domingo, 16 de abril de 2023

CELEBRAÇÃO RELIGIOSA

Nesta época do ano, os cristãos celebram os últimos dias da vida do seu grande mestre, o subversivo profeta israelita chamado Jesus, apelidado Cristo, palavra grega que significa ungido. Acreditava-se que o profeta recebera unção do pai celestial. Segundo o evangelho, Jesus recebeu unção das mãos e dos gestos de uma mulher durante reunião com os discípulos em Betânia pouco antes de entrar em Jerusalém. [O evangelho foi redigido por terceiros porque Jesus, à semelhança de Sócrates, nada deixou por escrito].
Os seguidores e a igreja elevaram o status do profeta de comum a ungido, de ungido a filho unigênito de deus, de filho unigênito a membro da trindade santa, da trindade santa a deus único e supremo. Jesus e deus fundidos na misteriosa unidade do espírito santo! 
Das narrativas dos quatro evangelhos reunidos no Novo Testamento, verifica-se que o clero judaico e a expressiva maioria do povo palestino do primeiro ano da era cristã (judeus + samaritanos + galileus) opunham-se ao movimento social, político e religioso de Jesus. Contra ele, houve resistência, conspiração e perseguição. Acusaram o profeta de blasfemo, de subverter a ordem, de se intitular rei e desafiar a autoridade de Roma. Disto, resultou a prisão e a morte de Jesus. 
A semana reservada à celebração da paixão de Jesus (última ceia, prisão, julgamento, crucifixão, morte, ressurreição) inicia-se no domingo de ramos e termina no domingo de páscoa. O primeiro domingo refere-se à entrada de Jesus em Jerusalém montado num burrinho [hoje seria um fusca] com ramos de árvore espalhados pelo caminho. Durante o trajeto até o templo, os seus discípulos chamavam-no de messias e rei sob aplausos e gritos eufóricos. No domingo seguinte realiza-se a festa anual (páscoa) em que os cristãos comemoram a ressurreição de Jesus e o nascimento da nova religião, passagem do judaísmo ao cristianismo. 
A celebração inclui missas, procissões, leituras da Bíblia, de encíclicas do Papa e de outras mensagens religiosas. A semana santa cobre 4 dias: quinta, sexta, sábado e domingo. No Brasil, cobre 7 dias: decreta-se ponto facultativo para as repartições públicas a partir da segunda-feira. A folga é aproveitada para descanso e turismo não só por brasileiros cristãos (católicos + protestantes) como também por brasileiros espíritas, judeus, muçulmanos, budistas, ateus. 
O cristianismo, doutrina religiosa elaborada a partir das ideias, crenças e ações atribuídas ao citado profeta, irradiou-se da Palestina para outras regiões. Depois da queda do império romano, essa doutrina se tornou a base ética e religiosa da civilização ocidental. Na Europa medieval, a igreja cristã alcançou poder espiritual e poder secular em extensão universal. Povos e governantes submeteram-se às ordenações da igreja e aos tribunais eclesiásticos. Raras pessoas sabiam ler e escrever, o que facilitava o domínio sobre a mente e o coração da massa popular mediante a palavra oral do sacerdote. Após a invenção de Gutemberg no século XV, o primeiro livro impresso foi a Bíblia, o que mostra a dimensão do poder e da influência da igreja cristã na Idade Média.   
No clima social daquela época, Tomás de Kempis (1380-1471), cônego da Ordem de Santo Agostinho, escreveu o livro “Imitação de Cristo”. Trata-se da coleção de 76 manuscritos dos quais cerca de 60 estavam em nome do cônego, elaborados no período de 1412 a 1471, quando ele era mestre dos noviços. Amor a deus, supremacia da fé diante da razão, prevalência da escritura sagrada diante da produção científica e da literatura comum, são os fios condutores do livro. As regras do cônego sobre a leitura das escrituras sagradas expostas no capítulo 5 do livro, foram adotadas pelo clero cristão. O livro era respeitado pela igreja católica como se fosse uma segunda bíblia. Para o leitor das escrituras sagradas, Kempes estabeleceu os deveres: (i) de buscar a verdade e não a eloquência (ii) de precaver-se contra a sutileza da linguagem (iii) de ler com humildade, simplicidade e fé, no mesmo diapasão dos evangelistas (iv) de perguntar de boa vontade (v) de ouvir calado a palavra dos santos (vi) de se abster de compreender e discutir o que se deve passar singelamente.
O cônego e o clero pretendem que, em favor da fé religiosa, as pessoas abdiquem da racionalidade. Isto significa rebaixá-las ao nível dos animais irracionais. Esta parece não ser a vontade divina. Se, como eles afirmam, deus existe e é criador de todas as coisas, de todos os seres vivos, inclusive, pois, do homem e da mulher; se deus dotou de razão exclusivamente a criatura humana; então, pretender eliminar a razão ou impedir o uso desse atributo racional pelos humanos, significa contrariar a vontade do deus criador. Deus não deu essa ferramenta ao homem e à mulher para ficar na prateleira e sim para ser utilizada. Destarte, escritura religiosa, dissertação científica, texto vulgar, todos devem ser lidos, analisados e interpretados com espírito crítico próprio da razão humana.        
Bíblia. Novo Testamento. Mateus 26: 6/13. Marcos 11: 8/10 + 14:3/9. Lucas 19: 36/38).
Imitação de Cristo. Tomás de Kempis. Petrópolis/RJ. Editora Vozes. 2015.  

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