O homem é um animal político, dizia Aristóteles, o que
supõe uma natureza gregária, embora existam homens nômades, isolados ou em
grupos, que não permanecem no mesmo território por muito tempo, nem fundam ou
organizam cidades.
Juiz é um ser humano gregário,
reside numa cidade. Como pessoa, o
juiz é capaz de direitos e obrigações na vida civil; como autoridade, pode
interpretar as leis, declarar e aplicar o direito na solução das controvérsias
submetidas à sua apreciação.
Política é arte de governar a cidade.
Por extensão, arte de governar o Estado ou dirigir com autonomia qualquer
instituição pública ou privada. Tal arte é praticada mediante a vontade (da férrea à pastosa) e a
inteligência (da genialidade à burrice), animada por virtudes e vícios, regulada por
princípios e regras que moldam determinado regime. Essa arte requer poder
(aptidão do sujeito para decidir, mandar e ser obedecido; submissão de uma
vontade a outra dominante). No complexo organismo estatal democrático, o poder
é exercido por distintos órgãos: legislativo, executivo, judicial, moderador.
Como animal político, inserido na dinâmica social, o
juiz relaciona-se no meio em que vive e adquire visão da realidade dentro da
qual distribui justiça. Isto lhe fornece parâmetros para bem exercer a sua
função e oferecer soluções justas. No exercício do poder do Estado, o juiz
funciona como guardião da ordem jurídica.
No Brasil, desse poder político do juiz está excluída
atividade política partidária. Ao juiz brasileiro é defeso filiar-se a um
partido político e tampouco agir como se filiado fosse. Todo juiz tem sua cor
política favorita e vota no partido e no candidato da sua preferência. Contudo,
ao exercer a judicatura nos casos concretos, o juiz tem o dever ético e
jurídico de se despir da capa partidária e vestir a toga de magistrado a fim de
julgar de acordo com os fatos e o direito, de modo honesto e imparcial, segundo
as regras processuais vigentes. O juiz deve honrar a toga e vigiar para não
degrada-la na arena das paixões políticas e dos interesses econômicos.
Os abusos cometidos pelo juiz curitibano, na
denominada operação lava jato, são
deprimentes, enxovalham a magistratura como instituição. O clímax foi atingido
no dia 04/03/2016, quando o ex-presidente da república, à primeira hora da
manhã, foi detido no seu domicílio em São Bernardo do Campo e conduzido coercitivamente
até o posto da polícia federal no Aeroporto de Congonhas, na capital paulista.
A condução do ex-presidente foi ilegal e abusiva. Os
pressupostos fáticos estavam ausentes. Além disto, pendia questão sobre as
atribuições das autoridades processantes no caso. Evidenciou-se a intenção de
humilhar o investigado. O poder jurídico do magistrado serviu de cortina de
fumaça para ocultar a arbitrariedade.
O mandado coercitivo está previsto no código de
processo penal. O seu deferimento depende da desobediência a uma intimação
expedida por autoridade competente. No caso em tela, autoridades diferentes
investigam os mesmos fatos. Diante do conflito de atribuições, o investigado
tem o direito de recorrer ao Judiciário para saber a qual das autoridades
deverá obedecer. Não se cuida de expediente protelatório, pois o investigado
não deve ser tratado como joguete nas mãos de autoridades diversas. Precedentes
intimações foram atendidas sem necessidade de coerção.
A ministra do Supremo Tribunal Federal, cuja trilha
ascensional na magistratura se deve mais à beleza do que à inteligência, foi
infeliz ao indeferir o pedido de hábeas
corpus impetrado pelo patrono do ex-presidente. Experiente no direito do
trabalho, ela mostrou inexperiência no direito penal. A lógica e o bom senso
recomendavam a suspensão dos trâmites dos inquéritos até que fosse solucionado
o conflito de atribuições instaurado entre os órgãos de persecução.
Há polícia, promotor e juiz em São Paulo. A autoridade paranaense
não pode invadir a jurisdição da autoridade paulista; deve servir-se de carta
precatória. Domiciliado no Estado de São Paulo, aqui o investigado há de ser
ouvido e não no Paraná. Cabe à autoridade paulista expedir o mandado de
intimação quando deprecada. No momento, pouco importa se o investigado é
culpado ou inocente. O devido respeito à Constituição e à Lei pelas autoridades
processantes é o que mais importa.
Em tempo de paz, as pessoas têm liberdade para se
locomover no território nacional. Ninguém será processado senão pela autoridade
competente e nem privado da sua liberdade e dos seus bens sem o devido processo
legal. (CR 5º, XV, LIII, LIV).
O juiz curitibano precipitou-se. As autoridades
processantes deviam aguardar a solução do conflito de atribuições (decisão
judicial sobre a qual delas cabe investigar os mesmos fatos). O juiz curitibano
jura fidelidade à democracia, mas age de modo antidemocrático e antijurídico.
Assim procedendo, revela hipocrisia e perjúrio.
O conluio entre o juiz, os membros do ministério
público e a polícia é grave ofensa aos princípios constitucionais em vigor. A expedição de
mais de 100 mandados coercitivos pelo mesmo juiz na mesma operação é indício de
abuso de autoridade.
Na entrevista concedida a um jornalista, em
23/01/2016, na sua residência em Curitiba, publicada no Correio da Manhã e na
rede de computadores, o juiz curitibano já havia manifestado, em antecipado
julgamento, fora do devido processo legal, a intenção de prender o
ex-presidente da república. Nessa entrevista, o juiz curitibano afirma: (1) que
está jurado de morte; (2) que vai prender Lula; (3) que tem provas documentais
reunidas em 14 mil páginas; (4) que precisa do apoio popular por causa do
prestígio do ex-presidente. Recomenda a utilização da internet para incentivar
a população a pedir a prisão de Lula. Diz que “precisamos” (assim, no plural)
de uma postagem que atinja, no mínimo, um milhão de compartilhamentos. Da
sórdida campanha participam redes de emissoras particulares de TV.
O juiz, os procuradores e os policiais da
“força-tarefa” curitibana mostram gostar do palco e dos holofotes. Apreciam dar
espetáculo. Exibem sua veia artística. Entretanto, o lugar mais adequado para
atuação de artistas circenses não é o Fórum e sim o picadeiro. Do processo
forense, que prometia ser um dos mais importantes da república, fizeram um
circo e encenaram truanias. Punir a corrupção virou mero pretexto, acintoso deboche. Dos ilícitos
noticiados, excluíram as pessoas que lhes eram politicamente simpáticas e
incluíram apenas as que lhes eram antipáticas. Deixaram marca do artifício: a
busca de um resultado previamente determinado segundo prévio juízo de culpa e prévia
intenção de constranger pessoas previamente escolhidas.
A evidente finalidade dessa ignomínia é desmoralizar o
ex-presidente da república e a atual presidente. Por trás dessa finalidade e do
procedimento policial e judicial respectivo, repousa o interesse das
petroleiras estrangeiras e do capital especulativo internacional, de cuja
defesa se encarregam os sicofantas no Congresso Nacional, vermes que corroem os
intestinos da nação.
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