Roma (continuação).
Marco Aurélio, romano, adotado
por seu tio Antonino Pio (um dos mais ilustres e esclarecidos imperadores de
Roma), sucedeu o tio no trono romano, passou o resto da vida a serviço do
império (121 a
180). Os cristãos perturbavam a ordem vigente e desafiavam a autoridade romana
ao rejeitarem a religião oficial e se negarem a cumprir a lei. Marco Aurélio
teve de enfrentá-los. As reflexões filosóficas nas “Meditações” desse imperador
revelam a sua ética. Na opinião dele, cabe ao homem, enquanto criatura social,
desempenhar a sua parte no corpo político. Como se falasse a si próprio, Marco
Aurélio referia-se à necessidade de cautela a fim de não se “cesarizar”, como
acontecia com alguns governantes. Arrolava os deveres de quem exerce autoridade:
preservar-se simples, bondoso, piedoso, afetuoso, puro, grave, sem afetação,
sem pompas, amigo da justiça, firme no cumprimento da sua função. Marco Aurélio
fazia o que aos outros aconselhava. Dispondo de poder, riqueza, conforto,
deitava-se no chão, privava-se de toda comodidade e observava uma dieta frugal.
Para ilustrar seu pensamento, o imperador pergunta: o que são Alexandre, César
e Pompeu se comparados a Diógenes, Heráclito e Sócrates? “Estes viram as coisas, suas causas, sua matéria, e tais conhecimentos
eram os seus guias; naqueles, porém, a ignorância de quantos fatos! A sujeição
a quantos amos!” A corte real era, para Marco Aurélio, sua madrasta,
enquanto a filosofia era sua mãe, o seu regaço. Os homens nascem uns para os
outros, devem cooperar entre si e visar a um propósito social {ao bem comum}. A
bondade é invencível se for verdadeira, sem disfarce, sem fingimento. O
imperador distingue duas cidades, a pequena e a grande, ao dizer: “Como um Antonino, minha cidade e minha
pátria é Roma; como homem, o mundo. Logo,
só é um bem para mim o que for útil a essas cidades”.
Lucrécio foi o expoente do
epicurismo em Roma (98 a
55 a.C.).
Autor de um poema didático intitulado “Da Natureza das Coisas”, procura
libertar o homem do medo do sobrenatural. Tudo é produto da evolução mecânica,
inclusive as coisas humanas, sem interferência de deuses. Nenhuma parte do ser
humano, física ou espiritual, sobrevive à morte orgânica. Mais do que prazer, o
que o homem realmente necessita é de “paz e de um coração puro.” Cumpre
distinguir o útil do nocivo. O prazer pode ser nocivo e a dor pode ser útil. A
justiça implica o pacto entre as pessoas ou entre os povos de não se
prejudicarem mutuamente {consenso em torno da convivência e da coexistência
pacíficas}. Injusta é a lei que não se mostra útil nas relações sociais.
Os romanos eram homens de ação e
pouco se dedicavam à especulação. Tal característica influiu para o menor
sucesso do epicurismo. Negativista e individualista, repudiando a idéia de
qualquer finalidade do universo e de qualquer valor do esforço humano, o
epicurismo não casava bem com o temperamento romano, salvo nos períodos de
decadência. A última fase da civilização romana caracterizou-se pelo declínio
moral (284 a
476). O terreno ficou propício às filosofias místicas produzidas na Alexandria,
ponto de encontro entre a cultura do oriente e a cultura do ocidente, onde se
misturavam preceitos religiosos do Egito, da Babilônia, da Pérsia, da Palestina
e da seita cristã. Este amálgama de doutrinas recebeu o nome de filosofia
neoplatônica. Segundo esse novo movimento, tudo o que existe procede de deus
numa corrente contínua de emanações. A primeira emanação é da alma do mundo.
Seguem-se: as idéias divinas (formas espirituais), as almas das coisas
particulares e a matéria privada de espírito. A matéria deve ser desprezada
como manifestação do mal.
Plotino, egípcio que viveu em
Alexandria, foi o grande mestre do neoplatonismo (204 a 270). Lecionou em Roma
e teve adeptos que pertenciam à camada alta da sociedade. O tom geral da sua Enéades é platônico. Apesar da oposição
ao intelectualismo e da indiferença ante o estado, a doutrina de Plotino teve
aceitação a ponto de ameaçar a supremacia do estoicismo. A desordem e a
perplexidade coletiva da época contribuíram para a visão transcendental que
encara como miragem o mundo material. Ele foi autor da teoria da trindade: uno
+ nous + alma. Cada elemento da
trindade situa-se em nível diferente. O uno
consiste no bem, superior ao ser, onipresente e em lugar algum,
indefinível e difuso. O nous é
emanação do uno. O uno é como o sol; o nous é como a luz solar. O homem pode conhecer nous se exercitar a mente em direção oposta aos sentidos. Chegando
ao nous, o homem chega a deus. A alma é essência eterna derivada do nous e criadora da natureza. Ela tende a
se fundir com nous e a perder sua
personalidade sem, entretanto, perder a identidade. Plotino admite a beleza e a
bondade da natureza, ao contrário dos outros filósofos do neoplatonismo que,
arraigados no sobrenatural, desprezavam o mundo natural e amaldiçoavam a beleza
e o prazer como coisas nocivas {pecaminosas,
na linguagem cristã}.
Orígenes, cristão da mesma escola
de Plotino, também elaborou uma teoria da trindade. De acordo com esta teoria,
deus é incorpóreo em suas três partes. Cada parte tem um nível diferente. A
alma é independente do corpo e neste penetra por ocasião do nascimento. No fim
dos tempos todos serão salvos. A igreja condenou Orígenes por heresia. Depois
de Plotino, a igreja cristã encampou a filosofia no ocidente. Entre a queda de
Roma e o final da idade média, a filosofia esteve sob o patrocínio e a direção
da igreja.
O misticismo ganhou a simpatia das camadas sociais
menos favorecidas pela fortuna. Os filósofos místicos ensinavam que o homem era
parte de deus, mas dele separou-se ao se unir à matéria. Destarte, para o
homem, o mais elevado objetivo da vida é o de restabelecer a união com deus.
Para tanto, o homem deve se dedicar à vida contemplativa e libertar sua alma da
condição de escrava da matéria; envergonhar-se do seu corpo físico; subjuga-lo
de qualquer modo possível. A conduta ascética é comum aos místicos.
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