quarta-feira, 27 de abril de 2022

FORÇAS ARMADAS + VIAGRA + INDULTO

Ministro do supremo tribunal, num evento internacional, referiu-se às forças armadas brasileiras na forma interrogativa e de modo incerto, como se ele mesmo não acreditasse que elas se curvassem a orientações. Apesar de essa referência nada ter de ofensiva, o vice-presidente da república assim não entendeu e a recriminou dizendo que as forças armadas não são crianças para receberem orientações. Solidário à reprimenda, o ministro da defesa expediu nota exaltando as virtudes e os deveres das forças armadas. 
Os generais e oficiais superiores têm se mostrado melindrosos, exibindo sensibilidade excessiva que não combina com a antiga e tradicional postura varonil do soldado brasileiro. 
Que as forças armadas não são crianças, concordamos. Se crianças fossem, não teriam adquirido grande quantidade de Viagra. Trata-se de remédio para a disfunção erétil, certamente para os generais e oficiais superiores, posto que os de menor patente e praças, mais jovens, não necessitam desse fortificante. O civil adquire o remédio com seu próprio dinheiro; o militar, com o dinheiro do erário. 
Que as forças armadas não precisam de orientação, discordamos. Elas têm chefe a quem devem obediência. O princípio da hierarquia e disciplina exige obediência ao comando do chefe. Nos termos da vigente Constituição, o presidente da república é o comandante supremo das forças armadas. Os ministros de estado (civis e militares) são seus auxiliares e lhe devem obediência. Obrigatoriamente, ações das forças armadas e pronunciamentos dos seus comandantes seguem as orientações dadas pelo presidente. Facultativamente, elas seguem orientações dadas pelo governo dos EUA, quando ministro da defesa, ou oficial general, atende convocação para lá se reunir com autoridades estadunidenses, mesmo em época de eleições.   
Tal como a desobediência civil, a desobediência militar também pode ser necessária e legítima. As orientações emanadas da presidência da república, ou, do governo dos EUA, devem se ajustar aos princípios e valores da Constituição da República Federativa do Brasil. Assim, por exemplo, válida será a resistência das forças armadas se o presidente pretender utilizá-las como base de sustentação de um regime antidemocrático, ou, para tarefas próprias da polícia civil. A defesa da lei e da ordem cabe-lhes excepcionalmente, por iniciativa de qualquer dos poderes da república. Compete-lhes, principalmente, defender a pátria e garantir os poderes constitucionais (legislativo, executivo e judiciário).  
No que tange ao indulto do deputado federal, o decreto publicado no “Dia de Tiradentes”, herói da Inconfidência Mineira, contém vícios insanáveis. A escolha desse dia para decretar o indulto foi um deboche. Salienta a malícia e a falta de autêntico patriotismo do presidente. Todavia, há semelhança entre os dois casos. Tiradentes era criminoso aos olhos da justiça portuguesa; o deputado é criminoso aos olhos da justiça brasileira. 
A concessão do indulto cabe privativamente ao presidente da república. Competência privativa não significa poder absoluto. Há limites temporais, morais e jurídicos ao exercício do poder de clemência. Exemplo de limite temporal: o indulto não pode ser concedido antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória tendo em vista a constitucional presunção de inocência: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Destarte, o deputado ainda não pode ser considerado culpado. O indulto pressupõe culpa reconhecida em sentença judicial e prisão parcialmente executada. A pena aplicada ao réu ainda não pode ser executada. Ausentes, pois, as condições básicas à concessão do benefício. 
O indulto também não pode ser concedido por compadrio, nem tampouco a quem praticou crime contra o estado democrático de direito, ou, qualquer crime imprescritível, inafiançável ou hediondo. A concessão deve ser impessoal, motivada pelo real merecimento do sentenciado avaliado pelo tempo de pena já cumprido, pelo bom comportamento nesse período e outros fatores humanitários. 
Ao conceder o indulto, o presidente da república deve respeitar o poder jurisdicional do tribunal. O chefe de governo, sob pena de violar o princípio da separação dos poderes, não pode cassar a decisão judicial. O poder de clemência permite a atenuação do rigor da pena aplicada, mas não a sua extinção. Depois de cumprida parcialmente, a pena poderá ser reduzida ou substituída por indulgência do presidente. O decreto presidencial não é lei e sim ato político e administrativo restrito à função regulamentar do executivo no que tange à normatividade. Por isto mesmo, o presidente não está obrigado a seguir regras estabelecidas por decretos presidenciais anteriores concessivos de indultos. Desde que obedeça às normas éticas e jurídicas em vigor, o presidente pode estabelecer as suas próprias regras pelas quais o indulto deve ser efetivado. A vigência do decreto se esgota com a liberdade do sentenciado. 
Constituição da República. Artigos: 1º + 2º + 5º XLII, LVII + 84 II, XIII + 142.

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