sábado, 11 de julho de 2015

FIM DO MUNDO IV



O terreno da espiritualidade é metafísico e nele se caminha tendo como farol a intuição. De acordo com os ensinamentos dos místicos orientais, penetrar no mundo espiritual exige um procedimento prévio: esvaziar a mente, o que significa afastar preocupações, sentimentos e pensamentos mundanos no processo de harmonização. As categorias tempo e espaço condicionadoras da mente humana são inoperantes no mundo espiritual. A atividade lógica do ser humano coloca ordem nas idéias, porém, o raciocínio dificulta a harmonização com o plano espiritual. A mente vazia é a senda para o êxtase espiritual.

No livro “O Triunfo da Vida Sobre a Morte”, o filósofo e teólogo Huberto Rohden diz o seguinte: Entre o entendimento intelectual do homem profano e o compreender espiritual do iniciado medeia um grande sofrimento. Ninguém chega a Deus só pela força do pensamento. Certo. Há outras exigências, tais como: vontade determinada a esse fim, boas ações, rituais, tudo com desprendimento e amor que torne possível um ambiente de alta freqüência vibratória. Na metafísica religiosa prepondera a fé, contudo, o raciocínio é indispensável a uma fé lúcida. Durante reportagem em evangélico canal de TV (08/07/2015), no decorrer de uma convenção internacional de adventistas, onde os fiéis se apresentam com os trajes típicos dos seus países, todos se declarando felizes, um deles, peruano, diz que aguarda a “volta de Jesus”, crença geral daquela igreja, apesar das evidências em contrário. Isto ilustra o que se entende por fé cega.    

De um modo geral, os místicos acreditam na reencarnação. Alguns acreditam que Jesus é um dos grandes mestres da humanidade que, nesta Era de Aquário, reencarnou entre os curdos. Se isto for verdade, o irmão adventista, que se dizia feliz, pode ficar mais feliz ainda, ao saber que o seu amado Jesus voltou e vive entre nós em carne e osso. O Pai Celestial de Jesus gosta de enviar o filho a regiões inóspitas. Primeiro, à Palestina, onde o filho levou bordoadas e foi crucificado. Agora, ao Curdistão, território encravado entre o Irã, Iraque, Síria, Turquia e Armênia, cujo povo tem bandeira, luta pela independência e por reconhecimento internacional. Guerrilha, mortes, sofrimento, pobreza, cotidiano da nação curda. O divino filho podia ter reencarnado no Brasil, neste paraíso tropical, ingressar na política e se dar muito bem presidindo a Câmara ou o Senado. Acontece que deus não é brasileiro. Deus é pai ou é padrasto? Pai bondoso e amoroso não envia o filho para aquele caldeirão infernal. Este planeta azul tem lugares mais aprazíveis.

Lao Tse, filósofo e historiador chinês do sexto século antes de Cristo, contemporâneo de grandes mestres da humanidade como Kong Fu Tse (Confúcio), Pitágoras e Sidarta Gautama (o Buda, histórico herdeiro de um principado no Nepal), expõe o seu pensamento no livro “Tao Te King” (Caminho que Conduz a Deus). A bipolaridade cósmica representada no diagrama chinês tei-gi (yang x yin) permeia a filosofia de Lao Tse. Este livro singelo influiu na cultura oriental e deu origem ao Taoísmo. Ensina que o Tao é a fonte do profundo silêncio que o uso jamais desgasta. O Tao é como uma vacuidade, origem de todas as plenitudes do mundo. O Tao desafia inteligências aguçadas, desfaz as coisas emaranhadas, funde todas as cores em uma só, unifica todas as diversidades. Quanto mais falamos no Universo [Infinito, Absoluto] menos o compreendemos; melhor é auscultá-lo em silêncio. O céu e a terra são eternos porque radicam em algo além deles mesmo. Antes que o céu e a terra existissem havia o SER sem forma, imóvel, o vácuo, o nada, berço de todas as possibilidades. O valor do físico está no metafísico. Todas as coisas visíveis são setas que apontam para o invisível. O SER jaz nas profundezas do insondável. Tudo o que existe egressa do SER e regressa ao SER.

Para além da palavra e do pensamento situa-se o Tao, poderoso, insondável, eterno servidor da vida, seio materno do Universo, pátria de todos os seres, querência dos bons, refúgio dos maus, ciclo do ser e do existir. Quem quer ver a divindade não a verá, porque ela é invisível. Nenhum caminho parcial conduz à meta total; só na visão do todo se encontra a divindade. Quem sintoniza com a alma do Infinito alcança a sabedoria; assemelhar-se-á em tudo ao Infinito. Paz e amor é sabedoria. De nada adianta extinguir ódios quando ficam ressentimentos. Inteligente é quem conhece o outro. Sapiente é quem conhece a si mesmo. Tolo é quem julga poder substituir pela inteligência a cultura do coração. A sabedoria radica na simplicidade.

Para conhecer o mundo, desnecessário viajar pelo mundo. Posso conhecer os segredos do mundo sem olhar pela janela do meu quarto, diz Lao Tse. Quem conhece a sua própria ignorância revela a mais alta sapiência. Quem ignora a sua própria ignorância vive na mais profunda ilusão. Quem se ergue às alturas sem desejos, enche de silêncio o coração. Quem se junta ao Uno não tem desejos; onde não há desejos, há paz; onde há paz, há harmonia e felicidade. Quem harmoniza os seus atos com o Tao se torna um com ele. O mundo é uma entidade espiritual que se plasma por suas próprias leis. A moralidade e o direito nasceram quando o homem deixou de viver pela alma do Universo. Em tempos bons, apreciamos a justiça. Em tempos maus, recorremos ao direito. Verdade e justiça geram benevolência. Ilusão e direito geram violência. Quem se guia pela voz da consciência só atende à voz do dever e não insiste em seus direitos.

Nenhum comentário: