quarta-feira, 7 de outubro de 2020

O PRESIDENTE E O STF

Honestidade, lealdade, bondade, verdade, justiça, compostura, decência, honra, são valores cada vez mais ausentes nas relações humanas do mundo contemporâneo, embora presentes nos códigos civis, militares e religiosos dos diversos países. Evidenciam esse fato os conteúdos publicados nos meios de comunicação social, inclusive redes de computadores, a falta de boa educação, a licenciosidade, a agressividade, violência sexual, uso ilícito de drogas, ódio, assassinato, genocídio, desrespeito à soberania e à autodeterminação dos povos, testemunhados na rua, no estádio, no clube, no lar, na escola, na empresa, no governo, na esfera internacional. Nas relações econômicas capitalistas a moral e o espírito humanitário são descartados; imperam o individualismo possessivo e a competição selvagem. 

Dentro de tal cenário, neste mês de outubro, abrir-se-á vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) decorrente da aposentadoria do ministro Celso de Mello. O respectivo preenchimento obedece a uma complexa tramitação (órgãos diferentes para o mesmo ato). O presidente da república indica brasileiro nato, com mais de 35 e menos de 65 anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada. O cidadão indicado poderá ser: [i] advogado particular [ii] advogado público (membro da defensoria pública, procurador de entes públicos administrativos) [iii] agente do ministério público [iv] magistrado [v] do sexo feminino ou masculino, homossexual ou heterossexual [vi] solteiro, casado, amigado, separado, divorciado, viúvo [vii] do centro, da esquerda, da direita, filiado ou não a partido político [viii] rico ou remediado [ix] católico, protestante, espírita, judeu, muçulmano, budista ou de qualquer outra crença religiosa, desde que compatível com a lei e os bons costumes.

A liberdade religiosa deve conviver com a laicidade do estado. A nação brasileira é religiosa, porém, o estado brasileiro é laico. Isto significa inexistência de religião oficial, refração ao fundamentalismo religioso e inconstitucionalidade de símbolos e rituais religiosos nas repartições públicas, no Legislativo, Executivo e Judiciário. 

Para obter a indicação, os aspirantes organizam suas campanhas à semelhança do que ocorre na disputa por cargos públicos eletivos do Legislativo e do Executivo. Os aspirantes procuram aproximar-se do presidente da república e agrada-lo; fazem romaria pelos gabinetes de ministros de estado, principalmente do ministro da justiça; procuram apoio (i) de parlamentares simpáticos ao chefe de governo (ii) de jornalistas (iii) de sócios de emissoras de televisão (iv) de empresários e banqueiros (v) de órgãos classistas. Em suma, apelam ao tráfico de influência. 

Ao ser interpelado por um senador tucano durante a sabatina, Luiz Edson Fachin admitiu ter contratado agência publicitária para fazer sua campanha. Justificou-se dizendo que fora instruído a assim proceder para ter alguma chance de sucesso. Luiz Fux, em espontânea manifestação, admitiu ter feito campanha para ser indicado. Certamente, outros ministros também fizeram suas campanhas. 

Juristas de escol não se submetem a campanhas humilhantes, constrangedoras e comprometedoras. Daí, as vagas disputadas pelo rebotalho, por vaidosos, ambiciosos, bajuladores, barnabés carreiristas, que se valem dos expedientes próprios do processo eleitoral. 

A escolha do futuro ministro normalmente recai sobre pessoa amiga e/ou de confiança, afinada com o ideário político e com as crenças do presidente da república. Nos EUA sempre foi assim: o presidente escolhe pessoa da sua confiança, do seu partido ou sem partido, mas adepta dos mesmos princípios políticos, ideológicos e religiosos. No Brasil, o governo petista, por ingênuo, equivocado e excessivo republicanismo, fugiu desse padrão e até hoje sofre os efeitos negativos da sua imprudência. Aliás, o governo petista fortaleceu também os seus outros inimigos: a polícia federal e o ministério público.    

Feita a indicação, o candidato submete-se à sabatina perante comissão do Senado. O plenário do Senado poderá concordar ou discordar do parecer dessa comissão. Se o candidato for aprovado, o presidente o nomeará ministro do STF; se não for aprovado, o presidente indicará outra pessoa. O Senado costuma aprovar já na primeira indicação, mesmo que a pessoa não esteja à altura do cargo. A sabatina tem sido mera encenação. Portanto, não se há de estranhar a presença de “juízes de merda” (royalties para Saulo Ramos) na mais alta corte judiciária do estado brasileiro. 

Feita a nomeação, o escolhido tomará posse perante o STF e, no prazo legal, entrará no exercício do cargo de ministro. Certa vez, o Superior Tribunal Militar (STM) negou-se a dar posse a pessoa nomeada pelo presidente Sarney. Aprovar, cabe ao Senado; nomear, cabe ao presidente; empossar, cabe ao tribunal. Se não preencher requisitos morais e de eficiência técnica, o nomeado pode ser recusado pelo tribunal. Entretanto, faltam autoridade moral e coragem ao STF para atitudes dessa envergadura. Por outro lado, como se viu nos últimos 20 anos, sobra-lhe disposição para engavetar, tergiversar, sofismar, colocar a política acima do direito, atuar com intencional parcialidade, desmoralizar a instituição judiciária.  

Precipitou-se, o atual presidente da república, ao indicar desembargador para ocupar cadeira de ministro no STF sem que a vaga estivesse aberta. Talvez, a pressa se justifique pelo temor de eventual rejeição. Além da peraltice por não simpatizar com o ministro que se aposentará, a intenção do presidente parece a de evitar especulações e pressões inconvenientes. Então, faz sondagem no Congresso Nacional, no STF e em outras áreas, para se inteirar do grau de aceitação da pessoa indicada. Acautela-se contra possíveis e indesejáveis resistências, inobstante a indicação e a posterior nomeação serem da sua privativa e soberana competência. 


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