vista as peculiaridades históricas que lhes serviram de fundo, o fascismo e o nazismo situam-se numa zona cinzenta das relações políticas por não se encaixarem plenamente na bipolaridade vivenciada na assembleia nacional francesa do século XVIII (1701-1800): girondinos à direita x jacobinos à esquerda. A partir do século XIX (1801-1900) com a revolução industrial, a direita foi ocupada pela aristocracia dos detentores do capital [industriais, banqueiros, comerciantes, latifundiários], pelas forças armadas, pelo liberalismo econômico e por leis protetoras dos bens e interesses desses grupos. A esquerda foi ocupada pela democracia dos detentores da força do trabalho [operários, bancários, comerciários, camponeses], pelo socialismo e por leis protetoras dos bens e interesses dos cidadãos.
A complexa realidade social dos povos responde pela flexibilidade desse esquema. Os governos socialistas da Rússia e da China, por exemplo, fizeram concessões ao capitalismo. Os governos liberais da Inglaterra e dos EUA fizeram concessões ao socialismo. Tanto na direita como na esquerda encontram-se funcionários públicos, profissionais liberais, jornalistas, literatos, artistas, cientistas, filósofos, religiosos. Os militares prestam serviço a governos de direita e de esquerda em nome da defesa nacional e da ordem pública (ocasionalmente, perpetram golpes de estado).   
Após sofrer derrota na primeira guerra mundial (1914-1918), a Alemanha ficou numa situação caótica. A monarquia foi substituída pela república. A nova ordem resultou do consenso entre os chefes dos partidos socialista, centrista e liberal, em torno dos seguintes pontos: sufrágio universal, representação proporcional, governo de gabinete, direitos à liberdade, à segurança, à propriedade, ao emprego, à educação, à proteção do trabalhador e da família contra os riscos da economia industrial. Portanto, passou a vigorar a social democracia naquele país. (Weimar, 1919).
O nazismo teve início proletário em uma cervejaria de Munique (Baviera, 1919), onde o ferroviário Anton Drexler e mais 6 companheiros fundaram o Partido dos Trabalhadores Alemães com a seguinte plataforma: [1] rejeitar o Tratado de Versalhes; [2] extinguir o sistema parlamentar e fortalecer o poder central; [3] confiscar lucros de guerra e nacionalizar os trustes; [4] distribuir os lucros das grandes indústrias; [5] dividir as grandes casas de comércio em pequenas unidades de vendas a retalho; [6] proibir a especulação imobiliária e a obtenção de renda sem trabalho; [7] punir a usura com pena de morte e cassar a cidadania dos judeus; [8] aumentar os benefícios aos necessitados. Como se vê, nos seus primórdios, ainda sem representação no Parlamento (onde a esquerda estava representada pelo Partido Socialista Alemão – Sozi), o novo partido exibia, no plano das ideias, nuances patrióticas, centralizadoras e socializantes.
Embora não sendo fundador, Adolfo Hitler comparecia às reuniões do pequeno grupo como observador militar (inteligentsia do exército), mas acabou por aderir ao novo partido e se desligar do exército onde obtivera a graduação de cabo e fora condecorado com a cruz de ferro por bravura na primeira guerra mundial. Austríaco, solteiro, artista (pintor), sem formação acadêmica, inteligente, carismático, bom orador, Adolfo conquistou a confiança do grupo e se tornou responsável pela propaganda. Por consenso interno e para atrair prosélitos, o grupo mudou de nome: Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães – Nazi (1920).
Independente em relação ao socialismo internacional, o Partido Nazi opõe-se ao marxismo; concentra-se nas necessidades e aspirações germânicas. No começo, sem sede própria, com menos de 100 pessoas, o grupo se reunia em diferentes lugares, contava com antigos oficiais do exército, pequenos fazendeiros, estudantes, trabalhadores desempregados. No seu evolver, o partido buscou capitalizar-se e atrair a classe operária e a camada média da sociedade. Entre os fatores da gestação e do crescimento do Partido Nazi contam-se: a inconformidade com a Constituição de Weimar, considerada infiel ao espírito germânico; o caos gerado pela derrota na guerra e pela severidade do Tratado de Versalhes; a tensão nas camadas sociais; a perplexidade do corpo eleitoral; a colossal inflação e a desvalorização da moeda (1923); o censurável oportunismo dos especuladores (principalmente judeus usurários). 
