quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

PINGOS E RESPINGOS

Propina. 
No século XX (1901-2000), a república brasileira consolidou o costume da propina nos negócios do setor público com o setor privado, nas esferas municipal, estadual e federal. Nos contratos celebrados, o superfaturamento é a regra. O empreiteiro paga a propina à autoridade e/ou ao funcionário público e compensa o valor respectivo no preço da obra ou do serviço. Em alguns negócios, parte da propina destina-se ao partido político da situação (PSDB, PMDB, PTB, PDT, PT, PP). A administração pública paga tal preço. No final da trilha, pois, o dinheiro da propina sai do bolso do contribuinte. Apurar a responsabilidade civil, penal e administrativa de todos os participantes do escuso negócio representa mudança radical na costumeira impunidade e revoluciona a mentalidade moralmente podre da grande parcela do povo brasileiro (governantes e governados).

Blindagem ilegal. 
A investigação deve incluir todos os envolvidos na atividade criminosa, indistintamente. A blindagem de alguns bandidos do colarinho branco fere a isonomia. Admissível: investigação plena enquanto procedimento legal e necessário à segurança pública e aos bons costumes. Inadmissível: abuso de autoridade, excesso de poder e arbitrariedade.

Teoria do domínio do fato.
(Hans Welzel, 1939 + Claus Roxin, 1963). 
Materialidade: crime praticado = tipo de conduta que a norma legal define como criminoso. Autoria: todo aquele que pratica o crime. Responsabilidade: segundo a idade, a capacidade mental, o grau de culpa, o nexo de causalidade e as circunstâncias que emergirem dos fatos devidamente provados. Autor imediato: quem executa o ato criminoso. Autor mediato próximo: quem de algum modo colabora na execução do delito. Autor mediato remoto: quem ordena a ação criminosa. Não basta a ascendência do mandante sobre o autor imediato. Necessário provar que houve a ordem. Versão brasileira dessa teoria dada pelo Supremo Tribunal Federal: O superior hierárquico, como titular do poder de decisão, tem evidente conhecimento da ação criminosa; logo, também deve ser punido. A prova do nexo é dispensável. Bastam os indícios.

Teoria do predomínio do fato novo. 
(Carl Schmitt, 1929). 
Poder de decisão precede o comando jurídico. Em face de uma situação nova, ditadura soberana substitui a Constituição enquanto uma nova ordem não se formalizar e se legitimar. Do estado constitucional transita-se para o estado de exceção. No Sul do Brasil, vige essa doutrina do nacional-socialismo (nazismo). O preceito constitucional que proíbe juízo e tribunal de exceção perdeu a eficácia.Os princípios fundamentais da república e o conceito de prova foram lançados no cadinho do relativismo. As normas jurídicas ordinárias são substituídas por regras estabelecidas casuisticamente por procuradores, juízes e tribunais, decorrentes de situações consideradas novas segundo a ótica, o interesse e a interpretação dos seus adeptos. Nesse contexto, o juiz e o tribunal acumulam funções legislativa e judiciária; editam regras simultaneamente ao julgamento dos casos concretos.

Lei e teoria. 
 No sistema penal brasileiro prevalece a lei. “Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”. “Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. 
A teoria (explicativa), a doutrina (persuasiva) e a jurisprudência (orientadora) não substituem a lei. Quando a lei penal for omissa, cabe exclusivamente ao legislador preencher a lacuna, se lhe parecer conveniente e oportuno. Enquanto vigorar o princípio fundamental da separação dos poderes da república, tal preenchimento não cabe a teórico, doutrinador, juiz ou tribunal. 
A lei penal brasileira distingue autoria e participação. [1] “O resultado de que depende a existência do crime somente é imputável a quem lhe deu causa”. [2] “Quem de qualquer modo concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida da sua culpabilidade”. Quando duas ou mais pessoas concorrem para a ação criminosa, a pena pode ser aplicada de modo diferenciado, segundo a importância da participação de cada uma delas. (Constituição: 5°, XXXIX, LIV + Código Penal: 1°, 13, 29).

Prova e Ministério Público
A prova é da essência do devido processo legal. O juízo assenta-se na prova cujo exame requer prudência, ciência e consciência. Desse exame, o juiz forma a sua convicção. Sem prova, ao invés de convicção há mera suposição imprestável para processar e condenar o acusado. “Havendo provas, todas serão investigadas”, diz o Procurador-Geral da República na tentativa de, sob a rubrica do “combate à corrupção”, encobrir a seletividade e a indecorosa motivação partidária. Prova não se investiga; possível, apenas, impugna-la. Prova resulta da investigação. Investigar, na área criminal, é seguir vestígios, buscar informações, examinar pessoas e coisas, relacionar dados, tudo no propósito de obter prova. O Procurador-Geral poderia dizer de maneira consentânea com a ética e o direito: havendo indícios, haverá investigação; obtidas as provas, o Ministério Público oferecerá denúncia, doa a quem doer. O processo criminal instaurar-se-á por decisão do juiz ou do tribunal.

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