domingo, 23 de abril de 2023

LOIRA IRRITAÇÃO

A recente visita do presidente do Brasil à China e aos Emirados Árabes deixou o governo dos Estados Unidos da América (EUA) com a pulga atrás da orelha. “Estamos perdendo o Brasil”, disse Trump. Ora, para perder, antes é preciso ter. Só é possível perder aquilo que se tem, como por exemplo: a vida, a saúde, o bem-estar, a segurança, a liberdade, a propriedade. Trump e seus compatriotas falam e agem como se os EUA fossem donos do Brasil. 
As declarações do novo presidente do Brasil prestadas à imprensa após a mencionada visita (i) provocaram um terremoto no império estadunidense (ii) agitaram salas e corredores da Casa Branca (iii) irritaram o imperador, seus auxiliares internos e os seus aliados na América e na Europa. 
Os liliputianos jornalistas da média corporativa brasileira, serviçais do governo estadunidense, solidarizaram-se com a loira irritação. Endereçaram críticas ácidas ao presidente brasileiro. Ministraram lições de como bem governar o país. Qualificaram as declarações do presidente de afrontosas à nação amiga, contrárias às boas e costumeiras relações entre o Brasil e os EUA [relações de subordinação e vassalagem, convém frizar]. Pretenderam ensinar o padre a rezar missa – não em latim ou português – mas, em inglês. 
A análise racional e objetiva da situação, sem emotividade, sem aviltante submissão ao império estadunidense, sem bajular o imperador, revela que as declarações do presidente brasileiro não ofenderam a nação amiga. Tais declarações acomodam-se no quadro ético das relações internacionais e sintonizam-se com princípios constitucionais que incluem independência nacional, defesa da paz, solução pacífica dos conflitos, cooperação para o progresso da humanidade. 
Pela voz do seu atual presidente, o Brasil passou o seguinte recado aos demais países: não mais queremos nos submeter à hegemonia de outro país, seja americano, europeu, asiático ou africano; queremos amizade fraterna, paz e igualdade entre os estados. De maneira franca e corajosa, o presidente sugeriu aos EUA e aos países europeus, caso estejam real e sinceramente interessados na paz, que então não mais forneçam armas ao governo da Ucrânia. Não se apaga fogueira com gasolina. A posição do Brasil e da China a favor da paz colide com a posição dos EUA e aliados a favor da guerra. Coberta pela fuligem da guerra, a Casa Branca escureceu. 
Brasil e China posicionam-se contra a invasão da Ucrânia pela Rússia. O governo russo mostra-se disposto a negociar a paz. Sobre a credibilidade dessa disposição, convém lembrar fatos e não boatos. Na segunda guerra mundial, a Rússia e os EUA lutaram contra o nazismo do governo alemão. Agora, a Rússia mostra coerência ao lutar contra o nazismo do governo ucraíno, enquanto os EUA mostram incoerência ao lutarem a favor do nazismo do governo ucraíno. 
O pragmatismo estadunidense desconhece fronteiras éticas. A obsessão com a Rússia, desde a guerra fria, já é doença crônica da sociedade norte-americana. O Brasil não deve permanecer contagiado por essa doença. 
Quer como instrumento mediador das trocas de bens e serviços, quer como denominador comum de valores, quer como reserva de valores, a moeda é expressão econômica e política da soberania do estado moderno. Portanto, não se há de censurar o presidente brasileiro por defender a adoção de moeda nacional nos negócios bilaterais e multilaterais. Há que respeitar a vontade dos contratantes e a liberdade de escolherem o sistema monetário dentro do qual realizarão os seus negócios. Eventual dispensa da utilização do dólar é consequência disto, sem ofensa à nação amiga, simples efeito do vigor do princípio da autodeterminação dos povos.      
Constituição da República Federativa do Brasil. Artigo 4º.  
Introdução à Economia. José P. Rossetti. SP. Atlas. 1975. 5ª. 153/4.

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