domingo, 12 de maio de 2013

NÓS E O BEM



Alguns filósofos tratam o bem como paixão. Para os sofistas (sec. V a.C.) paixão do êxito; para Sócrates (séc. IV a.C.) paixão da verdade, obediência à lei, ainda que nos custe a vida; para Platão (sec. IV a.C.) paixão do justo; realidade e supremacia do mundo ideal.

O bem é objeto da Moral, conjunto de princípios e regras voltados para a arte de ser feliz. A felicidade é o bem supremo da vida e consiste no bom procedimento e êxito no agir. A idéia de bem se liberta do particularismo dos instintos e dos sentidos ao ganhar autonomia intelectual. A partir daí, a idéia de bem ilumina o espírito humano. A idéia de fim é correlata à idéia de bem, ambas vinculadas ao agir humano. O fim supremo do agir humano é a felicidade. A conduta deve ser orientada a esse fim. Nisto consiste a arte de bem viver. Se a personalidade anímica não for boa, a riqueza e a boa saúde serão insuficientes para gerar felicidade. Espírito liberto de perturbações, dedicado ao saber e à verdade, que saiba pensar e sentir, é o que torna alguém feliz. “A felicidade e a boa conduta são uma só e mesma coisa”. (Jacques Maritain. Filosofia Moral. Rio, Agir, 1973, p. 26 + 34/39).

Sistemas políticos foram construídos, doutrinas foram elaboradas, associações civis foram organizadas, tudo fundado na promessa de felicidade geral, promessa difícil de cumprir tantas são as guerras, os conflitos, as competições, as ambições, as desigualdades, a miséria e a fome no mundo. Na declaração de direitos de Virgínia (16/06/1776), na declaração de independência dos EUA (04/07/1776) e na declaração francesa dos direitos do homem e do cidadão (26/08/1789), por exemplo, a felicidade consta como direito inalienável do ser humano. Filosoficamente, o direito reflete o justo, caminho seguro para a felicidade. Historicamente, entretanto, os poderosos colocam o direito ao seu serviço. As perturbações são constantes na vida em sociedade o que torna a felicidade geral inalcançável.

No plano pessoal a felicidade é vivenciada só por alguns momentos, mas pode ser prolongada. Dedicar-se ao culto da beleza, da verdade e da justiça eleva o espírito humano. As exigências orgânicas e materiais acorrentam a pessoa. Quanto menor a dependência da pessoa em relação aos bens materiais, maior a chance de ser feliz. A posse de bens materiais é boa se encarada – não como fim – mas sim como meio de se obter boa qualidade de vida sem ganância. Bons pensamentos, bons sentimentos e boa conduta são os passos para a felicidade pessoal.

Virtude é conhecer bem e pensar bem (Sócrates). Praticamos o mal porque desconhecemos o bem. Caímos no erro porque não pensamos corretamente. No sentido amplo, virtude é a excelência própria ou característica de uma coisa ou de uma pessoa na sua manifestação essencial. Exemplos: virtude do imã, virtude da música, virtude do professor, do cientista, do filósofo, do santo. 

O conhecimento pode ser especulativo quando paira no plano das idéias, ou prático quando se refere ao agir. O conhecimento tem por objeto o mundo natural, o mundo cultural e o mundo espiritual. O conteúdo desse conhecimento é a representação que o ser humano tem do seu objeto. Para permitir o discernimento daquilo que a conduta humana deve ser ou não ser na realidade concreta, a que determinação vai esse conhecimento apegar-se? Qual o critério do bom, do conveniente ou virtuoso?

A resposta a essas indagações dada por Sócrates é a de que não há outro critério a não ser o da utilidade. O cálculo da utilidade preside a conduta humana. Na vida mundana triunfa o utilitarismo. Os homens não esperaram pelos moralistas para estabelecer regras morais. As normas e os valores da vida moral integram uma moralidade tradicional prevalecente historicamente no meio social. Na vida comum, o feirante pode ter uma conduta moral mais firme do que a doutrina dos educadores e dos reformadores.

Platão fala da morte mística da inteligência extasiada no bem pelo eros supremo. A felicidade consiste na contemplação direta das idéias, das formas separadas. A alma libertada do corpo contempla o bem supremo (para tanto, a pessoa não precisa morrer fisicamente; basta calar os instintos e a mente e deixar a personalidade anímica fluir em profundo estado de meditação). A partir da moral superior os homens elaboram a sua moral, arte de se preparar para a felicidade que mora no outro mundo. O fim da vida humana está no outro mundo (das idéias, das formas). Platão enumera as virtudes cardeais: 1) sabedoria prática ou prudência; 2) força ou coragem; 3) justiça; 4) temperança.

Na opinião de Aristóteles, a felicidade deve ser usufruída aqui na Terra ao final da vida de cada um após longa experiência e reflexão. Felicidade e bem são conceitos diferentes. A vida política absorve a vida individual. Vida política é a dinâmica das coisas de interesse geral e comum na cidade e no país. Busca-se o bem de todos, porém são as pessoas ricas, contemplativas, livres de perturbação e preocupação de ordem material e emocional que usufruem da felicidade. Segundo Epicuro, o prazer é o bem maior. As necessidades devem ser reduzidas ao mínimo. A ausência de desejos e o desfrutar do prazer intelectual e espiritual contribuem para a felicidade que há de ser do homem concreto e não do homem abstrato.  

Ao contemplar o sol espiritual a personalidade anímica se ilumina. O bem vale por si mesmo. O bom sentimento vale porque é bom e não porque está referido a qualquer outro bem. A boa conduta vale porque é boa e não porque é útil para este ou aquele fim. Pensar no bem de todos e assistir aos necessitados se puder, dizer a verdade, ser honesto, justo, franco e leal, são condutas valiosas por si mesmas.

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