domingo, 15 de janeiro de 2023

INVASÃO DE BRASÍLIA

Merecem especial atenção os graves acontecimentos do dia 08/01/2023, quando mais de mil homens e mulheres oriundos de diferentes pontos do território nacional invadiram Brasília e, na praça dos 3 poderes, depredaram prédios, instalações e bens móveis do governo federal. A horda aproveitou-se do domingo e do fato de a praça e os palácios do legislativo, executivo e judiciário estarem às moscas. O objetivo era provocar a intervenção do exército para garantir a lei e a ordem. Os militares ficariam mais 21 anos no governo e os baderneiros impunes. Os acampamentos em frente aos quarteis, com a tácita permissão dos oficiais comandantes, davam certeza aos subversivos de que teriam êxito na empreitada. Entretanto, a força policial e a autoridade moral e jurídica do governo civil empossado neste mês (janeiro/2023) impediram a consumação do golpe. Predadores foram presos. Planejadores, financiadores e incentivadores da subversão quando encontrados responderão por seus crimes. A violência, os danos, a afronta ao estado democrático de direito, a ofensa aos sentimentos da nação, o ataque à honra das autoridades, tipificam crimes definidos na legislação penal. 
Como soe acontecer, os criminosos negarão autoria; declarar-se-ão inocentes, democratas, respeitadores da ordem e dos bons costumes. Procuradores e magistrados experientes na vida forense não se impressionam com essa ladainha; firmam suas convicções nos atos e fatos provados no inquérito policial e no processo judicial. O movimento subversivo contesta a idoneidade das urnas eletrônicas e a validade das eleições presidenciais de outubro/2022, no claro propósito de manter o governo autoritário e na sequência, implantar um estado autocrático, como indica, entre outros elementos de prova, a minuta de decreto do estado de defesa encontrado na residência do então secretário de segurança do Distrito Federal. 
Falta amparo ético e jurídico aos contestantes quando usam: (i) as liberdades de consciência, crença, pensamento e locomoção para destruir a liberdade e o patrimônio econômico e cultural do povo (ii) as franquias democráticas para destruir a democracia (iii) o pluralismo político para justificar projeto favorável ao autoritarismo e à autocracia. Segundo a Constituição, os partidos políticos devem respeitar a soberania nacional, o regime democrático, os direitos fundamentais da pessoa humana. O figurino constitucional brasileiro é avesso ao nazifascismo. Destarte, são inconstitucionais: (i) manifestações públicas incompatíveis com esse figurino (ii) exercício da autoridade pública por nazifascistas no Legislativo, no Executivo ou no Judiciário.      
O Distrito Federal goza de autonomia, tem representação na Câmara e no Senado e capacidade de eleger deputados distritais, governador e vice-governador pelo voto popular. Em decorrência dessa paridade com os estados federados, o distrito também está sujeito à intervenção federal na hipótese de ali serem praticadas graves ameaças à ordem pública, à forma republicana, ao sistema representativo e ao regime democrático. Portanto, corretos e oportunos, no episódio brasiliense em tela, a intervenção federal e o afastamento do governador. 
Convém lembrar que o Distrito Federal é a sede territorial da soberania, centro das mais altas e importantes decisões relacionadas à ordem e ao progresso da nação e à concreção da forma republicana, federativa e democrática do estado brasileiro. Esse distrito é independente em relação aos territórios dos estados federados, inclusive daquele que lhe cedeu a área (Goiás). Por motivos que incluem segurança nacional, a administração do distrito devia ser da exclusiva competência de órgãos federais subordinados à presidência da república. A elaboração das leis distritais devia ser da competência do Senado. Esse possível e harmônico funcionamento do distrito evitaria fatos como os de domingo, que mostraram a vulnerabilidade do governo federal e a facilidade em golpeá-lo. 
Os deputados constituintes de 1987/1988, quiçá, os “300 picaretas”, equipararam o Distrito Federal ao estado federado, menos pelo interesse nacional e mais por interesse particular. Olhos gulosos postos nos futuros cargos, verbas, mordomias e sinecuras, os deputados atuaram mais como presentantes deles próprios e menos como representantes do povo. No Império, a fim de preservar a autoridade do governo central, a Câmara dos Deputados, ao emendar a Constituição de 1824, excluiu da autoridade da província do Rio de Janeiro, o município do Rio de Janeiro, por ser esta cidade a sede da Corte. [Ato Adicional de 1834]. Na República, a Constituição de 1891 manteve o município neutro, porém, com o nome de distrito federal, administrado por um prefeito nomeado pelo presidente da república com a prévia anuência do Senado. Após as turbulências de 1930 e 1964 e a transferência da capital do Brasil para o planalto central (1960), o distrito obteve autonomia concedida pela Constituição de 1988. 
Distrito federal é unidade territorial, ente político e administrativo próprio da forma federativa de estado, cuja origem situa-se nos EUA. Lá, com a união dos estados, todos ciosos das suas soberanias e dos seus territórios, surgiu a conveniência de criar um território exclusivo, que a nenhum deles pertencesse, para servir de sede geográfica ao governo federal constituído. Razões estratégicas ligadas a valores como vida, liberdade, igualdade, democracia, justiça, tranquilidade pública, bem-estar geral, induziram o Congresso dos EUA a abolir a autonomia do distrito (1878). Da elaboração das leis distritais ficaram encarregadas comissões nomeadas pelo legislativo federal. Das funções executivas ficou encarregada comissão nomeada pelo presidente da república. Esse modelo foi copiado por estados americanos e europeus. 
Artigos: da Constituição do Brasil: 1º, 5º, 17, 32, 34; da Constituição dos EUA: 1º, secção VIII, parágrafo 17; do Código Penal: 155, 163, 265, 286/288, 359-L/M/R; do Código de Processo Penal: 4º, 24, 158, 282, 301, 311; do Código Civil: 98, 186, 212; do Código de Processo Civil: 274, 332, 796/799; da Lei 9.605/1998: 63, 64. 


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