sábado, 16 de abril de 2016

BORRASCA



A crise política artificialmente criada pelos partidos vencidos nas eleições de 2014, apoiados por banqueiros, industriais, comerciantes, empreiteiros, fazendeiros das regiões sul e centro-oeste, por emissoras de televisão, por autoridades públicas (inclusive magistrados), por empresas petroleiras e pelo governo dos EUA, revelou ao País e ao mundo a existência de homens, mulheres, famílias, que não se importam com o bem-estar dos brasileiros, não têm interesse em preservar o patrimônio nacional, em manter vivas as instituições democráticas, em viver de modo fraterno, solidário, sem preconceito, como reza o preâmbulo da Constituição da República. 
Esses indivíduos e grupamentos importam-se apenas com seu próprio bem-estar, com a sua fortuna, com seus negócios e projetos particulares. Atiçaram a massa popular contra um governo legítimo e os partidos que o apóiam. Estimularam o ódio e a violência entre os concidadãos. Provocaram a reação da parcela do povo contrária ao movimento golpista. Dividiram a nação brasileira: uma parte a favor da oligarquia e do impeachment; outra parte a favor da democracia e contra o impeachment. Facilitaram ofensas físicas e morais, despertaram forças irracionais na população que podem causar confrontos armados e todas as suas funestas conseqüências.
A temperatura sobe cada vez mais no clima social e político brasileiro à medida que avançam os trâmites do impeachment. O parecer da Comissão Especial favorável ao impeachment segue para o plenário da Câmara dos Deputados. A ação será arquivada se não obtiver votos suficientes. A ação prosseguirá se obtiver, no mínimo, 2/3 dos votos. Nesta hipótese, os autos serão enviados ao Senado e os senadores decidirão se instauram ou não o processo.   
Apátridas, vendilhões da soberania nacional, pouco se importam com os efeitos destrutivos das suas manobras e da execução dos planos que arquitetaram. Querem a Presidente fora do governo porque ela representa tudo o que eles não são: honesta, não se aproveitou do cargo para enriquecer, ciosa do patrimônio público e da moralidade no serviço público, sensível à camada pobre da população, caráter de boa cepa, forte personalidade, corajosa, lutou bravamente contra a ditadura.
Persistentes e imorais, esses indivíduos e grupamentos pretendem assumir o governo para dele se servirem a fim de realizar seus objetivos, entre os quais se destacam: (1) revogar direitos sociais da população; (2) alienar riquezas nacionais (petróleo, minérios) em troca de gordas comissões; (3) permitir maior expansão do capital especulativo em detrimento do capital produtivo; (4) cortar ou debilitar as relações entre o Brasil, a Rússia, a Índia, a China e a África do Sul e voltar às subservientes relações com os EUA. [Ao ver ameaçada a sua hegemonia econômica e militar no planeta e, principalmente, no seu quintal (América Latina), o governo estadunidense reage no sentido de romper os acordos celebrados entre aqueles países ou enfraquecer as mútuas relações; para tanto, distribui dólares aos políticos nativos, quando não usa o seu aparato bélico].   
Parcela dessa canalha tem mandato parlamentar e atua no Congresso Nacional a favor do impeachment da Presidente da República. Usam de falsidades e manobras regimentais para facilitar a aprovação, pelo plenário da Câmara, do parecer da Comissão Especial. Ações propostas perante o Supremo Tribunal Federal (STF) contra os procedimentos na Câmara colocam juízes e juízas numa saia justa ante o princípio da independência e harmonia entre os poderes da República. Os juízes e juízas são obrigados a intervir tendo em vista: (1) a supremacia da Constituição da República no âmbito nacional; (2) o papel do STF de Guardião da Constituição; (3) o mecanismo de freios e contrapesos inerente ao constitucionalismo brasileiro; (4) o controle da constitucionalidade das leis.      
