terça-feira, 19 de agosto de 2008

SÚMULA VINCULANTE

A súmula judicial enuncia a síntese do entendimento dos tribunais sobre determinada matéria. O propósito é resumir o essencial com clareza e precisão de modo a orientar os operadores do direito. A súmula favorece a coerência nos julgamentos e permite aos jurisdicionados ciência prévia da linha de pensamento adotada pelo tribunal. Com a independência peculiar ao poder jurisdicional, os juízes e tribunais aplicam a súmula nos casos sob sua apreciação, se assim entenderem justo, conveniente e oportuno, eis que a prioridade é da Constituição e da lei congressual.

A emenda à Constituição nº 45/2004 introduziu um tipo especial de súmula cuja expedição compete exclusivamente ao Supremo Tribunal Federal (STF). Esse tipo de súmula estabelece um vínculo de subordinação entre o seu enunciado e o poder jurisdicional dos juízes e tribunais. Por ser vinculativa, a súmula implica dever. Isto significa limite extralegal à independência da magistratura. Subordinação e independência são conceitos que se excluem. A decisão contrária à súmula do tipo vinculativo poderá ser anulada. Basta que haja reclamação ao STF. Isto supõe: (i) tutela jurisdicional prestada em sentido contrário ao da súmula (ii) eficácia da decisão divergente até julgamento do recurso adequado, se a reclamação for rejeitada.

Põe-se o problema da inconstitucionalidade praticada pelo STF (guardião da Constituição). A solução se obtém mediante: (i) controle difuso: juizes e tribunais declaram a inconstitucionalidade da súmula em cada caso concreto (ii) cancelamento da súmula: petição dirigida ao próprio STF (iii) emenda constitucional revogadora do efeito vinculativo: petição ao Presidente da República e/ou ao Congresso Nacional. Os magistrados têm competência para negar eficácia à súmula inconstitucional nos casos submetidos à sua apreciação, tal como acontece em relação à lei inconstitucional. No pedido de cancelamento da súmula entram considerações que permitem saída honrosa ao STF. A emenda constitucional revogadora resolveria o problema ampla e definitivamente. Devolveria aos juízes e tribunais a independência necessária ao pleno exercício do poder jurisdicional em cada instância. Cumpre lembrar que essa independência é uma das garantias coletivas do povo contra o poder oligárquico de grupos e categorias sociais privilegiadas. Os casos Dantas, ficha suja e algema ilustram bem essa realidade; o poder oligárquico se manifestou na cúpula do Judiciário enquanto que o poder democrático se manifestou na base.

O STF violou o artigo 103-A, da Constituição ao expedir: (i) súmula que exclui do exame da vida pregressa, a folha penal do candidato a cargo eletivo (salvo se contiver anotação de sentença condenatória transitada em julgado) (ii) súmula atribuindo caráter excepcional ao uso de algema. Como se trata de medida constrangedora da independência da magistratura, o legislador cercou de vários cuidados a edição desse tipo de súmula. Exigiu que houvessem reiteradas decisões sobre a mesma matéria. Nos casos citados, isso não havia. Traçou o objetivo (validade, interpretação e eficácia de normas determinadas) e o pressuposto da súmula (existência de controvérsia entre os órgãos judiciários a respeito dessas normas). Os tribunais eleitorais, contrariando o entendimento do Superior Tribunal Eleitoral (STE), manifestaram a intenção de indeferir pedidos de registro de candidaturas de pessoas com anotações na folha penal. Alguns processos começaram a receber, em primeiro grau, decisões neste sentido. Nenhum deles chegou ao STF. Não havia, pois, decisões reiteradas do STF sobre essa matéria. Tampouco se questionava a interpretação e a validade da norma constitucional (14, §9º). A hipótese era de colmagem infraconstitucional para obter eficácia da norma (à falta de lei reguladora, o tribunal, no devido processo, dita a regra para o caso concreto). Diferentemente da interpretação, a integração não foi incluída no objetivo da súmula. A omissão do legislador foi proposital, pois colmar a legislação equivale a legislar no caso singular sub judice.

O legislador exigiu, ainda, que a controvérsia fosse apta a gerar grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica. Nos casos da ficha suja e da algema, tal requisito está ausente. Quanto à ficha, trata-se de estreito questionamento no direito eleitoral, proposto por algumas pessoas sem idoneidade moral. A maioria dos candidatos apresenta ficha limpa. A edição da súmula foi precipitada, fora da realidade e prejudicial à moralidade para o exercício do mandato.

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