quarta-feira, 24 de maio de 2017

CRISE INSTITUCIONAL II

A situação do Brasil tem sido qualificada ora como crise política, ora como crise econômica e social, ora como crise institucional. Os discursos que veiculam essas qualificações são mais suasórios do que informativos ou demonstrativos. Tentativas de persuadir a nação. O discurso retórico, breve ou longo, erudito ou convencional, razoável ou radical, pode revelar, esclarecer, louvar, emocionar, enganar. A retórica, entendida como arte de persuadir mediante o discurso oral ou escrito, está presente nos meios de comunicação, nas assembleias, no parlamento, no governo, no tribunal. Através dela é possível criar artificialmente um clima de euforia ou de desespero, de esperança ou de desânimo, de união ou de desagregação.   
Crise é a fase aguda de um processo que altera a função dos organismos. Caracteriza-se por ser disfuncional. À semelhança do mundo animal, a sociedade e o estado são vistos como organismos vivos que periodicamente adoecem. A diferença está no tipo da doença, na sua duração (crônica ou temporária) e no efeito do remédio (restaurador ou transformador).
No organismo social, o remédio pode restaurar um regime ou trazer mudanças estruturais e funcionais. A democracia pode mudar para autocracia (aristocrática ou oligárquica); a autocracia pode mudar para democracia (direta ou indireta).  A falta de sintonia entre governantes e governados, o descontentamento da população, a desarmonia entre os poderes do estado, a malandra manipulação dos fatos e do direito, geram crise política da qual advém mudança na fisionomia do sistema (o liberal muda para socialista; o socialista muda para liberal; soluções conciliatórias).
Crise institucional é a fase aguda de um processo que altera as instituições civis (públicas e privadas), militares e religiosas (cristãs, judias, islâmicas). Pergunta-se: no Brasil hodierno, todas as instituições estão em crise? A resposta é negativa. Pelo menos, as instituições militares e as religiosas não apresentam nível crítico na sua estrutura e no seu funcionamento. A condecoração de pessoas desqualificadas moral, técnica e politicamente (Michel Temer, Sérgio Moro) não desencadeou crise na corporação marcial. A pedofilia praticada por padres também não gerou crise no status da igreja católica, embora tenha havido atualização técnica e catequética. 
Quanto às instituições civis (família, escola, associações, empresa), nem todas chegaram à disfunção máxima. Bancos, indústria, comércio, companhias de seguro, serviços, continuam a funcionar sem apresentar as graves disfunções que caracterizam as crises. No entanto, o acesso ao crédito ficou difícil, a produtividade caiu, os direitos dos trabalhadores estão ameaçados, aumentaram o desemprego e a insegurança nas camadas remediadas e pobres. A fome tornou a rondar a casa dos pobres. Os princípios e regras constitucionais são contornados maliciosamente.
As oscilações são próprias da política, da economia e dos costumes, contudo, elas podem atingir nível crítico e provocar efeitos drásticos, como o estouro da bolsa de valores nos EUA (1929) e a redução do abastecimento de petróleo por decisão e posicionamento da OPEP (1973). No Brasil, nas respectivas épocas, chegaram ao nível crítico: os ciclos da borracha, do açúcar, do café e, agora, o da carne. O ciclo da soja ainda não entrou na curva descendente. Houve entrega parcial: (1) da riqueza mineral a corporações estrangeiras; (2) da soberania territorial ao governo dos EUA.  
A crise moral ocorre quando o útil se desvincula da ética; quando há ampla rejeição ou indiferença aos preceitos éticos na sociedade. O relativismo é a porta larga pela qual escapam os imorais e os amorais. No que tange aos ateus, há os que agem segundo princípios éticos, embora sem acreditar em deus. A crise moral pode ser geral, quando atinge todas as instituições (civis, militares, religiosas), ou setorial, quando atinge apenas algumas.
No Brasil, a desonestidade e a licenciosidade estão no DNA da população desde os tempos coloniais. O câncer da imoralidade é cultural e antigo. A rejeição ou a indiferença aos princípios éticos e jurídicos chegou ao ápice na última década do século XX e nas duas primeiras décadas do século XXI, quando a corrupção ganhou alturas estratosféricas no governo Cardoso e se manteve nos governos Silva, Rousseff e Temer.
Em nível federal, o processo de degradação moral chegou à sua culminância no governo Cardoso. Em nível estadual, ocorreu no governo Cabral, do Rio de Janeiro, apesar da concorrência mui forte dos governos Barros, Maluf e Serra, de São Paulo. A experiência brasileira revela que o abandono dos princípios éticos e jurídicos causa graves danos à nação.

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