O problema teológico começa
com a pergunta: deus existe?
A resposta negativa é dada
pelos ateus. O ateísmo nega a
existência de deus. Os ateus admitem o governo da natureza por ela mesma. Negam
a necessidade de explicar e justificar o mundo através de um deus. Basta a
razão.
A resposta afirmativa comporta
duas vertentes: a deísta e a teísta. O deísmo
afirma a existência de deus, criador do universo, mas não interventor. Após
criar o mundo, deus não mais interfere; deixa-o sob o comando das leis naturais
impregnadas da sua inteligência. Os deístas não admitem a revelação divina como
fonte do conhecimento; deus nada revela aos homens. O teísmo afirma a existência de deus personalizado, criador do
universo, interventor e providencial, que revela aos homens o seu saber e os
seus mistérios. Os teístas admitem a revelação divina como fonte do verdadeiro conhecimento.
A
seguir, vem outra pergunta: o mundo espiritual existe?
A
resposta dada pelos materialistas é não. O mundo sobrenatural é invenção
de pessoas que apreciam a ilusão e se deixam por ela convencer. Existe apenas o
mundo natural em que vivemos. Tudo o que nele nasce nele perece. A alma nasce e
morre com o corpo. Vida após a morte é pura ilusão, sonho de eternidade.
A
resposta dada pelos espiritualistas é sim. Há um mundo além do mundo
natural. Esse mundo sobrenatural é a morada dos deuses (ou do deus único) e das
almas individuais, segundo a crença dos diferentes povos no curso da história. Os
espiritualistas divergem entre si, quanto à estrutura e ao funcionamento desse
mundo espiritual.
Os
espiritualistas filiados à linha platônica entendem que o mundo espiritual é a
realidade verdadeira; o mundo material é apenas a sombra daquele. O que existe
no mundo material é uma projeção do que existe no mundo espiritual. Os dois
mundos são independentes. O mundo espiritual continuará a existir ainda que o
mundo material seja destruído. Deus continuará a existir na sua morada
celestial. Nessa mesma linha, morto o corpo humano, a alma individual prossegue
a sua existência no outro mundo. Há, pois, vida após a morte.
Algumas
correntes espiritualistas (como a hinduísta e a budista) ensinam que a alma
humana é individual e reencarna para se purificar pelo sofrimento. O nosso planeta
é visto como um cadinho purificador. Alcançada a pureza, a alma individual não
mais reencarna; permanece no mundo espiritual na companhia dos bem-aventurados.
A doutrina da igreja cristã ensina que a alma individual não reencarna,
permanece no mundo espiritual onde é julgada, absolvida dos pecados ou
condenada ao sofrimento eterno.
Ante
algumas dificuldades decorrentes da idéia de separação entre dois mundos,
pensadores platônicos defendem a existência de um terceiro mundo,
exclusivamente divino. Deus tem a sua própria morada que não se confunde com
nenhum dos dois mundos por ele criados. Ao seu inteiro e exclusivo arbítrio deus
poderá, querendo, destruir os dois mundos enquanto ele próprio continuará a
existir no seu mundo exclusivo.
Pensadores
e escolas esotéricas ensinam que entre o mundo material e o espiritual há
distinção, mas não separação. Os dois mundos são harmônicos e ambos formam uma
unidade cósmica: o múltiplo no uno (universo). A diferença entre os dois é
apenas de freqüência vibratória, pois, na origem, comungam a mesma energia.
Destarte, se um perecer o outro também perecerá. Considerando que a existência
de ambos implica a existência de deus, a dissolução de ambos acarreta a morte
de deus. Nesse contexto, se a dissolução decorrer da vontade divina,
significará que deus se suicidou.
Na doutrina platônica e
cristã, deus é ato puro; deus não foi e nem será; simples e
eternamente, deus é. Deus existe por si mesmo, imóvel, imutável,
infinito, primeiro motor do mundo, causa primeira de todas as coisas. Entre os
povos semitas, as letras EL e AL indicam o laço sagrado ou a própria divindade
(Rafael, Al-Corão). O deus dos hebreus (judeus + israelitas)
recebia nomes diferentes: Elohim
(singular) ou Eloah (plural), Adonai e YHWH (Javé). O deus dos cristãos é tratado de Pai Celestial, o deus dos muçulmanos, de Allah, o deus dos místicos, de Ser
e Absoluto. Os gregos referiam-se à
divindade como Theos.
Apesar de ser uma questão de
fé, há tentativas de provar a existência de deus mediante o uso da razão. A consciência
moral inata no ser humano é um dos argumentos racionais utilizados. Os humanos
são dotados naturalmente da noção do bem
e do mal, embora a avaliação das
ações e omissões como morais ou imorais possa variar segundo a cultura de cada
povo. Aquela noção natural supõe uma fonte de moralidade anterior e superior
que orienta o humano em direção à justiça, à bondade, à santidade. Essa fonte é
deus.
A inteligência criadora também
é mencionada como prova da existência de deus. Ao contemplar a estrutura e o
funcionamento do mundo natural, ao intuir as leis que o governam, impregnadas de
inteligência, o ser humano percebe a existência de uma superior inteligência governante.
Essa inteligência é deus. O movimento característico do universo também é
apresentado como prova. O movimento indica a necessária existência de um motor
que deu o impulso inicial. Esse primeiro motor é deus. O princípio da
causalidade constitui outro argumento racional. Da constatação de que tudo no
mundo material tem uma causa e de que cada causa é efeito de outra antecedente (sucessão
de causas e efeitos), infere-se a existência de uma causa inicial. A causa
primeira de todas as coisas é deus. Argumenta-se ainda com a transitoriedade
das coisas no mundo material. Ao verificar a contingência, natural ao mundo
físico, onde tudo que nele nasce nele perece, o espiritualista intui que só
deus é permanente, estável e absoluto. A essencialidade é outro argumento
racional. Atributos como sabedoria, poder, nobreza moral, podem se conservar ou
se perder durante a existência de cada indivíduo. Todavia, em deus, poderes e
virtudes são da sua essência; deus não tem
sabedoria, poder e nobreza; deus é
sabedoria, poder e nobreza.
Pensadores, sacerdotes,
escolas esotéricas, apresentam deus sob diferentes formas, ora como ser animado,
ora como inanimado; ora concentrado, ora difuso. Geralmente, apresentam-no sob
forma humana, com predicados humanos. A religião dos hebreus e a religião dos
cristãos atribuem forma humana aos seus deuses. Afirmam que o homem foi criado
à imagem e semelhança de deus. Isto faz do homem um projeto divino e afaga o
seu ego. Deus também é apresentado como algo semelhante ao Sol, que ilumina a
mente e aquece o coração dos humanos (doutrina monoteísta do faraó Aquenaton).
Para alguns místicos, deus não
tem forma alguma; apenas, essência. Deus não ocupa lugar no espaço e nem dura
no tempo. Deus não é feio e nem bonito, não é bom e nem mau, não é justo e nem
injusto, não é verdadeiro e nem falso. Na incapacidade de atingir a verdade
suprema, os humanos imaginam o que deus é e como deus é. Imaginam, também, o
que deus deve ser e os atributos que
deus deve ter. Os humanos tomam a si
mesmos e o mundo em que vivem como premissas das suas inferências. Na esfera
metafísica, há somente opinião ao invés de certeza; reina a suposição; há muita
dúvida e vasta ignorância.
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