Grécia (continuação).
Aristóteles estudou e lecionou na
Academia por 20 anos. Foi preceptor de Alexandre Magno, filho de Felipe da
Macedônia (343 a
336 a.C.).
Ao retornar a Atenas, ele funda uma escola que ficou conhecida como Liceu, assim chamada por sua proximidade
com o templo de Apolo Liceano. Aristóteles ensinava caminhando pelos jardins da
escola. Deste hábito veio o apelido da sua escola: peripatética. {O verbo discorrer
como sinônimo de discursar implica
movimento, vaguear de uma idéia a outra, de um lugar a outro}. Acusado de
impiedade e de ser amigo da Macedônia, Aristóteles fugiu para não ser preso,
processado e executado. Deixou o Liceu sob os cuidados de Teofrasto e viajou para
Cálcis, onde morreu (323 a.C.).
Aristóteles era estudioso e
escritor prolífero. Das obras destinadas ao grande público restaram os
diálogos: Eudemo (sobre a
imortalidade da alma), Protético
(elogio da vida contemplativa e da filosofia), Sobre a Filosofia {oposição à teoria das idéias de Platão, concepção
do universo como organismo cujo dinamismo se deve a um princípio imanente
chamado physis (natureza)}. As obras
destinadas ao público seleto (discípulos, filósofos, estadistas) foram reunidas
em uma coleção por Andrônico de Rodes, no século que antecedeu a era cristã,
sob o nome de Corpus Aristotelicum dividida
nas seguintes partes: [1] Organon,
tratados de lógica. Aristóteles os encarava como instrumento utilizado pela
ciência e pela filosofia (propedêutico). Havia: (I) tratado das categorias sobre a linguagem e os
elementos do discurso. Aristóteles denomina categorias
as idéias fundamentais como espaço, tempo, movimento, substância, quantidade,
qualidade; (II) tratado da interpretação
sobre o juízo e a proposição; (III) tratado dos analíticos sobre o raciocínio formal (silogismo) e a demonstração
científica; (IV) tratado dos tópicos sobre
o método geral da argumentação e sobre os argumentos sofísticos (principais tipos
de argumento capcioso). [2] Física:
textos sobre o mundo natural (conceito de natureza, movimento, infinito, vazio,
lugar), sobre o céu, a geração, a corrupção e os fenômenos atmosféricos. [3] Tratado
da alma sobre as funções vitais (sensação,
memória, respiração). [4] História dos
Animais, observações biológicas decorrentes da pesquisa científica. [5] Metafísica: textos especulativos sobre princípios,
causas e assuntos situados além do mundo físico. [6] Filosofia prática: (I) sobre os costumes, ele escreveu a Ética a Eudemo e a Ética a Nicômaco; (II) sobre a vida política e social, ele escreveu
oito livros cujo conjunto foi denominado Política;
(III) sobre dialética ele escreveu a Retórica;
(IV) sobre espécies, características e classificações da poesia ele escreveu a Poética.
Aristóteles considerou nas suas
obras os aspectos práticos e concretos da realidade, embora concordasse com os
seus antecessores no que tange ao absoluto
e aos princípios eternos. Concordava
com Platão sobre a realidade dos universais
(idéias ou formas existentes em abstrato) e a falta de exatidão do conhecimento
derivado dos sentidos (formas concretas), porém, ao contrário do seu mestre,
negava aos universais uma existência independente. De acordo com o seu
pensamento, forma e matéria têm o mesmo valor; uma não pode
existir sem a outra. Isoladas, forma e matéria são abstrações; na união de
ambas consiste a essência do universo (substância). As formas (idéias) geram
todas as coisas, modelam a matéria. Movimento
é a passagem da potência ao ato (potência
é a virtualidade do ser; ato é
a realidade do ser). Causa é tudo que contribui para a realidade do ser.
O vazio inexiste. O espaço está preenchido com éter. Aristóteles considerava o éter uma substância supralunar. {Na
idade contemporânea a ciência substituiu a idéia do éter pela idéia de energia}. Espaço e tempo são contínuos e
infinitamente divisíveis. O governo do universo é teleológico {orienta-se por
uma finalidade (causa final) projetada pela mente divina}. Deus é o primeiro
motor, fonte original do movimento, inteligência pura, impessoal, desprovido de
desejo, vontade e sentimento {atributos exclusivamente humanos}. A alma perde
sua função com a morte do corpo. Os apetites não encarnam o mal. O corpo merece
cuidados. O bem ou o mal praticado pelo homem é voluntário {o homem é
responsável por seus atos, salvo se incapaz do ponto de vista físico e mental}.
As emoções devem ser controladas pela razão. A virtude está no termo médio, no equilíbrio entre a
indulgência e a ascese. {Nada de excessos. Moderação é o ponto mediano}. A
serenidade é o termo médio entre a agressividade e a subserviência. “A paixão
transforma todos os homens em irracionais.”
