segunda-feira, 13 de maio de 2019

CARTA AO ALÉM

Penedo, Itatiaia/RJ, 13 de maio de 2019.

Prezado João.

Neste 131º aniversário da abolição oficial da escravatura no Brasil, sirvo-me da via telepática para ditar e escrever estas mal traçadas linhas. Espero que elas te encontrem bem. Enquanto vou escrevendo no papel e ditando telepaticamente, tu podes ir lendo, ouvindo e respondendo. Está bem assim? Considerando que deus escreve certo por linhas tortas, acredito que eu, mísero mortal, possa merecer complacência por minhas linhas singelas. 
Jussara e eu estamos bem, assim como as crianças. O menino mais novo está com 40, a menina do meio está com 44 e o menino mais velho com 47 anos de idade. Todos bem na medida do possível neste conturbado mundo terráqueo. Faço votos que os teus familiares também estejam bem. 
Tenho a grata satisfação de informar ao meu prezado amigo que a tua profecia se realizou. Pelo menos, uma grande parcela do povo sentiu saudade do governo militar. Adivinhe só!
Espere ... Tu não precisas responder. O desafio é retórico e não para tu adivinhares de fato. O meu repto foi apenas para despertar a tua curiosidade e aumentar a tua atenção. O que eu quero te informar é incrível! Depois de 35 anos, os militares voltaram ao governo. Sabe lá o que é isto? Sim, senhor! E quer saber mais?
João, deixe eu terminar de escrever e ditar! Não... não foi novo golpe. Bem... mais ou menos. Como? Pelo voto popular, cara! 57 milhões de eleitores! Tá OK. O “mais ou menos” fica por conta dos atos da campanha eleitoral. O que aconteceu? Tu aí nessa dimensão sem fronteiras não sabes? Os teus companheiros de farda intimidaram meio mundo. Até colocaram tanques em frente ao supremo tribunal. Os togados dobraram a espinha. 
João... espere... paciência... eu explico. Esta conversa será publicada no meu blog. Portanto, não posso usar os verbos e as expressões que tu queres. Pare com isso e permita que eu prossiga nos ulteriores desta missiva.
Avalanche de notícias falsas e ameaças, inclusive por meio das redes sociais na internet. Sim, dileto amigo, agora utilizam a rede de computadores. Tu precisavas ver! Os adeptos da candidatura militar usavam de violência nas ruas e em qualquer lugar. Se tu estivesses transitando com qualquer pano de cor vermelha, fosse boné, camisa ou lenço, tu levavas pau na moleira. A coisa ficou feia. A barbárie retornou. 
Por que tudo isto? Ora, João, tu conheces bem essa gente. Lembra da Alemanha da década de 1930-1940? Pois é. Aqui ficou igual. O objetivo era impedir a candidatura do político civil cuja vitória era tida como certa. Quem era? O sapo barbudo, cara. Eu sei, tu não precisas me lembrar de que o apelido foi dado por Brizola. O metalúrgico pobre, nordestino, sem diploma universitário, já tinha sido presidente e seria novamente eleito. A direita, raivosa e preconceituosa, não tolerou o que entende por anômala, insuportável e afrontosa inversão de posições na estratificação social. Armou um processo judicial fraudulento, colocou o concorrente na prisão e, assim, cassou os seus direitos políticos. Com medo dos quartéis, os tribunais mantiveram a condenação e a prisão (até porque a magistratura federal se tornou, de fato, um informal partido político de direita, driblando a vedação constitucional e legal).
Destarte, o candidato militar saiu vitorioso das urnas. Quem? Não, meu caro João, não é general e sim um reformado capitão do exército. Sim, o mesmo que Geisel qualificou de mau militar e que pretendia explodir o gasômetro do Rio de Janeiro. Pra tu veres como são as coisas neste país. General é o vice-presidente eleito.
E agora, João? Tá bem. Não vou plagiar Drumond. Agora, esse troglodita assumiu a presidência da república, tem um guru de baixo nível, filhos políticos aloprados, ministério medíocre, incapacidade administrativa, pachorrenta indisposição para governar e disposição criminosa de guerrear país vizinho e amigo. Revela, às escâncaras, propósito de passar os negócios de estado ao governo dos EUA e de seguir orientação da CIA, o que representa grave ameaça à soberania nacional.
Porra, João... escute... mas que diabo! Calma! Deixe eu falar. Não era minha intenção perturbar os teus momentos de merecido sossego aí nessa dimensão onde te encontras. Não, João, por enquanto não há necessidade de prender e arrebentar. Diante das graves e evidentes ofensas aos interesses nacionais, basta a Câmara dos Deputados autorizar e o Senado decretar o impedimento do indecoroso presidente.
A carta ficou longa. Hora de encerrar. O quê? Não. A corrupção e a roubalheira não terminaram e a conjuntura indica que não terminarão tão cedo. As maiores? Aconteceram no governo Cardoso (1995-2002). Teve general indignado que xingou o presidente FHC com palavras de baixo calão. Disse horrores. FHC entubou. Mas, isto é assunto para outra carta. Informo-te, ainda, sucintamente, três dados estatísticos: [1] nos últimos 5 anos, o país regrediu 150 anos nas relações de trabalho e nas relações políticas (internas e internacionais) [2] nos últimos 10 anos, o pessoal da direita tem se comportado como se estivesse na Idade da Pedra [3] nos últimos 15 anos, o pessoal da esquerda anda sob os efeitos soporíferos e entorpecentes da picada da mosca azul.     
Aceite o meu fraternal e saudoso abraço.
Antonio.

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