sábado, 9 de abril de 2016

PRIMITIVISMO



O planeta Terra é uma esfera física a girar em torno do seu próprio e imaginário eixo circundada por gases que lhe dão cor azulada enquanto traça uma elipse no espaço sideral ao contornar o Sol. Na história natural desse planeta, quando reunidas favoráveis condições climáticas, químicas e físicas, tem início o processo biológico formador dos reinos vegetal e animal. A espécie humana se desenvolve no reino animal pelo pensar, pelo sentir, pelo querer e pelo agir. Dessas funções resulta o mundo da cultura, desde a barbárie até a civilização, encravado no mundo da natureza. Nota-se a exuberância da vida nas frestas do cimento que segura as encostas nas estradas e do calçamento das ruas nas cidades, através das quais brota vegetação.
Neste planeta, a humanidade vê infinitas possibilidades, mas cada humano, indiferente dos hemisférios e da latitude em que se encontre, tem possibilidades limitadas. Algumas pessoas têm mais possibilidades do que outras. O ambiente cultural em que o indivíduo vive, desde a comunidade tribal até a sociedade civilizada, enseja ocasiões para, em maior ou menor extensão, fazer ou não fazer alguma coisa, possuir, crer, expressar sua vontade, pensamento e sentimento.
No mundo civilizado, o sujeito pode ser cientista, professor, sacerdote, estadista, artista, piloto. Entretanto, pode viver e morrer sem dedicar-se à ciência, ao magistério, à religião, à política, à arte, ao esporte. Por motivos diversos, o sujeito frustra total ou parcialmente as suas potencialidades. 
Na vida política, direita e esquerda correspondem a hemiplégicas concepções do mundo. A síntese dialética que empolgue a mente, enterneça o coração e estimule a vontade, poderá ensejar um promissor projeto de vida coletiva. Talvez, essa desejável construção implique nova hierarquia dos valores de modo que o econômico não prevaleça sobre o social e o político. Pesagem difícil do que foi e do que é melhor e pior na vida de cada indivíduo e de cada nação. O mal parece pesar mais do que o bem; o negativo parece pesar mais do que o positivo. Percebida como um mal no presente, a crise que acontece no processo histórico pode se revelar um bem no futuro. Na história da humanidade, as crises integram a dinâmica de avanços e recuos intermitentes.  
No Brasil, neste século XXI, grande parcela da população exibe um selvagem e primitivo comportamento. Em 2013, na cidade de São Paulo, jovens ocuparam as ruas mostrando descontentamento, sem nada definir, sem projeto algum, apenas com o propósito de agitar, tendo como pretexto o preço da passagem dos transportes urbanos. Seguiram-se outras manifestações de rua em 2014, 2015 e 2016, algumas contra e outras a favor do governo, da democracia e do patrimônio nacional. 
O solo brasileiro foi varrido por um vendaval de farsas, mentiras e opiniões contraditórias. Nota-se o retrocesso cultural. O verniz da civilização apresenta fissuras. A substância asquerosa que estava oculta saiu pelos vãos. O que era embrionário irrompeu como vulcão na comunidade nacional. Diferenças de origem, de raça, de cor, de nível social, de doutrina, passaram ao campo da intolerância numa irracional discriminação e num preconceito explícito.
O ódio e a violência nas cidades brasileiras assemelham-se ao que ocorreu nas primeiras décadas do século XX na Europa, quando despontaram o bolchevismo, o fascismo e o nazismo. Ofensas físicas e morais substituem o diálogo. Prisões, detenções e interrogatórios são efetivados ao arrepio da lei e da Constituição. A grei emergente não quer ouvir, só quer falar e agir ao seu talante. A paixão obscurece a razão e esteriliza os bons costumes. A lupa da ignorância e da má-fé aumenta artificiosa e psicologicamente a crise. Lideranças desonestas incentivam o movimento antidemocrático para minar a estabilidade do governo brasileiro. Com isto, pretendem assumir a direção do Estado a fim de atender aos interesses do governo estadunidense e das empresas estrangeiras e cortar ou enfraquecer as relações do Brasil com a Rússia, Índia, China e África do Sul.  
Na trilha de um avanço científico, de um progresso tecnológico, de uma economia bem situada no contexto internacional, de uma boa política externa, de uma ascensão social e econômica da camada pobre da população, surgem bárbaros que se aproveitam apenas dos bens materiais gerados pela civilização (automóvel, avião, televisão, computador, medicamentos, espaçosas construções, aparelhos para conforto e segurança) sem considerar os princípios morais, jurídicos, científicos e filosóficos que os tornaram possível. Pessoas aproveitadoras, predadoras, que encaram os bons frutos do processo histórico como se fossem gerados pela natureza e não pelo trabalho intelectual e técnico de alguns seres humanos que se destacaram pela excelência.
Quem não se identifica com pessoas desse tipo emergente é fustigado. Surge, então, o problema de lidar com esses emergentes que se arrogam o direito de: (1) exibir a face demoníaca da sua personalidade; (2) impor essa feição aos outros.          
Este assustador tipo emergente, comum no Brasil contemporâneo, fecha-se nas suas poucas e padronizadas idéias. O intelecto hermético não se deixa penetrar por novas idéias, por alheias razões e por sentimentos do próximo. Amor e compaixão evaporaram-se no calor das paixões como a neblina matinal evapora sob o calor do sol.
A outra parcela da população procura as igrejas, os templos de adoração mística, os santuários da natureza, as entidades solidárias, as bibliotecas, os museus, as exposições de arte, os institutos de pesquisa, ciência e tecnologia, os caminhos do bem e da fraternidade.
Ainda restam pessoas na busca pacífica da compreensão de si mesmas e do mundo em que vivem. Embora cônscias de pertencer à minoria, elas estudam, oram, meditam e agem na firme convicção da existência de uma superior dimensão metafísica diante da qual a história da humanidade é um breve momento da evolução cósmica.

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