domingo, 5 de fevereiro de 2023

CAOS x ORDEM

Os graves acontecimentos de 08 de janeiro de 2023, em Brasília, despertaram a consciência do povo brasileiro. O caos desestabiliza o indivíduo e a sociedade. A desordem aumenta o valor da ordem. A tempestade traz o anseio pela calmaria. A guerra faz crescer o amor pela paz. Os turbulentos incomodam os pacíficos. Os criminosos ameaçam a vida, a honra, a liberdade e o patrimônio dos cidadãos e violam a ordem jurídica em vigor no estado. De modo instintivo, as pessoas evitam confusão e buscam ambiente ordeiro.
O apego das pessoas a uma atmosfera de ordem e segurança explica a duração das ditaduras civis e militares em países americanos, asiáticos, africanos e europeus. Por saber desse apego, os inimigos do governo democrático promovem o caos na sociedade para depois se apresentarem como pacificadores. Ante a nova ordem por eles instituída, a população dá graças a deus pela volta da normalidade e da tranquilidade. Mediante exibição de poderio bélico, propaganda, intimidação dissimulada e ações psicológicas, os espertalhões persuadem a população sobre a bondade do novo regime político, informam os atos legais que praticam e ocultam as suas espertezas, imoralidades e ilegalidades. Eles fazem crer que as forças de segurança sequestram, prendem, torturam e matam apenas pessoas perigosas, terroristas, subversivas, diabólicas, indignas da cidadania. Ocultar e escamotear a verdade são suas tarefas permanentes nos planos interno e internacional.    
O vocábulo ordem tem diversos significados: (i) mando autoritário, determinação superior (ii) disposição metódica das coisas fundada em certas relações no mundo material e no mundo espiritual (iii) arranjo das coisas e ideias conforme a necessidade, a utilidade e/ou o interesse (iv) sequência hierarquizada segundo critérios quantitativos e qualitativos e princípios lógicos, éticos e estéticos (v) leis constituintes da estrutura e do funcionamento das coisas da natureza e da sociedade. 
Grande parte da humanidade acredita na existência de um mundo espiritual povoado por espíritos e governado por entidades poderosas sob a autoridade suprema dos deuses. Pessoas e instituições religiosas e místicas acreditam numa hierarquia celestial composta de anjos, arcanjos, principados, potestades, querubins e serafins com suas próprias atribuições e posições no céu. Colocam deus na cúpula ou no trono. Oportuna, gentil, inteligente e sensata a opinião de Bertrand Russell sobre tal assunto: O credo metafísico é uma consequência equivocada das emoções, embora estas emoções, colorindo e informando todos os outros pensamentos e sentimentos, inspirem o que há de melhor no homem
Os cientistas estudam a natureza como estrutura material concreta ordenada segundo regularidades determinantes. Ao expor especulações da Física sobre a ordem do universo, Norbert Wiener cita a oposição entre a teoria da contingência de Gibbs e a do determinismo rígido de Newton. Segundo Gibbs, há um elemento fundamental de acaso na textura do universo. À medida que aumenta a entropia, o universo e seus sistemas fechados tendem (i) a deteriorar e a perder a nitidez (ii) a passar de um estado de mínima a outro de máxima probabilidade (iii) a passar de um estado de ordem em que existem formas e distinções para um estado de caos e mesmice. No universo extenso, menos provável é a ordem e mais provável é o caos. Entretanto, nele há enclaves de ordem onde a vida encontra o seu habitat. Sem essa ordem cósmica nesse espaço limitado, a vida seria impossível. 
Pesquisas etnográficas e sociológicas constataram o modus vivendi dos humanos sempre em comunidade. Isto significa a prevalência do gregário, da ordem agregadora em nível social fundada na experiência, no hábito, no costume, nas leis da natureza e nas regras da comunidade. A ordem nos enclaves do universo, desde a escala atômica até a escala planetária, está presente no corpo humano. Desse condicionamento psicossomático dos humanos resulta algum tipo de ordem nas relações sociais, alguma forma de distribuição e aplicação do poder na família, na sociedade e no estado.
Diferentes dos seres vivos irracionais, os seres vivos racionais têm a liberdade de mudar o tipo de organização social em que vivem. Fazem-no de acordo com as suas necessidades, utilidades, interesses, vontades e conveniências. O instinto de conservação da espécie (dado natural), a cooperação econômica (dado racional), os laços afetivos (dado emocional), a obediência aos hábitos, costumes, regras morais e jurídicas (dado pragmático), a proposição de fins (dado teleológico) estão entre os fatores constitutivos das instituições humanas. Sem essa ordem a sociedade mergulha no caos. 
A paz, a estabilidade e o progresso dependem, tanto na vida privada como na vida pública, não só do esforço físico e intelectual da pessoa como também do respeito aos princípios éticos e jurídicos estruturadores da ordem vigente. Os desordeiros confrontam-se com o mecanismo de defesa da sociedade. No tocante à democracia, a impunidade dos seus inimigos é desastrosa. A apuração da responsabilidade penal dos agentes do caos é necessária a fim de prevenir dissabores futuros aptos a extinguir a forma democrática de governo.   


Nenhum comentário: