sexta-feira, 18 de abril de 2008

Decoro parlamentar

Decoro significa beleza ética resultante do ajuste da conduta à honestidade, ao pudor e aos bons costumes. Na compreensão do decoro entram as idéias de nobreza e honradez como atributos da personalidade e do ambiente humano. Decoro parlamentar significa (i) a imagem virtuosa de decência, pudor e honestidade que se exige de quem exerce mandato para legislar em nome do povo (ii) atmosfera de nobreza e honradez no âmbito do Poder Legislativo. O parlamentar que se conduz de modo indecoroso fica sujeito à perda do mandato, após o devido processo legal (CF, 55, II; 5º, LIV).

A ação humana, por ser teleológica, implica procedimentos racionais adequados ao objetivo a que se determinou o agente. Em seu conjunto, esses procedimentos, logicamente ordenados a um fim, definem o processo ou o método. Cultivar o solo, produzir medicamento, resolver litígio e outras atividades similares, implicam um processo. Quando o objetivo é solucionar controvérsias pela intervenção de terceiro (árbitro, juiz), além da aptidão física e mental, o terceiro necessita de poder, ou seja, de competência para, em sintonia com a moral e o direito, submeter vontade alheia à própria. Atinge-se tal objetivo mediante um processo cujas regras são fixadas pelos interessados e pelas instituições públicas ou privadas. As regras processuais para solução de controvérsias no âmbito judicial, administrativo ou parlamentar estão contidas na Constituição, nas leis, nos regulamentos, nos regimentos internos e nos costumes. Essas regras assentam-se no princípio do devido processo que, por sua vez, deriva da juridicidade inerente ao Estado de Direito. Esse princípio implica (i) contraditório, ampla defesa, juiz natural (órgão julgador de caráter universal criado por lei) (ii) separação das funções de acusador, defensor e julgador (iii) procedimentos de postulação, produção de provas e julgamento. Nisto consiste o devido processo para solução de controvérsias no âmbito do Judiciário, do Executivo e do Legislativo.

Na decisão final, após o encerramento da instrução, reside a diferença específica entre o processo judicial, o processo administrativo e o processo parlamentar. Na esfera judiciária, a decisão privilegia o aspecto jurídico da questão, em sintonia com a prova produzida e o interesse da sociedade. Na esfera administrativa, a decisão privilegia o aspecto estritamente legal da questão, em sintonia com a prova produzida e o interesse da administração pública. Na esfera parlamentar, a decisão privilegia o aspecto político da questão, na busca da solução mais conveniente e oportuna, ainda que contrária à prova dos autos, desde que atenda aos superiores interesses do Estado. Na ponderação política, os critérios de utilidade e de necessidade podem prevalecer sobre o critério de justiça. Embora provadas a autoria, a materialidade e a culpa, em processo por ilícito que acarreta perda do cargo, a decisão poderá manter o Presidente da República no cargo, ante a perspectiva concreta de, naquele momento, a sanção trazer mais malefício do que benefício ao Estado. A pena, então, deixa de ser aplicada. O processo, porém, terá eficácia positiva, pois, além da sua função pedagógica e dos seus efeitos morais, poderá gerar ou instruir procedimentos civis e penais no âmbito do Poder Judiciário.

O processo por falta de decoro parlamentar segue as regras do ordenamento jurídico, entre as quais, a do impedimento da autoridade que é parte no processo. O Presidente da República fica suspenso de suas funções enquanto dura o processo do qual pode resultar a perda do seu mandato (CF, 86, 1º). O seu afastamento imediato, pelo prazo máximo de 180 dias, constitui imperativo ético e jurídico. Se for provocado, o Supremo Tribunal Federal verificará o cumprimento ou descumprimento das regras processuais e decidirá manter ou anular o processo. Os eleitores, titulares da soberania, por sua vez, poderão se insurgir contra o mérito da decisão do Senado, se contrário aos interesses da Nação.

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