terça-feira, 14 de abril de 2020

PANDEMÔNIO NA PANDEMIA

A moléstia provocada pelo vírus da moda, cuja rápida propagação é surpreendente, não tem merecido especial atenção do presidente da república e dos seus seguidores. Para eles, há sensacionalismo dos meios de comunicação que disputam audiência e patrocínios; matéria jornalística para ser explorada por muito tempo; oportunidade para vender remédios e receitas e aumentar o preço das mercadorias, principalmente das essenciais ao consumo da população. Eles se rebelam contra a quarentena e as orientações da comunidade científica e médica nacional e internacional.  
Paira incerteza sobre a estrutura do vírus, a vacina e os remédios para cura. Os laboratórios intensificam suas pesquisas na busca de bons e eficientes resultados. Por enquanto, a quarentena e os cuidados com a higiene são fundamentais. Da crise provocada pela pandemia aproveitam-se os políticos para obter vantagens eleitoreiras. No jogo sujo da política partidária, governantes estaduais e municipais solapam a quarentena para atender financiadores de campanha e redutos eleitorais. Eles expedem decretos autorizando o funcionamento do comércio em horários distintos como se essa esperteza evitasse a aglomeração das pessoas nas ruas, nas lojas e nos meios de transporte coletivo. 
O impeachment tão urgente e necessário na atual conjuntura aguarda processamento na Câmara dos Deputados. Decisão monocrática que indeferir ou arquivar requerimento de impeachment deve ser homologada em sessão plenária da Câmara, segundo o preceito constitucional do devido processo jurídico. Cabe ao Supremo Tribunal Federal, se provocado, a decisão final sobre essa matéria.
O presidente da república lidera a rebeldia, sai para a rua, aproxima-se dos pedestres, reclama dos gastos com o combate ao vírus e cuida para não prejudicar os ganhos dos banqueiros, industriais, comerciantes, fazendeiros, mineradores, madeireiros e profissionais liberais. Na visão dele e da sua grei, os trabalhadores não podem ficar em casa porque precisam do salário no fim do mês. Os desempregados necessitam da economia informal. Todos devem voltar aos seus empregos e às suas atividades nas ruas e praças da cidade. A permanência em casa gera conflitos domésticos. O Brasil não pode parar. Carreata e passeata em Curitiba desfraldam a bandeira do Brasil e bandeira com as cores de Israel nela escrito o nome de Jesus. O estado de Israel é protegido pelo governo dos EUA, ponta-de-lança americana no Oriente Médio. Bajular o governo israelense é agradar o governo americano. O que há de comum entre os governos israelense e brasileiro? Ambos são nazistas. 
Os movimentos desses grupos em Curitiba e São Paulo são de protesto contra a quarentena e de apoio ao presidente da república. Ameaçam a saúde e a vida não só dos seus integrantes como também de toda a sociedade curitibana e paulistana. Os indivíduos que organizam e participam desses movimentos formam a minoria da população, embora numerosa e estridente. Empresários urbanos e rurais, profissionais liberais, intelectuais da direita, funcionários, religiosos, soldados, fazem parte dessa minoria à qual pertencem os evangélicos. A presidência da república está ocupada por um deles. Essa malta pretende fazer do Brasil – cujas raízes são católicas – um país protestante, à semelhança dos EUA, de modo a fortalecer o vínculo de subordinação ao governo daquele país. 
Os indivíduos desse numeroso grupo minoritário pensam que o protestantismo trará desenvolvimento econômico ao Brasil e bem-estar aos brasileiros; que o catolicismo é responsável pelo atraso do país; que a esquerda é comunista e anticristã e por isso deve desaparecer do cenário político. No discurso dos seus pastores – pilantras cujo deus é o dinheiro – abundam referências a Jesus e a Deus. O governo dos EUA também faz suas estripulias em nome de Deus. Por causa disto, anos atrás, o Papa advertiu o presidente Bush para que não justificasse os seus desatinos com o santo nome de Deus. O Papa atual adverte a humanidade contra a deificação do dinheiro. As equivocadas atitudes desses brasileiros e estadunidenses, longe de serem cristãs, são bárbaras, criminosas e reveladoras de mentalidade tacanha. Carregam a Bíblia nas mãos e Jesus na boca. Imitam profetas ungidos. Vendem a imagem de taumaturgos, terapeutas divinos. Mudar essa mentalidade mediante argumentos racionais e sensatos é o mesmo que martelar em ferro frio, mergulhar em piscina sem água; dito em linguagem bíblica: jogar pérolas aos porcos. Essa gente é movida a paixão, a fé cega, mente obnubilada numa atmosfera irracional onde vicejam o ódio, a violência, o fanatismo. Solidariedade, fraternidade, amor cristão, nem sombra. Os crentes desse tipo de religião mercadológica são o manancial dos estelionatários da fé.  
Números oficiais do Tribunal Superior Eleitoral ajudam a compreender a matéria sob a luz do cálculo matemático. 57 milhões de eleitores votaram no atual presidente. Hoje, apesar da sua notória conduta desabonadora, talvez 17 milhões ainda o apoiem e defendam. Desses 17 milhões saem os grupos que organizam e promovem manifestações pelas ruas da cidade em nome do “povo brasileiro”. No sentido jurídico e político do vocábulo, no sistema representativo, povo significa o corpo eleitoral da nação, ou seja, aquela parcela da população apta a escolher, fiscalizar e controlar os governantes. Nas eleições de 2018, o povo somava 147 milhões de eleitores. Portanto, cerca de 130 milhões de eleitores não apoiam e nem defendem o atual presidente da república atualmente. Destarte, se a maioria se organizar, tornará possível manifestações superiores aos movimentos da minoria. Considerando que o pandemônio criado por essa minoria representa ameaça à democracia, a maioria do povo brasileiro deve exibir sua força de modo convincente na defesa do estado democrático de direito. 

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