domingo, 30 de julho de 2023

ANIMAIS SELVAGENS II

Com recente emenda, o último parágrafo do artigo intitulado “Animais Selvagens”, publicado neste blog em 23/07/2023, ficou assim redigido:
O senso comum do presidente da república comparou aqueles ofensores aos animais selvagens. Biologicamente, os humanos são animais sem qualquer semelhança com o amoroso e misericordioso deus dos cristãos (Pai Celestial) embora muito parecidos com o cruel e genocida deus dos judeus (Javé). A qualificação de “selvagem” afasta do humano a racionalidade e faz emergir a herança atávica do homem da Idade da Pedra. 
Animais selvagens não podem circular livremente no meio de pessoas civilizadas. Urge colocá-los em jaula. Quando se fala no extermínio dessa espécie animal sobrevivida do período pré-civilizado da evolução humana, fala-se da extinção no sentido moral e não no sentido físico. Cogita-se de medidas preventivas e repressivas sintonizadas (i) com o direito de proteger a vida e a integridade das pessoas e das instituições democráticas e (ii) com o fim político de assegurar o pleno vigor da Constituição da República
Convém complementar esse texto. Lê-se no Gênesis, primeiro livro da Bíblia: “Disse também Deus: Façamos o homem à nossa imagem e semelhança”... “E criou Deus o homem à sua imagem; fê-lo à imagem de Deus e criou-os macho e fêmea”... “O Senhor Deus formou, pois, o homem do barro da terra e inspirou-lhe nas narinas um sopro de vida e o homem se tornou um ser vivente”. 
Se esses versículos fossem a expressão da verdade, então, Deus seria um indivíduo feio, ignorante, instável, inseguro, criador de um mundo caótico. Nessa hipótese, a divergência entre Albert Einstein e Max Born resolver-se-ia a favor deste último e de seus colegas defensores da mecânica quântica e da matemática do caos. Além de jogar dados, Deus também apostaria na roleta. 
O primeiro tipo humano “feito à imagem e semelhança de deus” era um homem feio, ignorante, instável, inseguro, que andava como barata tonta na superfície terrestre. O primeiro homem pode ter sido o de Java (Pithecanthropus Erectus) ou o de Pequim (Sinanthropus Pekingensis) ou o de Piltdown  (Eoanthropus Dawsoni). Todos esses exemplares viveram no primeiro período da evolução humana (Eolítico). Esses tipos eram feios, ignorantes, nômades, semelhantes aos macacos na postura e na estrutura física. Portanto, naquele período, a imagem do homem e a imagem de deus coincidiam com a imagem do macaco. 
No período seguinte (Paleolítico Inferior) viveram dois tipos: o homem de Heidelberg e o homem de Neandertal. Ambos tinham características simiescas embora fossem do gênero homo mais hábil e inteligente do que os tipos que o antecederam. Portanto, nesse período, a imagem de deus nada melhorou do ponto de vista estético; ainda lembrava a imagem do macaco. 
No período seguinte (Paleolítico Superior) predominou o gênero homo sapiens, mais industrioso, sociável e de maior capacidade craniana do que os tipos anteriores. Esteticamente, a imagem de deus melhorou, conformando-se à imagem do novo homem. 
O período seguinte (Neolítico) foi o último da fase pré-civilizada da cultura humana. Tipo humano ereto, fisicamente proporcionado, senhor do mais amplo e intuitivo conhecimento da natureza, relações sociais complexas, novas técnicas e alargamento das artes. Nesse período, ocorre a deificação de forças sobrenaturais (espíritos poderosos). Nascem os deuses e a religião entre os demais elementos constituintes da organização da cidade (início da civilização). Melhora a imagem do deus bíblico. 
Rompendo com o politeísmo e respectivos sacerdotes, o faraó Amenhotep IV (Aquenaton) fundou o monoteísmo. Após a morte desse faraó, o politeísmo foi restabelecido no Egito, porém, o monoteísmo sobreviveu no povo hebreu que lá vivia há 450 anos. O príncipe egípcio chamado Moisés garantiu tal sobrevivência ao impor, a fio de espada, essa religião aos hebreus. Dos cinco primeiros livros da Bíblia (Pentateuco), todos escritos no século IV a.C., por Esdras, sacerdote judeu e sua equipe, durante o exílio na Babilônia, verifica-se que o deus de Moisés, apelidado Javé ou Jeová, era machista, exclusivista, cruel, vingativo, genocida. Na versão desses eruditos e espertos escritores bíblicos, Javé criou o homem do limbo da terra à sua imagem e semelhança. Certamente, os escritores referiam-se ao homem hebreu do povo “escolhido” e da terra “prometida”. Destarte, esse homem teria a imagem característica do seu deus Javé: machista, exclusivista, cruel, vingativo, genocida.
Assim como a criatura humana evoluiu da fase bruta à fase civilizada no curso de milhões de anos, o criador divino mencionado na escritura hebraica também evoluiu. Ele se tornou menos feio, mais inteligente e bem postado, pacientemente lapidado pelos sacerdotes monoteístas, tal como se faz com o diamante bruto. Da fase selvagem, o deus evoluiu para a fase civilizada. Nesta, a têmpera diabólica de Javé, deus do Antigo Testamento, foi substituída pela amorosa têmpera do Pai Celestial, deus do Novo Testamento. Alá, deus dos muçulmanos, nasceu da costela de Javé.
Apesar das falsidades e superstições nelas contidas, as escrituras das religiões monoteístas são colocadas por seus crentes acima dos tratados científicos do mundo contemporâneo. Fé religiosa empanando o saber científico. Prevalência da estupidez sobre a inteligência. Treva oculta a luz, como a nuvem oculta o sol. 
No mundo da cultura há progressões e regressões. Ativo processo das mutações para melhor e para pior no curso da história humana. Personalidades representativas e celebridades têm suas imagens retocadas nesse processo. Sirva de exemplo a ocidentalizada imagem de Jesus, profeta israelita. Desde a obra de Leonardo da Vinci, a imagem do profeta distanciou-se das características étnicas dos judeus e israelitas. Na Europa e na América, o profeta, cuja real fisionomia é desconhecida, não é retratado de cabelos curtos, nariz adunco, estatura mediana, atarracado, de cenho franzido ao escorraçar pessoas do templo. Em pinturas, esculturas e gravuras, Jesus ostenta beleza de causar inveja aos galãs de Hollywood como Clark Gable, Errol Flynn, Tyrone Power e outros. A imagem hollywoodiana de Jesus encanta as mulheres, freiras ou não, e nelas provoca suspiros e fantasias. 
Protágoras tinha razão: “O homem é a medida de todas as coisas”. 

Bíblia Sagrada. Antigo Testamento. Gênesis 01: 26/27. Rio. Edição Barsa. 1967.
Bíblia Sagrada. Antigo Testamento. Gênesis 02: 7. SP. Editora Ave Maria. 1987.  
Burns, Edward McNall. História da Civilização Ocidental. Rio. Editora Globo. 1955.  
Chardin, Pierre Teilhard de. O Fenómeno Humano. Portugal/Porto. Tavares Martins.  1970. 
Mahfuz, Naguib. Akhenaton. O Rei Herege. Rio/SP. Editora Record. 2005.
Stewart, Ian. Será que Deus Joga Dados? Rio. Jorge Zahar. 1991. 
Velasco, Francisco Diez. Breve Historia de las Religiones. Madri. Alianza Editorial. 2008. 

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