domingo, 11 de fevereiro de 2024

PERSEGUIÇÃO

Frustrada com o resultado das urnas nas eleições presidenciais de 2010 e 2014, a direita brasileira promoveu, mediante golpe politico, a destituição da vencedora. Serviu-se da maioria dos votos que possui no Congresso Nacional para, baseada em crime de responsabilidade inexistente, decretar o impeachment da presidente (2016). A seguir, no intuito de eleger o candidato tucano, a direita serviu-se de procedimentos judiciais abusivos e de expedientes escusos, em conluio com o governo dos Estados Unidos da América, para afastar do pleito o forte candidato petista, empreitada na qual teve êxito. No primeiro turno, o candidato tucano não obteve votos suficientes. Então, no segundo turno, a direita apoiou o candidato da extrema direita, que se saiu vitorioso (2018). 
A presidência da república passou a ser exercida de forma autoritária. Inaugurou-se um regime híbrido: formalmente democrático e materialmente autocrático (2019-2022). Ganhou força o movimento nazifascista militar/civil umbilicalmente avesso à democracia. Tal movimento vinha se intensificando desde a segunda década deste século XXI (2011-2020). Presidentes da República (Temer + Jair), ministros, políticos, empresários, oficiais das forças armadas, integravam esse movimento. Para se manterem no comando dos negócios do estado brasileiro, os integrantes desse movimento não titubearam em se atolar no pântano da criminalidade. 
O regime democrático estabelecido pelos representantes do povo brasileiro na assembleia nacional constituinte de 1987/1988, esteve gravemente ameaçado na etapa final do golpe: a baderna em Brasília, na Praça dos Três Poderes, no dia 08 de janeiro de 2023. Depois de sufocar a rebelião, prender em flagrante e processar os bagrinhos, o governo federal passa a processar e a prender preventivamente os tubarões. Acossados pela polícia federal e pelo ministério público federal, os tubarões paisanos e fardados reclamam de perseguição e se postam como vítimas. 
Realmente, a perseguição existe e continua em andamento, apesar do Carnaval. Contudo, nada há de ilegal. Trata-se de perseguição válida do ponto de vista político, moral e jurídico. Perseguir, no mundo dos animais racionais, significa correr atrás de alguém ou de alguma coisa, seguir de perto uma ideia, uma doutrina, com algum propósito lícito ou ilícito. Na esfera penal, a perseguição lícita é conhecida pela expressão em latim “persecutio criminis”, cujo propósito é elucidar crimes, buscar provas da materialidade e da autoria e promover a responsabilidade dos agentes. Essa tarefa cabe ao estado. 
Os procedimentos persecutórios lícitos deparam-se com barreiras constitucionais e legais. Quando isto acontece, a autoridade policial ou o agente do ministério público, pede autorização ao juiz ou ao tribunal, para realizar as necessárias diligências que exigem transposição dessas barreiras (invadir domicílio, apanhar correspondência, buscar e apreender coisas, obter dados privados e sigilosos). Uma vez judicialmente autorizada, a autoridade pública realiza as diligências. 
A perseguição oficial pode ser lícita no início e ilícita na continuidade ou no final. A conduta abusiva, arbitrária, ilegal, dos seus executores, torna ilícita a perseguição. Exemplo bem conhecido é o da operação lava-jato de Curitiba. Lícita no início, foi festejada nacionalmente, recebeu apoio da sociedade, de jornais e revistas, de emissoras de rádio e televisão e dos tribunais. Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) aliaram-se. “O Fux é nosso” afirmava com entusiasmo o procurador federal, sem ser desmentido. Barroso recebia em seu apartamento no Rio, um dos líderes da operação. Fachin, Toffoli, Carmen e Rosa davam sustentação. Notava-se naquele tribunal: (i) condescendência (ii) temor em contrariar o juiz paladino do direito e da moral (iii) oportunismo, ensejo para impedir o líder petista de assumir o governo do país. Políticos, como Roberto Requião e Álvaro Dias, ambos do Paraná, manifestavam sua adesão e simpatia à causa moralizadora. Artistas também faziam o mesmo, inclusive da música popular brasileira. Caetano Veloso, por exemplo, recebeu em seu apartamento no Arpoador, um dos líderes da operação.  
Tanto vai o jarro à fonte que um dia quebra. E o dia da criminosa operação chegou. A patifaria veio à tona e se expôs à luz do dia. Os processos judiciais emanados daquela operação foram anulados pelo STF. 
A nação brasileira testemunha agora, a lícita perseguição aos militares e civis protagonistas do golpe de estado mais recente. Os oficiais das forças armadas participantes do movimento nazifascista podem, em sua defesa,  invocar o dever de obediência às ordens dos superiores hierárquicos. Aos magistrados competirá, no devido processo legal, decidir se tal invocação exclui a punibilidade ou só atenua a pena. 
Oficiais das forças armadas não são ingênuos; sabem o que fazem; há cálculo no agir. O plano dar certo ou errado, depende das circunstâncias e do imprevisível. No caso em tela, deu errado. Restaram provas das ações e omissões ilícitas. Os agentes do golpe estavam despreocupados com isso, na certeza de que tudo daria certo. Enganaram-se por excesso de confiança. Ao subversivo movimento faltou apoio da maioria da população civil e da caserna. Civis e militares que dele participaram direta ou indiretamente, devem ser processados e punidos exemplarmente.

Nenhum comentário: