domingo, 16 de dezembro de 2012

MENSALÃO 5


Ainda não foi nesta quarta-feira (12/12/12) o esperado encerramento da ação penal 470, processo apelidado “mensalão” em trâmites pelo Supremo Tribunal Federal - STF desde 2005.  Inesperado problema de saúde do ministro que votaria por último impediu o desfecho. A questão de mérito já foi julgada. Aos réus condenados foram aplicadas as penas correspondentes aos crimes praticados. Nesta fase derradeira, o tribunal cuida dos efeitos da condenação. Desse cuidado já resultou a perda, a um dos condenados, do cargo de prefeito de município do Estado do Paraná. Quanto aos condenados que exercem cargos de deputado federal e senador, houve empate na votação até o momento. Quatro ministros entendem que ao STF compete decidir sobre a perda do mandato como decorrência da condenação em sede criminal; outros quatro entendem que a decisão cabe ao Legislativo em decorrência da soberania popular exercida pelos parlamentares como representantes do povo. Ambos os lados apóiam-se na Constituição da República.

Para decidir a perda do mandato parlamentar há duas vias independentes e igualmente válidas: a administrativa (disciplinar e punitiva) e a judicial, ambas tributárias do devido processo jurídico constitucionalmente assegurado.

A via administrativa começa e se esgota no âmbito do Legislativo. Nela se apura a responsabilidade política do parlamentar. Os deputados e senadores perdem os respectivos mandatos em qualquer das hipóteses contidas no artigo 55 da Constituição. Ter sofrido condenação criminal em sentença da qual não caiba mais recurso (transitada em julgado) é uma das hipóteses ali contempladas. A iniciativa do processo cabe à Mesa (órgão diretor) da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, ou a partido político representado no Congresso Nacional. Os trâmites são interna corporis, entre os pares, assegurada ampla defesa (CF 55, §2º). Encerrada a instrução processual, a Câmara ou o Senado, conforme o indiciado seja deputado ou senador, decidirá, pelo voto secreto e por maioria absoluta dos seus membros, sobre a manutenção ou a perda do mandato do colega indiciado.

Parlamentares que figuram como réus na ação penal 470 perderam seus mandatos por essa via administrativa. Quanto a eles, esse tema (perda de mandato) ficou vencido e deixou de ser considerado na esfera judicial. Todavia, outros condenados continuam no exercício dos seus mandatos. Quanto a estes, cabe ao STF decidir se declara ou não os efeitos da condenação.  

Na ação penal, a perda do cargo eletivo é conseqüência do provimento da pretensão punitiva do Estado. A finalidade do processo penal é a de apurar a autoria e a materialidade das infrações penais e a responsabilidade dos agentes. A lei penal atribui à sentença condenatória: (I) efeitos genéricos tais como: tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime; perda em favor da União dos instrumentos e do produto do crime; (II) efeitos específicos tais como: perda de cargo, função pública ou mandato eletivo; incapacidade para tutela ou curatela; inabilitação para utilizar veículo. Os efeitos específicos não são automáticos e devem ser declarados motivadamente na sentença (CP 91/92). A perda ou a suspensão de direitos políticos inclui-se entre os efeitos específicos (CF 15, III). O legislador tinha em mente o juízo monocrático ao usar o termo sentença. A decisão de tribunal chama-se acórdão. Apesar da terminologia, aquele dispositivo legal aplica-se também aos tribunais. Sob esse prisma, nas ações penais cabe aos magistrados declarar, como efeito da condenação, a perda de cargo eletivo (logo, a perda do mandato).

O processo administrativo de índole preponderantemente política, que se desenrola no âmbito do Legislativo (CF 55, §2º) e acautela o mandato parlamentar em nome da soberania popular, da democracia e do sistema representativo, não se confunde com o processo judicial que apura infrações penais e, como corolário da condenação, determina a perda ou suspensão de direitos políticos (CF 15). Lá, a responsabilidade política do parlamentar; cá, a responsabilidade penal dos cidadãos brasileiros. Para garantir o pleno e livre exercício do mandato, instrumento da representação popular, a Câmara ou o Senado poderá sustar o andamento do processo penal em que deputado ou senador figure como réu. O tribunal, então, aguarda o término do mandato do réu para dar prosseguimento à ação penal. Enquanto isto, o prazo prescricional não flui (CF 53, §§3º e 5º). Na ação acima referida (“mensalão”), o Legislativo permitiu que o processo judicial seguisse os trâmites normais até o fim.

Se ao tempo da decisão penal condenatória, o Legislativo, pela via administrativa, já houver decidido a perda do mandato do parlamentar criminalmente processado, o Judiciário, em atenção à independência do outro poder e em nome da harmonia, abster-se-á de declarar tal efeito. Tratar-se-á de matéria vencida. Se ao tempo da decisão penal condenatória o Legislativo ainda não houver decretado a perda do mandato, prevalecerá o efeito declarado pelo Judiciário. A decisão administrativa posterior não poderá se sobrepor à decisão judicial anterior. Todo o poder emana do povo (CF 1º, p.u.). Logo, o poder jurisdicional tem fonte popular e suporte institucional; não está aquém nem além dos demais poderes. No Estado Democrático de Direito a jurisdição é vital para a ordem jurídica. As decisões judiciais são de necessário e obrigatório acatamento por todos, governantes e governados. Através delas os princípios e normas da Constituição se tornam efetivos e as instituições republicanas, democráticas e o sistema representativo recebem garantias. Ao determinar a perda de mandato de deputado e senador condenados no devido processo jurídico, o tribunal cumpre aquela relevante missão

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