quarta-feira, 9 de novembro de 2016

POESIA

João sem Terra, em um barco sem quilha, depois de muito mar sem horizonte certo dia sem aurora desembarca em um porto sem cidade e bate a uma porta sem casa.
Reconhece a mulher sem rosto que se despenteia ao espelho fosco, o leito sem repouso, o amor mudo, e a tristeza da tarde já pela manhã.
Do cais onde o silêncio apodrece e seca um sol colhido demasiado verde, as desanimadas gaivotas partiram para outros universos.
Os estivadores que descarregam penas e alegrias, berços exportados, esquifes importados, pipas sem azeite e tecidos sem lã, assoviam inutilmente os cantos da liberdade.
Estes couros jamais serão sapatos, este algodão não vestirá os nus, esta lenha não dará chamas, deste trigo não se fará pão.
Que porto será esse em que ninguém acosta? Que cabo será esse, sombrio, sem continente? Qual esse farol sem misericórdia? E esse passageiro sem castigo?
(“João Sem Terra”. Yvan GOLL. Traduzido por A. Costa).

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