sábado, 23 de março de 2013

JESUS, OS APELIDOS.



No estágio atual do conhecimento humano, a crítica racional revela o caráter fantasioso e apologético das narrativas bíblicas, tanto as do antigo como as do novo testamento. A vida e a doutrina de Jesus narradas nos evangelhos serviram de alicerce à civilização ocidental cristã. Daí a importância de examiná-las em cotejo com a natureza humana e a realidade histórica. Essa cautela afastará mitos e espertezas que entrevaram a maioria dos cristãos e produziram uma cultura estribada na falsidade e na hipocrisia. Deformada moralmente, essa cultura beneficiou grupos religiosos, políticos e econômicos, aprofundou desigualdades sociais, trouxe miséria e sofrimento a grande parcela da humanidade, consoante testemunho da história medieval e moderna.

Alguns pontos polêmicos permanecem vivos. Jesus era o seu nome de batismo (Joshua). Se fosse o messias hebreu, o nome teria de ser Emanuel de acordo com a profecia do antigo testamento. O anjo que apareceu a José e Maria mudou o nome para Jesus (Mt 1: 21/23; Lc 31). Da narrativa de Lucas deduz-se que o anjo Gabriel deflorou Maria. Ela engravidou, pariu Jesus, consagrou-o a Deus (tornou-o nazareno) e o encaminhou ao monastério do Monte Carmelo. Isto certamente melhorou as relações entre Maria e seu marido José. Este parecia não se sentir feliz com aquele bastardo em seu lar a lembrá-lo do defloramento de Maria por outro homem que se dizia anjo.

Ao nome de Jesus foi agregado o apelido nazareno sem relação alguma com o torrão natal, pois naquele tempo não havia cidade ou aldeia com o nome de Nazaré segundo constatou Harvey Spencer Lewis (La Vida Mística de Jesús. San José, Califórnia, Gran Logia Suprema de Amorc, 1967, pág. 48, 114, 132). Posteriormente à época de Jesus, batizaram uma aldeia com o nome Nazaré para encobrir o fato de ele ter pertencido a uma seita mística. Interessava passar aos fiéis a idéia de que todo o conhecimento de Jesus vinha diretamente de Deus e não dos homens. Jesus freqüentava as seitas nazarita e essênia cuja doutrina adotara. Daí o apelido nazareno. Além disto, entre os hebreus esse apelido era dado ao filho primogênito quando a família o colocava ao serviço de Deus, como aconteceu com Samuel e Sansão, juízes hebreus, ambos nazarenos, nenhum deles nascido em aldeia ou cidade denominada Nazaré. Subordinada às leis da Palestina (romanas e judias) Maria seguiu o costume e colocou Jesus no monastério.

Outro apelido agregado ao nome de Jesus foi o de cristo (= ungido). Tal era o apelido de místicos ungidos com óleos, sagrados, purificados, que alcançavam iluminação espiritual. O nascimento de Jesus bipartiu o tempo histórico em antes de Cristo (a.C.) e depois de Cristo (d.C.). Os seus seguidores foram denominados cristãos, espalharam-se pelo mundo, organizaram igrejas e se distribuíram em ortodoxos e heterodoxos, católicos, protestantes e espíritas. De acordo com o pensamento de Cristo, a quem padecesse pobreza, fome e tristeza na Terra, haveria riqueza, fartura e alegria no Céu; haveria juízo final: os bons entram na morada divina e os maus queimam no inferno; cada qual será medido pela mesma medida com que mede os outros.
Cristo recomendava as seguintes condutas: (i) amar ao inimigo, fazer bem a quem nos odiar, abençoar aos que nos maldizem, orar aos que nos injuriam; (ii) a quem nos ferir numa face, oferecer a outra; a quem nos tirar a capa, deixar que também leve a túnica; dar ou emprestar a quem nos pedir, sem almejar retorno; se alguém tirar o que é nosso, não reclamar; (iii) fazer às pessoas o que queremos que elas nos façam; (iv) ser misericordioso; não julgar para não ser julgado; não condenar para não ser condenado; perdoar para ser perdoado.
Os seguidores dessas recomendações formariam uma comunidade de santos. Até hoje, nenhuma comunidade cristã as seguiu à risca. A doutrina é bela, mas impraticável em sua plenitude. O pólo demoníaco da natureza humana é o grande e poderoso óbice. Nem Jesus a praticou inteiramente como se vê dos episódios de violência no templo, luxúria, menosprezo à mãe e aos irmãos, destempero verbal contra opositores.

Jesus também recebia tratamento de rabi (= mestre). Assim o chamavam os discípulos e aqueles que ouviam suas preleções. Ele demonstrava conhecimento da lei mosaica, da lei romana e do mundo material e espiritual. Ensinava em lugares abertos e fechados; ao pé da montanha e à beira do lago; nas casas de discípulos e de simpatizantes; nas sinagogas e no templo de Jerusalém. Travava debates com os sacerdotes e escribas judeus. Estes perceberam que a religião judia corria o risco de perecer diante da nova doutrina. Ficaram preocupados quando aumentou a parcela do povo de Jerusalém que aderiu aos novos ensinamentos. Acusaram Jesus de blasfêmia e o condenaram à morte. Jesus estava com mais de 40 anos – e não 33 como se difundiu – quando tramaram a sua morte. Está lá, no evangelho: Os judeus lhe disseram: Não tens ainda cinqüenta anos e viste Abraão! (João 8: 57). Se Jesus estivesse na faixa dos 30 anos, eles teriam dito: não tens ainda quarenta anos e viste Abraão!  Os judeus que o questionavam e censuravam nesta ocasião eram fariseus, componentes da elite intelectual e religiosa de Jerusalém, bem informados sobre Jesus, seu grupo e seus ensinamentos (João 8: 12/59).    

O povo da Palestina considerava Jesus um profeta. Desde Elias em 875 a.C. até Malaquias em 450 a.C. quase vinte profetas se destacaram. Qualificava-se profeta a pessoa carismática a quem se dava o crédito de visões do futuro, de falar em nome de Deus e de expressar a vontade de Deus. Daí, a autoridade moral dos profetas sobre o povo hebreu e seus governantes. No sermão da montanha, Jesus referiu-se aos maus tratos de que eram vítimas os profetas. Na sinagoga da cidade em que viviam seus pais, ele reclamou da desconfiança do povo em relação à sua pessoa e disse com amargor que nenhum profeta é bem aceito em sua pátria. Quando se excediam nas admoestações, os profetas eram ameaçados e punidos pelo povo ou pelos governantes. Isto aconteceu inclusive com Jesus e João Baptista. A fim de atrair adeptos às suas doutrinas, mudar costumes e crenças, os dois se excederam na agressividade contra judeus e autoridades judias. A conseqüência foi drástica: prisão e morte.

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