O Brasil, desde outubro de 1988, se define como um Estado Democrático de Direito que adotou a forma republicana, federativa e presidencialista. A igualdade de todos é dogma democrático. A responsabilidade de governantes e governados é dogma republicano. A união indissolúvel dos Estados, Municípios e Distrito Federal é dogma federativo. O acúmulo das chefias de Estado e de Governo num único órgão é dogma presidencialista. Este arcabouço constitucional desmoronará se o impeachment for aprovado nas circunstâncias que evidenciam golpe de Estado.
A acusação contra a Presidente (Chefe de Estado e de Governo) é leviana, artificiosa, sem lastro em fatos que tipifiquem crime de responsabilidade. O devido processo legal não vem sendo obedecido, o que é inadmissível num Estado Democrático de Direito. Há duas ações em trâmites pela Câmara, uma contra a Presidente, outra contra o Vice-Presidente, ambas fundadas no mesmo pedido e na mesma causa de pedir, portanto, conexas, segundo a processualística penal e civil vigente no Brasil, cujas regras são aplicáveis ao processo parlamentar, ao processo administrativo e ao processo judiciário. Ambas as ações devem ser reunidas e julgadas em conjunto para evitar decisões conflitantes. A Comissão Especial está preventa. Não há necessidade de formar nova comissão. Nada disto está sendo observado. Sem previsão legal, os acusadores aditaram a denuncia perante a Comissão Especial quando a denunciada já havia apresentado defesa escrita. Sobre o esdrúxulo aditamento foi negado à denunciada o direito de se manifestar. Além disto, o critério de votação nominal fixado desrespeitou a alternância individual entre deputados do norte e do sul.     
No mecanismo de freios e contrapesos entre os poderes da República, o STF não dita regras ao Legislativo, apenas corrige ou anula atos normativos e procedimentos contrários às regras constitucionais e processuais. Na ausência de regras regimentais, ou quando estas forem omissas, incidem as regras da legislação ordinária. A interpretação autêntica das normas regimentais feita pelos parlamentares deve estar em sintonia com o ordenamento constitucional e infraconstitucional, sem casuísmos. Se a interpretação autêntica estiver desajustada, cabe ao STF dar a interpretação conforme a Constituição e assim pacificar a situação excluindo qualquer outra interpretação. 
O STF tem escrúpulos excessivos no que tange ao afastamento do atual presidente da Câmara dos Deputados. Se no cargo estivesse um Ulysses Guimarães, até seria compreensível a excessiva deferência. Acontece que atualmente o cargo está ocupado por um Fernandinho Beira-Mar! Que especial deferência merece tal sujeito? O Procurador-Geral da República pediu o afastamento do delinqüente. Compreensível a cautela dos juízes e juízas do STF, diante do princípio da separação dos poderes, ao examinarem o requerimento do Procurador-Geral. Todavia, quando essa cautela é excessiva, adentra-se o terreno da condescendência. A especial deferência a um meliante assume as cores da pusilanimidade. A demora dos juízes em expulsar o pilantra, beira à frouxidão.  
Por sua ficha suja, o presidente da Câmara merece ter o seu mandato parlamentar cassado. A Constituição da República considera a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, a vida pregressa limpa, valores dignos de proteção contra: (1) a influência do poder econômico; (2) o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta. Se assim é para o candidato ao cargo público eletivo, com maior razão sê-lo-á para quem já o exerce. O deputado em tela não tem moral para exercer a presidência da Casa e nem tampouco para exercer o mandato parlamentar. Ainda que interinamente, ele poderá ocupar a Presidência da República ao vagar os cargos de Presidente e Vice-Presidente. Para afastá-lo e cassar o mandato não é necessária ousadia dos canalhas. Bastam aos juízes e juízas virtudes próprias de pessoas moralmente valorosas: independência, honestidade, serenidade, urbanidade, pontualidade, eficiência, coragem, caráter sem jaça, boa conduta na família e na sociedade.  

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