Os comunistas qualificavam de fascista a social democracia e hostilizavam a Constituição de Weimar. Isto favoreceu a definição ideológica do Partido Nazi como nazismo, equidistante do comunismo e da social democracia, tolerante com o capitalismo, defensor de um providencial governo autoritário, nacionalista e racista, o que levou historiadores e doutrinadores, sem rigor científico, a classifica-lo como de direita. O Partido Nazi ganhou impulso na grande depressão alemã a partir do colapso da Bolsa de NY em 1929. O partido crescera e se fortalecera no curso dos 10 anos seguintes à sua singela fundação. Com bancada de 107 representantes no Parlamento, em 1932, o partido pleiteou o cargo de Chanceler para Adolfo Hitler que acabara de adquirir a cidadania alemã [Adolfo renunciara à cidadania austríaca em 1925]. Vigorava o parlamentarismo. O Presidente da República era Chefe de Estado e o Chanceler era Chefe de Governo. O Chanceler dependia da confiança do Parlamento. Nenhum conseguia maioria. Então, industriais e banqueiros exigiram, por escrito, a chancelaria para Adolfo. O Presidente Hindenburg cedeu com restrições e o nomeou (1933). 
No período de 1919 a 1939, o povo alemão ansiava mais por segurança econômica e social do que por liberdade. Ante o crescimento do partido comunista e da sua influência no Parlamento, a burguesia reagiu e obteve a chancelaria para Adolfo. Graças ao resultado do plebiscito realizado depois da morte do Presidente Hindenburg em 1934, Adolfo assumiu as duas chefias, do estado e do governo [führer und reichskanzler], apoiado no voto popular. O nacional socialismo, então, adquiriu força total como pensamento e como ação (nazismo). Direito espelhando a alma do povo alemão (volksgeist). Governo simpático ao capitalismo, alicerçado nos segmentos civil e militar da sociedade alemã, estimulava o ódio, a intolerância e a violência. Adversários políticos (principalmente comunistas) e pessoas não arianas, eram perseguidos, isolados ou eliminados. Dissolvido o Parlamento, houve novas eleições. O número de cadeiras do Partido Nazi aumentou. Aliança partidária obteve maioria no Parlamento e golpeou a Constituição ao conceder plenos poderes a Adolfo. Nessa ditadura instaurada para resolver crise conjuntural, Adolfo encarna o volksgeist e personifica o direito e o poder.  O nazismo chega ao seu clímax significando exercício autocrático do poder político por uma elite civil/militar apoiada no capital financeiro, funções legislativa e executiva acumuladas, oposição suprimida, regime racista de tendência totalitária e caráter nacionalista, idealista e romântico [predomínio do sentimento e da vontade].
O nazismo alemão apresentava as seguintes características: misticismo e pretensão messiânica, valorização do camponês [considerado portador das altas qualidades germânicas], aversão ao marxismo, à democracia e às raças não arianas. Assemelhava-se à religião por seu dogmatismo, ritualismo, expansionismo e pela cruz gamada (suástica) símbolo místico do culto à pátria (círculo externo) e da irmandade secreta (círculo interno). A nova Alemanha, III Reich sucessor dos impérios dos Hohenstaufen e Hohenzollern, criado para durar mil anos, se propôs a: [1] purificar a sociedade mediante a segregação ou eliminação dos homossexuais, judeus, ciganos, negros e outros estranhos à raça ariana; [2] condicionar a mente e o coração dos alemães ao nazismo; [3] relegar ao segundo plano a lealdade à família, à classe e à religião; [4] dominar qualquer nação que resistir à expansão teutônica; [5] esmagar o inimigo sem concessões, com raiva e bravura; [6] vingar a humilhação imposta pelo Tratado de Versalhes.
A resistência interna a esse projeto era mínima. O povo alemão gostava do governo nazista e venerava o seu líder (Adolfo).O uso que fazia dos recursos nacionais não era questionado. Ciente da relevância do apoio popular, aquele governo: [1] cuidou da assistência aos necessitados; [2] garantiu emprego e salário digno aos trabalhadores, porém negou a liberdade sindical e o direito de greve. A nova Alemanha gastava com armamento mais do que os outros países. Tornou-se potência militar e econômica. O êxito estrondoso arrebatou de Adolfo a sensatez e a lucidez essenciais a um estadista. Como um alucinado imperialista, ele provocou a segunda guerra mundial e a morte de 40 milhões de pessoas.

Nenhum comentário: