quarta-feira, 24 de agosto de 2016

IMPEACHMENT XII

Quesitos.

O Jornal do Brasil eletrônico (18/08/2016) noticiou encontro do Presidente do Senado Federal com o Presidente do Supremo Tribunal Federal. A finalidade do encontro foi a de estabelecer o rito do julgamento do impeachment. Do que se depreende da noticia, foi adotado o rito do tribunal do júri: encerrada a instrução processual, apresentadas as alegações finais da acusação e da defesa, os senadores farão o debate entre si e depois responderão aos quesitos formulados pelo presidente da sessão de julgamento.
Acontece que, de acordo com a notícia, não haverá quesitos e sim um único e complexo quesito já elaborado pelos dois presidentes e transcrito no jornal.
Se a notícia e a transcrição estiverem corretas, constatar-se-á o divórcio do quesito em relação à lógica e ao direito, especialmente no que tange às regras contidas no artigo 484, do Código de Processo Penal, cuja aplicação subsidiária vem autorizada pelo artigo 38 da Lei 1.079/1950.
Realmente, o quesito publicado no jornal, cuja elaboração é atribuída aos dois presidentes, parte da premissa oculta e presumida de que o caráter criminoso dos fatos está definido e o respectivo entendimento é indiscutível e pacífico. Essa formulação torna o quesito falacioso. O que está em jogo é justamente a questão de saber se os fatos descritos na denúncia revestem ou não revestem caráter criminoso. Esta é a questão central a ser examinada e julgada pelos senadores.
O quesito único e complexo, tal como publicado, incide na falácia denominada “petição de princípio”: supõe conhecido o que ainda depende de cognição; considera incontroverso o que ainda é controvertido; toma por aceito o que ainda precisa ser debatido pelos senadores.
Do ponto de vista lógico e jurídico, a questão de mérito no caso concreto exige uma sequência de, pelo menos, cinco quesitos: os dois primeiros versando a materialidade do crime; o terceiro, a autoria do crime; o quarto, a culpabilidade; e o quinto, a pena. A redação pode ser aproximadamente a seguinte:

1) A tomada de empréstimos junto à instituição financeira controlada pela União, nas condições provadas no processo, tipifica crime de responsabilidade?
2) A abertura de créditos sem autorização do Congresso Nacional, nas condições provadas no processo, tipifica crime de responsabilidade?
Se a resposta às perguntas for negativa, o presidente da sessão de julgamento promulga o resultado, o processo será extinto e arquivado. Se a resposta for positiva, ainda que seja a uma só das perguntas, o questionamento prosseguirá.

3) Considerando o que foi apurado na instrução processual, a ré praticou as ações referidas nos quesitos anteriores?
Se a resposta for negativa, a ré será absolvida, o presidente promulga o resultado, o processo será extinto e arquivado. Se a resposta for positiva, o questionamento prosseguirá.

4) A conduta da ré foi dolosa?
Se a resposta for negativa, a ré será absolvida, o presidente promulga o resultado, o processo será extinto e arquivado. Se a resposta for positiva, o questionamento prosseguirá.

5) A pena cominada ao crime de responsabilidade (perda do cargo e inabilitação para o exercício de função pública) deve ser aplicada à ré?
Se a resposta for negativa, a ré voltará à função (decisão política). Se a resposta for positiva, a ré perderá o cargo. Ambas as hipóteses implicam a extinção do processo com resolução do mérito. O presidente promulga o resultado e arquiva o processo.

A falta desta mínima sequência de quesitos no caso concreto contraria regra da lógica e implica violação da lei e das garantias constitucionais da acusada.
Considerando a supremacia do princípio constitucional do devido processo jurídico na sua dupla dimensão formal e material, vícios formais e/ou materiais no processo de impeachment poderão ser sanados tanto pelo tribunal parlamentar como pelo tribunal judiciário.

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