sábado, 12 de março de 2016

O JUIZ E A POLITICA



O homem é um animal político, dizia Aristóteles, o que supõe uma natureza gregária, embora existam homens nômades, isolados ou em grupos, que não permanecem no mesmo território por muito tempo, nem fundam ou organizam cidades.
Juiz é um ser humano gregário, reside numa cidade. Como pessoa, o juiz é capaz de direitos e obrigações na vida civil; como autoridade, pode interpretar as leis, declarar e aplicar o direito na solução das controvérsias submetidas à sua apreciação.
Política é arte de governar a cidade. Por extensão, arte de governar o Estado ou dirigir com autonomia qualquer instituição pública ou privada. Tal arte é praticada mediante a vontade (da férrea à pastosa) e a inteligência (da genialidade à burrice), animada por virtudes e vícios, regulada por princípios e regras que moldam determinado regime. Essa arte requer poder (aptidão do sujeito para decidir, mandar e ser obedecido; submissão de uma vontade a outra dominante). No complexo organismo estatal democrático, o poder é exercido por distintos órgãos: legislativo, executivo, judicial, moderador.
Como animal político, inserido na dinâmica social, o juiz relaciona-se no meio em que vive e adquire visão da realidade dentro da qual distribui justiça. Isto lhe fornece parâmetros para bem exercer a sua função e oferecer soluções justas. No exercício do poder do Estado, o juiz funciona como guardião da ordem jurídica.
No Brasil, desse poder político do juiz está excluída atividade política partidária. Ao juiz brasileiro é defeso filiar-se a um partido político e tampouco agir como se filiado fosse. Todo juiz tem sua cor política favorita e vota no partido e no candidato da sua preferência. Contudo, ao exercer a judicatura nos casos concretos, o juiz tem o dever ético e jurídico de se despir da capa partidária e vestir a toga de magistrado a fim de julgar de acordo com os fatos e o direito, de modo honesto e imparcial, segundo as regras processuais vigentes. O juiz deve honrar a toga e vigiar para não degrada-la na arena das paixões políticas e dos interesses econômicos.
Os abusos cometidos pelo juiz curitibano, na denominada operação lava jato, são deprimentes, enxovalham a magistratura como instituição. O clímax foi atingido no dia 04/03/2016, quando o ex-presidente da república, à primeira hora da manhã, foi detido no seu domicílio em São Bernardo do Campo e conduzido coercitivamente até o posto da polícia federal no Aeroporto de Congonhas, na capital paulista.
A condução do ex-presidente foi ilegal e abusiva. Os pressupostos fáticos estavam ausentes. Além disto, pendia questão sobre as atribuições das autoridades processantes no caso. Evidenciou-se a intenção de humilhar o investigado. O poder jurídico do magistrado serviu de cortina de fumaça para ocultar a arbitrariedade.
O mandado coercitivo está previsto no código de processo penal. O seu deferimento depende da desobediência a uma intimação expedida por autoridade competente. No caso em tela, autoridades diferentes investigam os mesmos fatos. Diante do conflito de atribuições, o investigado tem o direito de recorrer ao Judiciário para saber a qual das autoridades deverá obedecer. Não se cuida de expediente protelatório, pois o investigado não deve ser tratado como joguete nas mãos de autoridades diversas. Precedentes intimações foram atendidas sem necessidade de coerção.
A ministra do Supremo Tribunal Federal, cuja trilha ascensional na magistratura se deve mais à beleza do que à inteligência, foi infeliz ao indeferir o pedido de hábeas corpus impetrado pelo patrono do ex-presidente. Experiente no direito do trabalho, ela mostrou inexperiência no direito penal. A lógica e o bom senso recomendavam a suspensão dos trâmites dos inquéritos até que fosse solucionado o conflito de atribuições instaurado entre os órgãos de persecução.
Há polícia, promotor e juiz em São Paulo. A autoridade paranaense não pode invadir a jurisdição da autoridade paulista; deve servir-se de carta precatória. Domiciliado no Estado de São Paulo, aqui o investigado há de ser ouvido e não no Paraná. Cabe à autoridade paulista expedir o mandado de intimação quando deprecada. No momento, pouco importa se o investigado é culpado ou inocente. O devido respeito à Constituição e à Lei pelas autoridades processantes é o que mais importa.
Em tempo de paz, as pessoas têm liberdade para se locomover no território nacional. Ninguém será processado senão pela autoridade competente e nem privado da sua liberdade e dos seus bens sem o devido processo legal. (CR 5º, XV, LIII, LIV).
O juiz curitibano precipitou-se. As autoridades processantes deviam aguardar a solução do conflito de atribuições (decisão judicial sobre a qual delas cabe investigar os mesmos fatos). O juiz curitibano jura fidelidade à democracia, mas age de modo antidemocrático e antijurídico. Assim procedendo, revela hipocrisia e perjúrio.
O conluio entre o juiz, os membros do ministério público e a polícia é grave ofensa aos princípios constitucionais em vigor. A expedição de mais de 100 mandados coercitivos pelo mesmo juiz na mesma operação é indício de abuso de autoridade.
Na entrevista concedida a um jornalista, em 23/01/2016, na sua residência em Curitiba, publicada no Correio da Manhã e na rede de computadores, o juiz curitibano já havia manifestado, em antecipado julgamento, fora do devido processo legal, a intenção de prender o ex-presidente da república. Nessa entrevista, o juiz curitibano afirma: (1) que está jurado de morte; (2) que vai prender Lula; (3) que tem provas documentais reunidas em 14 mil páginas; (4) que precisa do apoio popular por causa do prestígio do ex-presidente. Recomenda a utilização da internet para incentivar a população a pedir a prisão de Lula. Diz que “precisamos” (assim, no plural) de uma postagem que atinja, no mínimo, um milhão de compartilhamentos. Da sórdida campanha participam redes de emissoras particulares de TV.
O juiz, os procuradores e os policiais da “força-tarefa” curitibana mostram gostar do palco e dos holofotes. Apreciam dar espetáculo. Exibem sua veia artística. Entretanto, o lugar mais adequado para atuação de artistas circenses não é o Fórum e sim o picadeiro. Do processo forense, que prometia ser um dos mais importantes da república, fizeram um circo e encenaram truanias. Punir a corrupção virou mero pretexto, acintoso deboche. Dos ilícitos noticiados, excluíram as pessoas que lhes eram politicamente simpáticas e incluíram apenas as que lhes eram antipáticas. Deixaram marca do artifício: a busca de um resultado previamente determinado segundo prévio juízo de culpa e prévia intenção de constranger pessoas previamente escolhidas. 
A evidente finalidade dessa ignomínia é desmoralizar o ex-presidente da república e a atual presidente. Por trás dessa finalidade e do procedimento policial e judicial respectivo, repousa o interesse das petroleiras estrangeiras e do capital especulativo internacional, de cuja defesa se encarregam os sicofantas no Congresso Nacional, vermes que corroem os intestinos da nação.   

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