quinta-feira, 24 de setembro de 2020

PLANO DO PT

O Partido dos Trabalhadores (PT) lançou na manhã de segunda-feira, 21/09/2020, o seu Plano de Reconstrução e Transformação do Brasil. A cerimônia de lançamento foi presencial e virtual. Dos participantes que fizeram uso da palavra, a maioria não havia lido o plano. O desconhecimento do texto deve-se, em parte, à sua enorme extensão, o que desestimula a leitura: 210 páginas! Isto lembra o catatau que o advogado da presidente Rousseff protocolou no Supremo Tribunal Federal: 400 páginas! Mais que petição, um livro que poucos magistrados têm a disposição e a paciênca de ler. 

Centenas de pessoas participaram da elaboração do plano, segundo informou o presidente da fundação. Isso talvez explique a prolixidade e cansativas repetições. Da costura das contribuições oriundas de diferentes e numerosas pessoas resultou uma colcha de retalhos. Certamente, para não melindrar os diversos autores, os organizadores pretenderam manter fidelidade à forma e ao conteúdo das contribuições, quiçá preocupados em não ferir a vaidade e a suscetibilidade de qualquer deles. No início do texto foram citadas dezenas de pessoas que ocupam a direção do partido, da fundação, dos núcleos de acompanhamento político, das comissões executivas e das secretarias. O plano tem duas apresentações. A primeira subscrita pelos presidentes do PT e da Fundação Perseu Abramo, com 13 páginas. Segue-se o sumário, com 3 páginas. Depois, vem a segunda apresentação com 10 páginas. Seguem-se as 3 partes em que o plano foi dividido, com 156 páginas e, por fim, um anexo com 28 páginas sobre os 13 anos do PT no governo federal. [A lei orçamentária da União Federal/2020 com seus anexos tem menos de 40 páginas!].

A primeira parte do plano tem como tema “outro mundo é preciso, outro Brasil é necessário”. Aborda as crises mundial e local. Trata da falta de alimento e de apoio à agricultura familiar; da proteção à vida humana e da pandemia; das desigualdades e da justiça social. Critica o autoritarismo e o capitalismo. Exalta governos petistas. Defende a soberania nacional, América Latina integrada, democracia radical, refundação do estado de direito. Afirma necessário: (i) resgatar a dignidade dos indígenas e quilombolas (ii) maior proteção às mulheres, à juventude negra, à comunidade LGBTQI (iii) impedir a ascensão da extrema direita no cenário político brasileiro (iv) eliminar os efeitos do sistema escravocrata que até hoje perduram (v) desenvolvimento sustentável, reformas bancária, tributária, administrativa e agrária (vi) serviços públicos melhores (vii) nova concepção de cidade (viii) estado democrático forte, eficiente e transparente (ix) acesso à tecnologia da informação e da comunicação, inteligência artificial, conhecimento socializado.

A segunda parte do plano tem como tema “mudanças para o presente” e explica o “plano emergencial de proteção à vida e reconstrução do Brasil”. Estabelece medidas para: (i) proteção da vida e do bom viver (ii) defesa do trabalhador e da renda com bem-estar social (iii) garantia de acesso a bens comuns (iv) ampliação de acesso a bens públicos (v) retomada do desenvolvimento econômico (vi) defesa do estado e da democracia. 

A terceira parte do plano tem como tema “mudanças para o futuro” e explica o “plano estrutural de transformação do Brasil” que consiste nas seguintes propostas: (i) desenvolvimento social e novo período de afirmação de direitos (ii) desenvolvimento sustentável e transição ecológica para a nova sociedade do século XXI (iii) desenvolvimento econômico e novo projeto de transformação das estruturas social, produtiva e ambiental (iv) soberania nacional e nova inserção do Brasil no mundo (v) radicalização da democracia e refundação do estado.   

O plano harmoniza-se com a Constituição da República Federativa do Brasil. Exibe estilo multifacetado, um tanto realista, outro tanto idealista; um tanto modesto, outro tanto megalômano; um tanto progressista, outro tanto demagógico; um tanto moderado, outro tanto radical. Perpassam-no pensamento socialista e tom guerreiro e messiânico. Linguagem com estrangeirismos sombreando o idioma português (concessão ao colonialismo cultural) e lances rebarbativos. Plano pronto, acabado e publicado, porém, como disseram os expositores da casa, aberto aos “aperfeiçoamentos e ajustes” porventura sugeridos por progressistas, inobstante as divergências e o caráter autônomo dos partidos políticos. A hierarquização sugerida por ex-governador do Paraná mostra-se adequada à fase de execução do plano. Prioridades estabelecem-se na execução e não na elaboração do plano, porque variam nas diferentes regiões do território e nos milhares de municípios. Na esfera federal, que inclui problemas nacionais e internacionais, as prioridades nem sempre são as mesmas das esferas estadual e municipal. Daí, a necessidade de traçar só diretrizes gerais. Cada governo petista estabelecerá as prioridades específicas dentro da sua jurisdição administrativa em sintonia com as gerais. Quiçá por estarem cientes disto, os expositores da casa disseram que o plano estava inacabado e seria aperfeiçoado pela colaboração vinda de dentro e de fora do partido. 

Sem cansativas e inúteis repetições, uma síntese com 10 ou 20 páginas seria suficiente; discurso menos doutrinário e ideológico, mais prático e objetivo; menos cabeça no ar e mais pé no cháo. Os princípios e ideais socialistas estão suficientemente expostos no estatuto e no código de ética do partido. Sob este aspecto, o plano é redundante. Suficiente seria, após prévia, clara e breve exposição daquilo que se pretende reconstruir e transformar, responder às perguntas: O que fazer? Como fazer? Quais os meios disponíveis? A brevidade estaria justificada (i) por ser contrária à verborragia (ii) porque os problemas que afligem a nação brasileira no campo da política, da economia, do trabalho, da família, da moradia, do meio ambiente, da saúde, da educação, da cultura, da infraestrutura, do esporte, dos direitos humanos, das relações internacionais, são do conhecimento público e notório.

As críticas necessárias, úteis e justas aos governos da direita estão deslocadas. Os meios de comunicação social são o lugar próprio e adequado. Divulga-se o plano ao mesmo tempo em que se faz propaganda partidária e oposição ao governo. Os organizadores do plano mencionaram o comum objetivo dos partidos da esquerda de derrotar os da direita na disputa por cargos públicos eletivos. Evitaram colocar o PT como hegemônico nessa luta. A esquerda está conseguindo o que parecia impossível: acordo unificador na batalha contra a extrema direita. Tão logo atingido o alvo, cada partido voltará ao seu quadrado.  

Na campanha eleitoral em curso, mister cuidar da distribuição do fundo eleitoral aos diretórios municipais, onde os candidatos a prefeito e a vereador dispõem de poucos recursos. O acúmulo de recursos financeiros na cúpula do partido para disputa de cargos federais não se compadece com o espírito democrático e o senso de justiça. Distribuição equitativa, proporcional, fiscalizada e controlada é imperativo da honestidade e da solidariedade internas. Assim como a família é a célula da sociedade, o município é a célula do estado. 

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