A cidade (estado) é a melhor
instituição para o bem-estar de todos. Cuida-se de comunidade estabelecida com boa finalidade uma vez que todos sempre
agem de modo a obter o que acham bom. Há que se procurar o que é bom em si
e não o que está conforme os costumes, pois à medida que o tempo caminha se
torna necessário modificar as instituições. A constituição da cidade (do estado)
deve propiciar a melhor forma de vida. Constituição é a
ordem ou distribuição dos poderes que existem num estado, isto é, a maneira
como eles são divididos, a sede da majestade e o fim a que se propõe a
sociedade civil. A lei é o
espírito desembaraçado de qualquer paixão. República é o estado governado pela multidão para a
utilidade pública. Este nome também é comum aos estados em geral. A república “reúne o que há de bom em dois
regimes degenerados: a oligarquia e a democracia”. São objetos: (1) da
democracia, a liberdade; (2) da oligarquia, a riqueza; (3) da aristocracia, a
virtude. A escolha dos magistrados pode se dar: (1) por sorteio (modo
democrático); (2) por eleição (modo oligárquico). A república deve adotar as
eleições e a elegibilidade sem exigência de renda. “Não é sem razão que se
censura tal governo a que chamam democracia
ao invés de república, pois onde as
leis não têm força não pode haver república, já que este regime é a maneira de
ser do estado em que leis regulam todas as coisas em geral e os magistrados
decidem sobre os casos particulares.” A oligarquia revela-se republicana
quando: (1) há moderação e respeito à simples abastança; (2) o poder couber às
riquezas médias; (3) quem tiver a renda estipulada puder chegar ao governo; (4)
os seus membros: (I) forem eleitos; (II) contar maior número; (III) não
empreenderem nada contrário à lei, mas, ao invés disso, se conformarem
plenamente a ela.
No que diz respeito à arte política, deve-se considerar – não apenas
qual o melhor governo, aquele que se deve preferir quando nenhum obstáculo
exterior se opõe – mas, também, aquele que convém a cada povo, pois, nem todos
são suscetíveis do melhor. Em todos os homens, o mando (autoridade) e a
liberdade procedem do coração. Aristóteles considerou a possibilidade da união
dos povos helênicos sob uma só constituição (pan-helenismo e federalismo) a
partir da experiência das ligas. A amizade entre os helenos beneficiaria a
todos. Amizade entre todos os cidadãos {relacionamento cooperativo e
altruístico} é essencial a uma vida satisfatória e à união cívica. A amizade
evita a discórdia e contribui para a paz. O homem é um animal racional, social
e político. A cidade (estado) resultou dos instintos humanos em direção à vida
civilizada. Com a cidade grega (polis)
em mente e a história em sua lembrança, Aristóteles concluiu que a melhor forma
de governo é a politeía, fusão da
oligarquia (governo dos ricos) com a democracia (governo dos pobres). Os
preceitos para preservá-la são: [1] os partidários da ordem vigente devem ser
mais fortes do que os partidários da mudança; [2] moderação nos assuntos da
cidade, orientar-se pela justa medida e não fazer injustiça ao povo; [3]
educação exclusivamente pública e sintonizada com o sistema de governo que se
quer preservar; [4] exercício das magistraturas e funções públicas sem objetivo
de lucro e sem abuso ou excesso; [5] cidadãos atentos {o preço do bom governo é
a constante vigilância}.
Segundo Aristóteles, no melhor
sistema político o governo cabe à camada média da sociedade. A propriedade
privada é válida, mas não o entesouramento. A riqueza deve ser limitada ao
necessário para uma vida dedicada ao cultivo do intelecto. O bom governo deve
distribuir dinheiro aos pobres para se devotarem {como produtores e
consumidores} ao comércio e à agricultura com dignidade. O bom cidadão deve
cumprir seus deveres cívicos e prestar serviço na paz e na guerra. Em sendo a
lei virtuosa, {expressão racional da moralidade}, justo é prestar-lhe
obediência, pois nela reside a autoridade soberana. Este justo legal coexiste (ou deve coexistir) com o justo natural que tem vigência universal e independe de opinião. O
justo natural goza de estabilidade apesar da mutabilidade das coisas humanas.
Mesmo com possível colisão, podem
coexistir: [1] convenção e natureza; [2] lei escrita e lei
costumeira. Os fracos não pedem mais do que igualdade e justiça. Os fortes
pouco se importam com isto. Justiça é uma espécie de igualdade que serve de base ao direito. Supõe relação
humana {agente e paciente} e a idéia de proporção: tratar igualmente o que é
igual e desigualmente o que é desigual. Consideram-se nesta proporção os
bens e as pessoas com suas diferenças nas relações de troca. Faz-se justiça na
cidade (estado) quando: [1] cada um recebe o seu quinhão (justiça distributiva); [2] encontra-se um termo médio entre o ganho
e a perda (justiça eqüitativa); [3] havendo
igualdade entre as partes, elas próprias estabelecem as cláusulas contratuais e
a medida conveniente nas relações de troca (justiça
comutativa); [4] havendo controvérsia entre as partes, intervém o magistrado
(juiz) para solucioná-la à luz do direito (justiça
judicial). Aristóteles menciona ainda um tipo especial de juízo denominado equidade: o magistrado atenua o rigor da
lei guiando-se pelo senso comum de justiça e pelos bons costumes, aplicando medida
que julga adequada ao caso concreto.
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